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Como o Facebook está se transformando em Meta

Migrar empresa de rede social de 68 mil funcionários para o teórico 'metaverso' causa incertezas internas

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Sheera Frenkel Mike Isaac Ryan Mac
San Francisco e Los Angeles | The New York Times

O engenheiro do Instagram já tinha feito as malas para as férias em dezembro quando seu chefe o chamou para uma reunião virtual para discutir as metas de trabalho para 2022.

A conversa logo tomou um rumo inesperado. Esqueça as metas, disse o chefe. Para ter sucesso na Meta, empresa controladora do Facebook e do Instagram, ele deveria se candidatar a um novo cargo nas crescentes equipes de realidade aumentada e realidade virtual. É aí que a empresa precisa de pessoas, afirmou.

O engenheiro, que trabalhava no Instagram havia mais de três anos e que não quis ser identificado por temer retaliação, ficou surpreso por ter de se candidatar novamente a um emprego. Ele disse que ainda não decidiu o que vai fazer.

Migrar uma empresa de rede social de 68 mil funcionários para o teórico "metaverso" causa perturbações e incertezas internas na Meta - Mikel Jaso - 31.jan.2022/The New York Times

Mark Zuckerberg, fundador e executivo-chefe da empresa antes chamada Facebook, revolucionou a companhia desde que anunciou, em outubro, que apostaria no chamado metaverso [um mundo digital totalmente realizado que existiria além daquele em que vivemos; termo cunhado por Neal Stephenson na novela "Snow Crash", de 1992, o conceito foi explorado por Ernest Cline na novela "Ready Player One"]. Sob essa ideia, sua empresa —recentemente renomeada Meta— apresentaria às pessoas "mundos virtuais" compartilhados e experiências em diferentes plataformas de software e hardware.

Desde então, a Meta buscou uma transformação abrangente, disseram funcionários atuais e antigos. Criou milhares de novos empregos nos laboratórios que fabricam hardware e software para o metaverso. Os gerentes pediram aos funcionários que trabalhavam em produtos de redes sociais que se candidatassem a funções em realidade aumentada e realidade virtual. A empresa contrabandeou engenheiros de metaverso de rivais como Microsoft e Apple. E rebatizou oficialmente alguns produtos, como os "headsets" de realidade virtual Oculus, com o nome Meta.

As medidas representam algumas das mudanças mais drásticas na empresa do Vale do Silício desde 2012, quando Zuckerberg anunciou que o Facebook tinha de levar a rede social dos computadores de mesa para os dispositivos móveis. A empresa se reestruturou, concentrando energia e recursos na criação de versões de seus produtos compatíveis com celulares e tablets. A reforma foi um enorme sucesso, levando a anos de crescimento.

Mas alterar o rumo da empresa hoje é muito mais desafiador. A Meta tem mais de 68 mil funcionários, mais de 14 vezes seu tamanho em 2012. Seu valor de mercado aumentou mais de oito vezes nesse período, para US$ 840 bilhões (R$ 4,45 trilhões). Seu negócio está enraizado em publicidade online e redes sociais. E embora a mudança possa dar à Meta uma vantagem na próxima fase da internet, o metaverso continua sendo um conceito amplamente teórico —diferentemente da mudança para o celular em 2012, quando os smartphones já eram amplamente usados.

O resultado foi uma disrupção interna, de acordo com nove funcionários atuais e ex-funcionários da Meta que não estavam autorizados a falar publicamente. Enquanto alguns estavam empolgados com o giro da Meta, outros questionavam se a empresa estava correndo para um novo produto sem corrigir problemas como desinformação e radicalismo em suas plataformas sociais. Esperava-se que os trabalhadores adotassem uma atitude positiva em relação à inovação ou se demitissem, disse um deles, e alguns que discordaram da nova missão saíram.

O que o foco no metaverso significa para os produtos de redes sociais existentes da empresa, como Facebook e Instagram, permanece em fluxo, segundo dois funcionários. No Facebook e no Instagram, algumas equipes encolheram nos últimos quatro meses, disseram eles, acrescentando que esperavam que seus orçamentos para o segundo semestre de 2022 fossem menores do que nos anos anteriores.

Um porta-voz da Meta, que divulga seus resultados trimestrais na quarta-feira (2), disse que construir para o metaverso não é a única prioridade da empresa. Ele acrescentou que não houve cortes de empregos significativos nas equipes existentes por causa da nova orientação.

