Descrição de chapéu Folha Turismo, 50

Turismo da Folha foi pioneiro no uso de cores em jornal diário

Há 50 anos, suplemento circulava com fotos coloridas pela primeira vez

Oscar Pilagallo
São Paulo

O caderno de Turismo tem um insuspeitado protagonismo na história do jornalismo brasileiro. 

 
Insuspeitado porque não se espera, de uma editoria voltada ao lazer, contribuição a uma atividade com peso na vida política e econômica do país.

Mas foi o que aconteceu. Foi aqui, há 50 anos, que pela primeira vez no Brasil se usaram fotos coloridas em um jornal nacional de grande circulação.

A utilização de cores na imprensa hoje é corriqueira. Mas nem sempre foi assim. Mesmo depois que a tecnologia permitiu a impressão de imagens em cores, os jornais no mundo todo hesitaram em se valer do recurso, a começar pelo mais prestigioso deles, o New York Times.

Por tradição, jornalistas e leitores faziam uma associação entre ausência de cor e seriedade. Imagens em vermelho, azul, amarelo e verde retratavam uma realidade espalhafatosa demais aos olhos acostumados ao branco, preto e tonalidades de cinza.

A introdução das cores na primeira página e nos outros cadernos foi gradual. Em meados dos anos 1980 a cor ainda era esporádica. Em abril de 1984, por exemplo, às vésperas da votação das Diretas-Já, a Folha circulava com uma discreta faixa amarela abaixo do cabeçalho, incentivando a população a usar essa cor para expressar apoio ao movimento.

No início dos anos 1990, as cores finalmente passaram a dominar as páginas do jornal. Em 30 de setembro de 1992, na edição em que anunciou o impeachment de Fernando Collor, a Folha estampou uma faixa vermelha (em que se lia “Vitória da democracia”) sobre fotos coloridas da comemoração no Congresso e da saída de cena do presidente.

A partir dessa época –quase um quarto de século depois do pioneirismo do Turismo– o uso das cores se impôs no noticiário. Em 1995, com a inauguração do Centro Tecnológico Gráfico, o jornal passou a circular com a maioria das páginas coloridas, até para organizar visualmente a cadernização do jornal.

Cinquenta anos atrás, a impressão em cores foi viabilizada pela adoção do offset, uma tecnologia que, ao substituir a composição a chumbo pela fotocomposição eletrônica, melhorou muito a qualidade da reprodução em geral, sobretudo de imagens.

A Folha começou a rodar em offset no início do ano politicamente turbulento de 1968. Foi um dos primeiros jornais de grande porte do mundo a adotar o sistema de impressão a partir de um registro fotográfico das páginas compostas.

Nove meses depois, em 27 de setembro –no meio do caminho entre a revolta dos estudantes no mundo e a decretação do AI-5, para citar dois fatos que marcaram 1968– o Turismo apareceu pela primeira vez em cores.

A partir dessa edição, estavam contados os dias da impressão tradicional, que reproduzia imagens em desbotados tons de sépia, inadequadas para despertar no leitor o desejo de conhecer os mais paradisíacos quadrantes do mundo.

O caderno Turismo nasceu em 1959, uma página inserida na então recém-criada Ilustrada e intitulada “Viagens e Passeios”, nos tempos em que a Folha ainda era Folha da Manhã. O caderno, como é conhecido hoje, só surgiria em 1966.

O criador do Turismo foi Horácio Neves, que editou o caderno até 1984. “Foi o primeiro da imprensa brasileira”, lembrou o jornalista em entrevista ao projeto História Oral da Folha.

 
Português, ele nunca esqueceria que a estreia das cores no Turismo coincidiu com a queda do ditador Antonio Salazar, que estivera à frente do Estado Novo de Portugal desde 1933 (a ditadura continuaria até abril de 1974, quando foi derrubada pela Revolução dos Cravos).

O caderno evoluiu com o negócio do turismo. Nos idos dos anos 1960, o setor engatinhava. O turismo ainda não era uma indústria, o que se refletia nas curtas notas sobre destinos regionais, nas acanhadas tabelas com horários de partida de trens e ônibus e nos pequenos anúncios de hotéis.

Capa e contra-capa de Turismo e a Primeira Página da Folha em 27 de setembro de 1968, dia de estreia da cor no caderno
Capa e contra-capa de Turismo e a Primeira Página da Folha em 27 de setembro de 1968, dia de estreia da cor no caderno - Reprodução

Hoje, o turismo movimenta mais de US$ 160 bilhões por ano no Brasil, o equivalente a quase 8% do PIB, e emprega mais de 7 milhões de pessoas. E a reportagem vai aonde haja algo de interesse a ser visitado.

Nos últimos anos, passaram por estas páginas o líder sul-africano Nelson Mandela (1918-2013), o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), o economista Paul Singer (1932-2018), o escritor Mario Prata, o jornalista e dramaturgo Otavio Frias Filho (1957-2018), o sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995), o colunista Janio de Freitas, o bibliófilo José Mindlin (1914-2010), o fotógrafo David Drew Zingg (1923-2000), o atual diretor artístico da Orquestra Sinfônica de São Paulo, Arthur Nestrovski, entre tantos outros que, com as narrativas de suas andanças pelo Brasil e pelo mundo, também trouxeram cor para o caderno.

Oscar Pilagallo

Jornalista, é autor de "História da Imprensa Paulista"

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