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Acordo Microsoft-Activision é teste para livre concorrência nos EUA

Aquisição de empresa de games por US$ 75 bilhões é vista como oportunidade para agências antitruste mostrarem sua força

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Washington, Nova York, Bruxelas e San Francisco | Financial Times

O maior negócio da história da Microsoft deve se tornar um caso de teste para os chefes das agências antitruste dos Estados Unidos, que prometeram enfrentar o poder de mercado das big techs.

A Microsoft se prepara para um intenso escrutínio regulatório quando sua aquisição da fabricante de videogames Activision Blizzard, acordada em US$ 75 bilhões (R$ 406 bilhões), for examinada por progressistas nomeados para importantes cargos antitruste no governo Biden. Eles incluem Lina Khan, da FTC (Comissão Federal de Comércio, na sigla em inglês), e Jonathan Kanter, do Departamento de Justiça.

"A Microsoft tem plena consciência de que não será fácil, mesmo que não haja uma clara violação antitruste", disse uma pessoa com conhecimento direto sobre como a equipe de F&A da empresa se prepara para conseguir a aprovação do negócio.

Ilustração de logo da Microsoft em smartphone localizado em frente a logo da Activision Blizzard - Dado Ruvic - 18.jan.2022/Reuters

O temor do grupo de tecnologia é que Khan use essa transação para provar que está levando a sério o controle das big tech, acrescentou a pessoa. Os investidores da Activision parecem compartilhar essa preocupação, já que as ações da empresa estão sendo negociadas com desconto de 13,5% em relação à oferta da Microsoft, de US$ 95 (R$ 515) por ação em dinheiro.

"Esta é uma oportunidade ideal para as agências antitruste agirem de acordo com a visão de seus líderes de que os tribunais têm sido muito brandos ao autorizar consolidações em muitos setores, especialmente no tecnológico", disse Bill Baer, membro visitante da Brookings Institution e ex-chefe da divisão antitruste do DoJ (Departamento de Justiça, na sigla em inglês).

A FTC e o DoJ não quiseram comentar se vão investigar a megafusão. Também não ficou claro qual agência potencialmente investigaria o acordo.

Bobby Kotick, executivo-chefe da Activision, minimizou o risco de retrocesso regulatório, já que gigantes tecnológicas como Apple e Google também estão explorando jogos digitais.

Respondendo aos pedidos de ação regulatória, a Microsoft disse que o mercado de games continuaria "diversificado e fragmentado" após o acordo e criticou algumas de suas maiores rivais tecnológicas.

"A distribuição de jogos para dispositivos móveis passa pela Apple e a Google, que geram mais dinheiro com os consumidores que compram jogos do que os estúdios e desenvolvedores que fazem os jogos", disse a Microsoft.

A empresa acrescentou que "não tinha intenção de retirar os games das plataformas existentes, e nossa estratégia é centrada no jogador —os jogadores devem poder jogar o que quiserem, onde quiserem. Acreditamos que essa aquisição só aumentará a concorrência, mas, em última análise, cabe aos reguladores decidir".

Os especialistas antitruste, entretanto, afirmam que as agências federais estarão analisando de perto, dado o foco de seus líderes, o tamanho da aquisição e o dano potencial a outros atores nesse setor.

Khan diz que o fator de dissuasão proporcionado pela ação antitruste é "chave" na aplicação da lei de concorrência. A presidente da FTC disse na quarta-feira (12) à CNBC que fusões ilegais foram realizadas no passado "porque as consequências de propor esses acordos não foram significativas (...) o tipo de dissuasão que precisamos ver para mudar o jogo, não estamos vendo".

O acordo com a Microsoft foi anunciado na terça (11), poucas horas antes de a FTC e o DoJ dizerem que buscariam a opinião do público sobre a reformulação das regras de fusão para reprimir acordos ilegais, diante do aumento das transações. Os pedidos de fusão mais que dobraram entre 2020 e 2021, disseram as agências.