O giro do Facebook para o metaverso começou pelos altos cargos. Em setembro, Mike Schroepfer, diretor de tecnologia há muito tempo, disse que deixará o cargo até o final de 2022. Em seu lugar, Zuckerberg nomeou Andrew Bosworth, conhecido como "Boz", que nos últimos anos liderou o desenvolvimento de produtos como os fones de ouvido Oculus e os óculos inteligentes Ray Ban Stories.

A ascensão de Bosworth foi um sinal para os insiders de que Zuckerberg estava levando a sério a realidade virtual e o metaverso. Os dois se conheceram em Harvard em uma aula de inteligência artificial, quando Zuckerberg era aluno e Bosworth, assistente de professor. Eles mantiveram contato depois que Zuckerberg abandonou a universidade. Mais tarde, Bosworth mudou-se para o Vale do Silício para trabalhar para Zuckerberg.

Desde então, Zuckerberg recorreu a Bosworth para grandes iniciativas. Em 2012, ele foi encarregado de desenvolver os produtos de publicidade para celular do Facebook. Após problemas de gerenciamento na divisão de realidade virtual Oculus, Zuckerberg despachou Bosworth em agosto de 2017 para assumir a iniciativa. O negócio de realidade virtual foi posteriormente renomeado Reality Labs.

Logo da Meta na Califórnia, EUA - Jim Wilson - 4.nov.2021/The New York Times

Em outubro, a empresa disse que criaria 10.000 empregos relacionados ao metaverso na União Europeia nos próximos cinco anos. No mesmo mês, Zuckerberg anunciou que estava mudando o nome do Facebook para Meta e prometeu bilhões de dólares para o esforço.

O Reality Labs está agora na vanguarda da migração da empresa para o metaverso, disseram os funcionários. Profissionais de produtos, engenharia e pesquisa foram incentivados a se candidatarem a novas funções lá, disseram eles, enquanto outros foram promovidos de seus cargos em divisões de redes sociais para as mesmas funções com ênfase no metaverso.

Dos mais de 3.000 cargos vagos listados no site da Meta, mais de 24% são agora para funções em realidade aumentada ou virtual. Os empregos ficam em cidades como Seattle, Xangai e Zurique. Uma oferta de emprego para "gerente de engenharia de jogos" para o Horizon, game de realidade virtual gratuito da empresa, dizia que as responsabilidades do candidato incluiriam imaginar novas maneiras de vivenciar shows e convenções.

O recrutamento interno para o metaverso aumentou no final do ano passado, disseram três engenheiros da Meta, com seus gerentes mencionando vagas em equipes ligadas ao metaverso em dezembro e janeiro. Outros que não embarcaram na nova missão foram embora. Um ex-funcionário disse que pediu demissão depois de sentir que seu trabalho no Instagram não seria mais valioso para a empresa; outro disse que não achava que a Meta fosse a melhor posicionada para criar o metaverso, e que iria procurar emprego na concorrência.

A Meta também atraiu dezenas de funcionários de empresas como Microsoft e Apple, disseram duas pessoas com conhecimento dos movimentos. Em particular, a Meta contratou profissionais dessas empresas que trabalhavam em produtos de realidade aumentada, como o HoloLens da Microsoft e o projeto secreto de óculos de realidade aumentada da Apple.

Representantes da Microsoft e da Apple não quiseram comentar. A Bloomberg e The Wall Street Journal relataram anteriormente algumas das movimentações de pessoal.

Os funcionários da Meta foram convidados a contribuir para a mudança de outras maneiras. Em novembro, eles foram convidados a se inscrever no Projeto Aria, iniciativa para testar novos óculos de realidade aumentada, segundo um memorando interno que foi visto pelo New York Times.

Os funcionários podem "ganhar pontos e prêmios" usando os óculos e coletando dados por meio das câmeras e sensores do dispositivo, dizia o memorando. Para reduzir as preocupações das pessoas com a privacidade de serem filmadas com os óculos, os funcionários foram solicitados a usar camisetas identificando-os como "participante de pesquisa", e instruídos a não visualizar ou ouvir os dados captados pelos óculos, de acordo com o memorando.

Em uma reunião geral da empresa dias depois de Zuckerberg anunciar que o Facebook apostaria tudo no metaverso, a diretora de operações Sheryl Sandberg respondeu a perguntas dos funcionários sobre a mudança.

Ela disse que estava "animada" com as possibilidades do metaverso e que os participantes deveriam imaginar as infinitas oportunidades que estariam ao alcance das pessoas em todo o mundo, segundo dois funcionários que escutaram a reunião virtual.

Muitos deles demonstraram seu entusiasmo usando emojis de coração. Mas em um bate-papo privado para engenheiros, que foi analisado pelo Times, um funcionário escreveu: "Quem é o elefante na sala que vai perguntar como tudo isso funciona?"

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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