Em Socorro (SP), repórter com baixa visão se joga nas aventuras radicais

Jornalista confere atrações e hospedagem adaptada na cidade referência em turismo inclusivo

Barco amarelo com pessoa com cadeira de rodas sobre ele
Rafting com acessibilidade para quem usa cadeira de rodas, no hotel Parque dos Sonhos, em Socorro (SP) - Divulgação
Filipe Oliveira
São Paulo

​O hotel Parque dos Sonhos, em Socorro, cidade paulista referência em inclusão e turismo de aventura, tem algumas faixas de piso tátil: linhas salientes que permitem a quem não enxerga saber o caminho passando os pés ou a bengala sobre eles.

Se para quem tem uma limitação motora, a existência de uma arquitetura inclusiva delimita a possibilidade de poder ou não ir a um lugar, o que torna o ambiente inclusivo para cegos e pessoas com baixa visão depende muito de coisas menos perceptíveis aos olhos.

Para andar pelo hotel em uma breve estadia com a Marcela, uma amiga que também tem deficiência visual, não haveria tempo de aprendermos os caminhos entre quarto, recepção e atrações. Então recorremos a um recurso que qualquer empreendimento pode ter: funcionários preparados para ajudar hóspedes em diferentes condições.

A bem da verdade, na maioria de minhas viagens percebo um esforço grande da equipe dos hotéis para entender que necessidades diferentes posso ter e resolver tudo da melhor maneira. Ir além é antecipar algumas delas, não deixar escapar o risinho nervoso de quem não sabe como conduzir a situação e oferecer prontamente o braço para que a pessoa que não enxerga segure.

No restaurante, cabem pequenos gestos como indicar o que há em cada parte do prato e checar se é preciso ajuda para cortar o que for mais difícil, como um frango com osso.

Capacitação e boa vontade são ainda mais importantes quando a viagem envolve atividades menos usuais, como as de Socorro —por exemplo, a tirolesa voadora, de um quilômetro de extensão.

Na atração, o participante vai deitado. Há ainda na cidade um circuito de arvorismo, formado por trilhas suspensas na altura da copa das árvores que exigem equilíbrio, atenção e coordenação.

A aventura funcionou porque nossos guias nos deixaram cair e passar por perrengues, sempre com segurança. Na hora de nos deitarmos no ar para descermos a tirolesa, muito bem amarrados, claro, nos avisaram de que o vento vinha em direção contrária à descida e talvez o impulso inicial não fosse suficiente para percorrer todo o caminho.

Acertaram. Marcela, que inaugurou as atividades, ficou encalhada no meio da descida, flutuando a mais de 100 metros do chão por uns 15 minutos, esperando que alguém fosse buscá-la.

Não sei se é pior ficar nessa situação enxergando o que há debaixo de si ou sem ver nada. Mas ela não se abalou. "Fiquei me sentindo meio isolada, mas já tinham me explicado que isso podia acontecer e não fiquei com medo", contou.

Mais encorajadora ainda foi a paciência da dupla a cada uma de nossas quedas andando sobre tábuas estreitas ou fios de aço. Sem ver onde havia piso, o jeito era ir tateando o caminho com os pés enquanto o resto balançava.

A cada passo em falso, ficávamos balançando no ar, presos por cordas de aço esperando para sermos içados. Era só sacudir a poeira e tentar outra vez, ninguém insinuou que o desafio estivesse acima de nossas possibilidades. 

Foi assim até Marcela achar que o último obstáculo, que exigia uma escalada forte usando mãos e braços, era demais e pediu uma escadinha para descer. Da mesma forma, sem constrangimentos.

O hotel, que recebe em média cem pessoas com deficiência por mês, oferece ainda passeio a cavalo e rapel. Para o primeiro não houve tempo. Já a segunda atividade foi barrada por uma colmeia de abelhas que se instalaram no ponto de chegada da atração.

Houve espaço para uma visita ao centro de Socorro, localizado a cerca de 15 quilômetros do hotel.
A cidade começou a se abrir para pessoas com deficiência em 2005, por meio de iniciativa trazida pela ONG Aventureiros Especiais e encampada por Socorro e pelo Ministério do Turismo.

Com o tempo, foram feitos treinamentos para que empresários locais se preparassem para receber o público com deficiência, o que colaborou para um melhor atendimento e incentivou investimentos em recursos como cardápios em Braille, diz Acácio Zavanella, secretário municipal de turismo da cidade.

A cidade tem atrações típicas do interior de São Paulo: alambiques e um café em que se pode conversar com moradores no Rancho Pompeia. 

A inclusão aparece em alguns pontos turísticos, como plantas identificadas por textos em Braille afixados no Horto Municipal.

Também há pela cidade faixas de pedestres mais elevadas (lombofaixas), que permitem a travessia de cadeirantes, e um Cristo Redentor, que pode ser alcançado de elevador.

Em 2014, a cidade recebeu o Prêmio Rainha Sofia de Acessibilidade, do Conselho Real para Deficiência do governo espanhol, que homenageia cidades com práticas inclusivas.

O jornalista viajou a convite do hotel Parque dos Sonhos

Pacotes para Socorro

R$ 103
2 noites em Socorro, na Top Brasil
Valor, por pessoa, de hospedagem na pousada Cafuné. Com café da manhã

R$ 1.090
3 noites em Socorro, na Expedia 
Estada no hotel Recanto da Cachoeira, com pensão completa. Preço por pessoa

R$ 3.000
4 noites em Socorro, no hotel Parque dos Sonhos
Hospedagem de 15 a 19 de novembro, por casal. Com pensão completa e day use em outros hotéis da rede

R$ 3.140
5 noites em Socorro, na CVC
Preço para duas pessoas no Grinberg's Village Hotel. Com pensão completa​

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