Herbert Hovenkamp, professor da faculdade de direito da Universidade da Pensilvânia, disse que é muito cedo para prever a complexidade de um possível caso jurídico contra a transação, mas que "novas leis de fusão [são] feitas em situações tensas, não nos casos fáceis".

Uma investigação da aquisição sinalizaria que as agências desejam aplicar à Microsoft o nível de escrutínio que até agora reservaram para outras empresas de tecnologia.

"As big techs estão na mira nos últimos dois anos", disse Michael Carrier, professor de direito da Universidade Rutgers. "A Microsoft parece evitar a mira, mas em um negócio como esse eles poderão se encontrar nessa posição."

Uma investigação marcaria a maior ação antitruste contra a Microsoft desde que as autoridades americanas processaram a empresa, há duas décadas, no que ficou conhecido como o "caso antitruste do século". O governo venceu depois de acusar o grupo de usar seu monopólio do Windows para esmagar a Netscape, pioneira em navegadores da web.

"A questão é se teríamos visto o crescimento e o sucesso dessas empresas de última geração na internet se o Departamento de Justiça não tivesse tomado a ação", disse Khan à CNBC sobre o processo de 1998. "Nesse caso, a fiscalização foi fundamental para oxigenar o mercado e garantir que essas oportunidades existissem."

O acordo entre a Microsoft e a Activision não representaria o tipo de preocupação direta com a participação de mercado que causa a maioria das ações antitruste. Em vez disso, como uma "fusão vertical" combinando os sistemas de distribuição do grupo de software e o conteúdo do fabricante de videogames, apresentaria um caso mais difícil.

Uma contestação das agências antitruste poderia ajudá-las a moldar regras sobre fusões verticais —um dos assuntos sobre os quais elas buscam informações—, depois que a FTC suspendeu no ano passado as diretrizes de 2020 para esses tipos de fusões, por serem muito brandas.

Se as agências processassem para impedir a transação, elas poderiam argumentar, por exemplo, que a Microsoft poderia "desfavorecer os concorrentes" ao fazer que os populares jogos Call of Duty ou World of Warcraft, da Activision, fossem reproduzidos apenas em seu Xbox e não no PlayStation da Sony, disse Carrier.

Embora os casos contra fusões verticais estejam entre os mais difíceis de vencer, eles começaram a aumentar nos últimos anos com a fiscalização antitruste mais rígida. "Este será um caso de teste interessante para ver se as agências estão dispostas a contestar uma fusão que apresenta essas questões verticais na indústria de videogames", acrescentou Carrier.

Uma ação recente contra as fusões verticais por agências dos EUA não teve sucesso. Em 2019, o Departamento de Justiça não conseguiu bloquear a aquisição da Time Warner por US$ 80 bilhões pela AT&T, depois que um tribunal federal de apelações decidiu contra o departamento.

Mas Khan parece não se incomodar com a perspectiva de a FTC perder no tribunal e disse à CNBC na quarta que "mesmo que não seja um caso decisivo, mesmo que haja um risco de perder, pode haver enormes benefícios em assumir esse risco (...) Você perde todos os lances que você não dá".

A aquisição de US$ 75 bilhões pode turbinar a crescente cooperação entre reguladores de ambos os lados do Atlântico, que, segundo Margrethe Vestager, chefe de concorrência da União Europeia, foi desencadeada pela nomeação de Khan para a FTC.

Baer disse: "Eu esperaria que, em particular, a Europa, os Estados Unidos e o Reino Unido coordenassem estreitamente suas análises e quaisquer resultados possíveis... [para] esses tipos de fusões que têm implicações mundiais".

Tendo escapado do escrutínio regulatório há anos em Bruxelas, a Microsoft poderá enfrentar longas investigações enquanto autoridades da UE analisam de perto sua aquisição, disseram várias pessoas com conhecimento direto da transação.

Espera-se que os órgãos reguladores da UE investiguem possíveis questões anticompetitivas apenas com base no volume do acordo, disse um consultor. "É simplesmente grande demais para ser ignorado", disse essa pessoa.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

Stefania Palma , James Fontanella-Khan , Javier Espinoza e Richard Waters
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