Lançamento de foguete aproxima turismo espacial da realidade

Corrida de empresas privadas avança e deve viabilizar viagens à orbita terrestre nas próximas décadas

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São Paulo

O lançamento do foguete Falcon 9, que levou ao espaço dois astronautas, em 30 de maio, foi um grande passo para o turismo espacial.

Este é o primeiro veículo norte-americano, desde 2011, a levar pessoas à órbita terrestre —no caso, para a Estação Espacial Internacional.

A nave pertence à SpaceX, do bilionário Elon Musk, dono da Tesla, e foi desenvolvida a pedido da Nasa por US$ 2,6 bilhões, muito menos do que a agência gastaria.

O lançamento faz parte do chamado movimento “new space”, onde o espaço não é mais dominado por estatais. As companhias que investem na área querem trabalhar com uma mistura de atendimento às agências espaciais, viagens de lazer, ações de marketing e incursões científicas.

Para o engenheiro espacial Lucas Fonseca, a participação de empresas privadas será fundamental para o barateamento das viagens e a expansão do turismo. “Do mesmo jeito que as companhias levarão turistas para flutuar por 15 minutos, poderão transportar experimentos.”

Além da SpaceX, outras duas empresas se destacam na corrida do turismo espacial: Blue Origin, do fundador da Amazon, Jeff Bezos, e Virgin Galactic, de Richard Branson, dono da Virgin Atlantic.

A SpaceX quer levar pessoas para Marte, mas também planeja ter voos de lazer em volta da Lua, além de transportar passageiros para a Estação Espacial e usar foguetes para viagens de um ponto a outro da Terra.

A Blue Origin tem como meta pousar na Lua para uma “conquista” do satélite e quer oferecer voos suborbitais —que não entram em órbita, mas permitem ver o espaço e sentir os efeitos da microgravidade, que faz flutuar.

Esse também é o foco da Virgin Galactic, empresa que está mais próxima de começar a levar passageiros para o limite do planeta.

Cerca de 700 pessoas já compraram passagem para um voo de duas horas a bordo da VSS Unity, nave que vai levar até seis pessoas por vez à linha de Karman, faixa imaginária que divide a Terra do espaço, a 100 km acima do nível do mar —um avião comercial voa a 11 km de altitude. Cada interessado pagou pelo menos US$ 200 mil (R$ 986,5 mil).

A agência de turismo Marcos Pontes, que tem o astronauta e atual ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações como sócio, diz ter vendido dez passagens da Virgin para brasileiros.
Um dos compradores é Marcos Palhares, sócio e diretor comercial da agência. “Gostaria de ser o primeiro a ir”, diz.

Quando a agência brasileira começou a vender os bilhetes, eles já custavam US$ 250 mil. Agora, devem chegar a US$ 300 mil (quase R$ 1,5 milhão). Palhares espera que a competição com a Blue Origin diminua o custo no futuro.

No início do ano, a Virgin informou a agência brasileira de que começaria a operar no segundo semestre, mas o cronograma pode ser adiado por causa da pandemia. Não é a primeira vez que a empresa posterga o início das atividades comerciais.

“Eles queriam estar em operação há pelo menos cinco anos, estão muito atrasados”, diz Luiz Trigo, professor de Turismo da USP.

A nave da Virgin é um híbrido de avião e foguete. “Decola e pousa como um avião, então é muito mais familiar para as pessoas”, diz Palhares.

A tecnologia que a Blue Origin pretende usar nos voos é distinta: o foguete carrega uma cápsula, que volta à Terra com ajuda de um paraquedas.

Já a SpaceX projeta um foguete inteiro, que decola e pousa na vertical.

Mesmo as viagens suborbitais exigem preparação física por parte dos viajantes. Antes de embarcar no voo da Virgin será preciso passar três dias em instalações do Spaceport America, espécie de aeroporto da empresa no estado americano do Novo México, onde serão feitos exames. Já para viagens mais longas será preciso uma preparação maior.

Sete civis já pagaram para passar alguns dias na Estação Espacial, entre 2001 e 2009. Cada um desembolsou entre US$ 20 e US$ 25 milhões e passou por treinamentos longos, como os de astronautas.

“Não vai ser qualquer pessoa que vai poder ir para o espaço, quem tiver problemas de saúde não irá”, afirma Trigo.

Mas mais do que o condicionamento físico, a conta bancária deve definir quem pode ser um turista espacial, pelo menos no início da atividade.

“No começo vai ser elitizado, até que em algum momento a classe média terá acesso, mas nunca vai ser algo para todos”, diz Fonseca.

A ideia da Virgin é ter bilhetes por US$ 60 mil (R$ 296 mil) no futuro, e Elon Musk já disse ter confiança de que uma viagem para Marte pode custar um dia menos de US$ 100 mil (R$ 493 mil).

A estatística aposentada Dina Barile, 64, é uma das pessoas que aguardam com ansiedade o começo das operações da Virgin Galactic.

Ela, que já conhece 140 países e foi duas vezes à Antártida, ainda não reservou seu bilhete, mas já fez outras duas experiências como preparação para uma ida ao espaço.

Em 2015, ela foi para a Rússia andar de caça a quase 17 km de altitude e participou de um voo que simula a sensação de microgravidade.

As viagens foram vendidas pela agência de Palhares, para que ela testasse como seu corpo reagiria em situações extremas. “Na microgravidade, parece que você está pulando de paraquedas”, diz Barile.

A chance de ser a primeira mulher do país a ir ao espaço a faria comprar o bilhete à vista. “Soube que já tem outra interessada, mas se ela desistir eu compro o bilhete”, afirma.

A viagem também seria a realização de um sonho de infância. “A chegada do foguete americano à Lua [em 1969] me impressionou.”

Depois que houver meios de transporte confiáveis e economicamente viáveis para sair da Terra, o próximo passo será pensar em hospedagens espaciais. Segundo Fonseca, muitas empresas já tentaram lançar projetos de hotéis no espaço, mas nenhum vingou.

Luiz Trigo, professor da USP, prevê que haja um turismo espacial regular só a partir de 2030, enquanto Fonseca é mais otimista: acredita que ainda nesta década será possível viajar para a Lua e, a partir de 2030, para Marte.

Uma viagem ao planeta, com a tecnologia de hoje, levaria ao menos três anos: seis meses para ir e voltar e mais dois anos no local, aguardando a melhor posição dos astros para fazer o trajeto de volta. Para Fonseca, isso não seria um problema. “Acho que as pessoas vão querer curtir o ambiente marciano.”

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