E N T R E V I S T A

Corrupção de Pitta começou quando ele era secretário de Paulo Maluf, afirma Nicéa

Segundo ela, prefeito gastava mais do que ganhava


Evelson de Freitas

Nicéa em seu apartamento na alameda Franca, nos Jardins
 
VAGUINALDO MARINHEIRO
Editor-executivo da Folha Online
CRISPIM ALVES
Coordenador de Cidades da Folha Online

A ex-primeira-dama de São Paulo Nicéa Pitta afirma, em entrevista a Folha Online, que o prefeito Celso Pitta se deixou levar pela corrupção quando ainda era secretário das Finanças de Paulo Maluf (1993-1996).

Ela afirma que naquela época o ex-marido começou a gastar mais do que poderia com o seu salário. Nicéa diz que, quando questionava o marido de onde vinha o dinheiro, ele afirmava que vinha de uma indenização que ele recebera da Eucatex, empresa da família de Paulo Maluf, na qual trabalhava antes de entrar para a prefeitura.

A ex-primeira-dama diz também que ela e os filhos tentaram evitar que Pitta continuasse envolvido com os corruptos. Durante a entrevista, ela volta a fazer acusações contra Reynaldo de Barros, Flávio e Paulo Maluf e Naji Nahas.

Todos negam qualquer envolvimento com esquemas de corrupção, acusam Nicéa de fazer denúncias sem provas e pretendem processá-la. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Folha Online - Quando a senhora acredita que tenha começado o envolvimento do prefeito Celso Pitta com os esquema de corrupção?

Nicéa - Quando ele ainda era secretário.

Folha Online - A senhora percebia, naquela época, que ele estava ganhando muito dinheiro?

Nicéa - Não, a única coisa que eu percebia era que o padrão de vida da gente melhorou no sentido, por exemplo, de fazer jantares para muitas pessoas. Como, a vida inteira, mesmo no Rio, nós tínhamos um certo controle, achei estranho. Mas ele comentava comigo que a indenização dele da Eucatex (empresa da família Maluf, onde Pitta trabalhava antes de entrar na prefeitura) tinha sido alta. Era sempre a mesma história. Depois, eu descobri que era tudo mentira.

Folha Online - A senhora diria que o grosso do dinheiro da corrupção da prefeitura vem de onde? A senhora já apontou vários caminhos, uma delas são as empreiteiras...

Nicéa - As empreiteiras, empresários de ônibus, empresas lá fora também.

Folha Online - A senhora já diz que o Flávio Maluf (filho do ex-prefeito Flávio Maluf) negocia com as empreiteiras, de que maneira se dá essa negociação?

Nicéa - É ele que tem interesse de fazer os contatos com os empreiteiros, funcionários da prefeitura. Ele vai nos locais, junto com o Reynaldo de Barros. Depois, ele vai almoçar na casa do Reynaldo.

Folha Online - O ex-secretário Reynaldo de Barros continua agindo mesmo estando, ao menos oficialmente, fora da prefeitura?

Nicéa - Vocês viram como ele ficou quietinho ao longo desses anos todos, depois que ele saiu? Mas, sim, ele age agora mais do que nunca.

Folha Online - Quando a senhora acredita que o prefeito e o ex-prefeito Paulo Maluf teriam percebido que a senhora iria fazer as denúncias de corrupção que a senhora fez?

Nicéa - Em nenhum momento. Antes, eu não tinha realmente a intenção de ficar pegando provas ou chantageá-los, entende? Comecei a guardar (provas) após a derrota do Maluf na eleição para o governo do Estado (Nicéa afirma que foi a partir dessa derrota, em 98, que vários políticos passaram a pressionar Pitta a receber dinheiro de empresas para usar em sua futura campanha para a reeleição).

Folha Online - Alguma vez, alguém chegou a oferecer dinheiro para a senhora?

Nicéa - Dinheiro não. Mas acontecia assim. Lembra quando o Maluf comprou aquelas três Mercedes, ele disse que ia me dar uma. Eu não acreditei. Aí, começaram esses corruptos, juntos, a dizer: ‘A senhora também precisa ter um dinheiro seu, como a Silvia (Maluf, mulher do ex-prefeito) tem‘. Foi quando eu disse: 'Saiam daqui'. Mas eu não falava, gritava, as minhas veias saltavam. Eles iam embora e era outra briga (com Pitta). Ele dizia: 'A casa é minha também. Você não pode expulsar as pessoas assim'. Eu dizia: 'Mas você não tem o direito de trazer corruptos para corromper você e a mim'.

Folha Online - Mas nunca chegaram e disseram te dou tanto para que você não fale sobre esse assunto?

Nicéa - Não, isso não.

Folha Online - Eles tinham noção do quanto a senhora sabia?

Nicéa - Eles tinham noção. Tinham noção porque eles exigiam a minha presença sempre (nas reuniões). Era isso que eu me questionava. Eles argumentavam que me achavam muito inteligente, que eu dava sugestões. Mas era para me comprometer também. Mas não conseguiram, porque se tivessem conseguido, eu não teria feito o que fiz.

Folha Online - Essa pergunta já foi feita muitas vezes à senhora. Mas o que a levou a fazer as denúncias? Falam que foi por causa do divórcio, falam que a senhora queria dinheiro do Pitta.

Nicéa - A gota d’água foi quando eu estava no quarto com o Victor, nós estávamos assistindo a enchente, o desabamento (no morro da Lua, que matou 12 pessoas). Via os corpos de crianças. Aí, o Victor me disse: 'O que você esta esperando mãe? Eu e minha irmã não aguentamos mais. Se você não fizer, eu vou fazer'. Eu disse: 'Victor, você não pode. Nem sua irmã. Então, eu faço'.

Folha Online - Mas a senhora já dava sinais de que iria apresentar denúncias há muito tempo.

Nicéa - O meu conflito era exatamente esse. Eu ficava próximo à miséria, à desgraça total de meninos em situação de risco, enchentes. Eu chegava aqui desesperada: 'Celso, não pode mais continuar assim. Esse povo roubando. Vai lá ver Celso, vem comigo. Sai um dia para ir ver'. Ele dizia: 'Lá vem você com a crise de Madre Tereza de Calcutá'.

Folha Online - O desabamento no morro da Lua foi a gota d’água, mas quando a senhora começou pensar em fazer as denúncias?



Nicéa - Meu desespero eram os Naji Nahas e esses corruptos todos vindo aqui em casa. Eu percebia que eles iam vencer. Era só eu, Victor e Roberta a dizer não, (Pitta) não entra nessa, não faça isso, você não precisa. Eu dizia a ele que os noticiários já estavam mais favoráveis a ele. Que existia a possibilidade de ele fazer um bom governo, que ele já tinha pago um preço muito alto pelo Maluf tê-lo indicado. Mas eu via que não tinha jeito. Aí eu comecei, então, a ter que me organizar com provas daqui, provas dali, porque ia ter que fazer isso.

Folha Online - A senhora ainda tem mais denúncias, com provas?

Nicéa - Tudo o que eu tinha que declarar já está com o Ministério Público. Novas acusações surgem porque todos os dias, porque eu recebo de seis a sete denúncias com provas documentadas por dia. Eu sou a porta-voz das pessoas que querem denunciar.



Clique aqui para ler a parte da entrevista em que Nicéa fala de sua vida pessoal.

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