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Brasília Online

11/02/2007

PT planeja cerco à imprensa

"Entendemos que a sociedade brasileira não aceita a interdição do debate sobre a comunicação social. Não aceita, tampouco, que se tente passar a idéia de que se trata de um tema de interesse estritamente partidário e/ou do governo Lula."

Essa avaliação do desejo da "sociedade brasileira" consta da resolução da reunião do Diretório Nacional, que ocorreu neste sábado em Salvador. Cresce no PT a vontade de dar um "troco" à mídia, considerada em outros documentos da legenda como uma grandes das forças derrotadas pela reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O PT sempre viveu uma relação de amor e ódio com a mídia. Nunca compreendeu exatamente o seu papel. Vê a imprensa como um instrumento, não uma das instituições da democracia. O "instrumento", portanto, está contra mim se não está a meu favor, avaliam dirigentes do partido .

É um tremendo equívoco. Neste ano, o PT realizará seu 3º Congresso --está marcado para o início de julho, em Brasília. A defesa da democratização dos meios de comunicação é como a luta contra o câncer. Todo mundo se manifesta a favor.

O diabo, porém, reside nos detalhes. E o PT se trai. Ao tratar como "tema urgente" uma reforma da mídia, fala em ações de "curto e médio prazo". E prega "a importância de uma mídia privada progressista". Ou seja, de uma mídia aliada, que receberia ajuda financeira para competir com a "mídia privada conservadora". Perigo à vista, principalmente para o PT e o governo.

Não parece que tenham partido da imprensa "conservadora" os fatos que originaram as grandes crises do PT, que completou 27 anos neste final de semana. Ou será que os "barões da mídia" plantaram Marcos Valério e Luiz Antonio Vedoin no PT?

A imprensa tem os seus males, que não são poucos. O PT, porém, erra o alvo. "Seus inimigos" não estão nos jornais, rádios e TVs. Lula acertou quando deixou claro que se encontravam dentro do próprio partido.




Enquadrada de A a Z

O discurso de improviso de Lula no jantar de comemoração dos 27 anos do PT foi um dos mais fortes já feitos em encontros do partido. Também o mais duro dirigido à legenda desde que ele chegou à Presidência da República. Lula enquadrou todas correntes, que romperam a trégua das eleições de 2006 e estão em luta interna pelo controle do partido.

Lula pediu o fim da guerra interna --não deverá ser atendido, porque ela é incontrolável, mas os conflitos deverão ocorrer num tom menos beligerante do que se anunciava. O presidente disse que o partido deveria combater os "verdadeiros inimigos". Afirmou ser "fantástico" como o PT gosta de dar tiro no pé. Falou que "companheiros atacam companheiros" de forma mais dura do que fizeram as CPIs das crises do mensalão e do dossiegate. Pediu paz para governar.

Lula afirmou que não se meteria nos assuntos internos do PT. Meia-verdade. O tom duríssimo contra a atual direção e o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que constava das primeiras versões do documento "Mensagem ao Partido", foi útil ao presidente. Petistas atribuem ao ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, a autoria principal do documento, que ainda deverá ser uma das teses do 3º Congresso do PT, marcado para o início de julho em Brasília.

A maioria dos dirigentes julgou que Lula deu um puxão de orelha em Tarso quando falou que petistas eram mais duros com os colegas do que a oposição. Registro: o tom duro que sumiu da versão final foi útil ao presidente, pois ele achava que a atual direção começava a se comportar como se o partido não tivesse vivido as crises do mensalão e do dossiegate.

Como o documento ficou muito pesado, Dirceu e integrantes do Campo Majoritário, corrente mais importante do PT e na qual se abrigam os petistas mais afetados pelas crises do primeiro mandato de Lula, levaram ao presidente a sua insatisfação, o que poderia fazer da guerra interna em curso uma batalha sem quartel. Lula, então, agiu nos bastidores, moderando o ataque.




Uma linha

Em tom de brincadeira, o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, disse que apresentará um tese no 3º Congresso do PT que terá só título: "Deixa o homem trabalhar!". O prefeito também não aguenta mais ouvir falar em crise. Acha que o PT se acostumou a viver com problemas.




Lula e Dirceu

"Não vou ignorar o Zé [Dirceu]", disse Lula na sexta, pouco antes de chegar ao jantar no qual encontraria o ex-chefe da Casa Civil. Citou Dirceu no discurso e depois lhe deu um abraço. O ex-ministro ficou feliz da vida. A última vez que encontrou Lula foi em dezembro, numa conversa para lá de reservada em Brasília.




O futuro de Lula

Nas conversas reservadas sobre a sucessão de 2010 e o futuro do PT, Lula faz questão de frisar que não endossaria eventual tentativa de modificar a Constituição para que pudesse ser candidato daqui a quatro anos. Afirma ter simpatia pelo final da reeleição.

O presidente fez esses comentários ao discutir com dirigentes do seu partido a proposta que consta de duas teses que serão debatidas no 3º Congresso do PT. Essas teses defendem a possibilidade de o presidente convocar plebiscito para decidir temas de grande impacto nacional. Cientistas políticos, oposicionistas e formadores de opinião avaliaram que a proposta poderia abrir caminho para Lula tentar modificar a Constituição e se candidatar em 2010, cedendo a uma tentação chavista. O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, quer mudar a Constituição para que haja possibilidade de ser candidato a reeleição sem limite de vezes. Lula considera "absurda" a possibilidade de tentar algo parecido.

As teses do PT também pregam o fim da reeleição para todos os cargos majoritários. Lula defende publicamente, por exemplo, mandato presidencial único de cinco anos. Integrantes da cúpula do PT avaliam que ele poderia ser candidato novamente em 2014 ou 2015, a depender do final da reeleição e da duração do mandato presidencial --se quatro ou cinco anos.

Lula acredita que seu atual campo político terá dois candidatos em 2010: o deputado federal Ciro Gomes (PSB) e um petista. No PT, os políticos do "primeiro pelotão" de presidenciáveis hoje são: o governador da Bahia, Jaques Wagner, amigo de Lula; a ex-prefeita Marta Suplicy, que o presidente decidiu levar para o ministério, e o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, nome bem-avaliado pelo mercado e que poderia ser um novo Antonio Palocci Filho, ex-ministro da Fazenda.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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