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A praça é do povo


O país se prepara. O papa vem aí.
Jáquisson era morador de rua. E já estava correndo o boato.
Onde o papa passar, os mendigos serão retirados. O rapaz não se conformava.
- Quero ver o papa, caramba.
Entre alguns goles de cachaça, Jáquisson evocava uma sabedoria milenar.
- A praça é do povo. Como o céu é do condor.
Lágrimas nasciam em seus olhos inchados.
- Os pobres terão o reino dos céus.
A tarde caía de mansinho perto da catedral da Sé.
Sono e revolta se misturavam na alma do sem-teto.
Helicópteros e sirenes despertaram o rapaz.
Jáquisson olhou para o céu. Uma forma branca pairava em sua visão.
- Yakisson... O prrratza é da pôffa. Non sairrás desta lugarrr...
- Papa Bento 16... sois vós?
A visão se dissipou entre tiros de metralhadora.
Um assalto a banco. Uma bala perdida. Deixando o cadáver de Jáquisson ali, plantado. Sem sair do lugar. Mas já perto do reino dos céus.
Mendigos são como balas perdidas: sempre encontram onde se alojar.
 voltaire.souza@bol.com.br


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