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iniciativa
03/03/2005
Homens se unem pelo fim da violência contra a mulher
Depois de presenciar no seu bairro, por diversas vezes, vizinhos homens bêbados agredindo suas companheiras, o jovem Fabio Leite Alves, 21 anos, decidiu que estava na hora de deixar aquele velho ditado de lado, que diz: "em briga de marido e mulher ninguém mete a colher". "Vi que eu tinha que me meter sim, não podia ficar calado". Hoje, ele está à frente do Grupo Atuação, que reúne 16 jovens homens que discutem questões de gênero, violência contra a mulher, sexualidade, paternidade responsável, entre outros temas, nas comunidades e escolas do Recife, em Pernambuco.

Uma das propostas do trabalho é acabar com a idéia de "macho", "em que o homem deve levar o dinheiro para casa, não precisa dar atenção e carinho à mulher e filhos, sendo o dono da verdade, que não aceita opiniões", explica Fabio. "Não queremos mais passar essa cultura trazida por nossos pais. Não tem que haver disputa entre homens e mulher, mas sim lutar em conjunto, com união", destaca o jovem.

O Grupo Atuação é resultado do trabalho do Instituto Papai, com sede também no Recife. O instituto foi criado há oito anos, após a realização de uma pesquisa que pretendia analisar a invisibilidade dos jovens pais no ambiente hospitalar, principalmente durante o período de pré-natal. A pesquisa percebeu que o mito de que o pai adolescente nunca assumia o filho não era verdade, pois em certos momentos a postura dos garotos era outra. A partir daí, começou então a se trabalhar outras questões voltadas ao homem e a masculinidade, como violência, drogas, sexualidade. A proposta é trabalhar a construção do homem sob a perspectiva feminista e de gênero.

Isso porque, de acordo com Ricardo Castro, psicólogo e assistente de projetos do instituto, questões do movimento feminista apontam para a revisão de modelos hegemônicos tanto de masculinidade quanto de feminilidade. "Nem todos os homens compartilham essas idéias, pois também sofrem com estes modelos, então aproveitamos para questionar", comenta.

Por isso, o objetivo da entidade é promover uma revisão do modelo machista e dos processos de socialização masculina na sociedade, contribuindo, assim para implementação de políticas públicas que visem envolver os homens e jovens em questões relativas à sexualidade e reprodução. A idéia é promover a cidadania com justiça social, a partir da eqüidade de gênero, respeito às jovens gerações e a eliminação de todas as formas de violência.

A proposta é quebrar com o ciclo da cultura machista que ainda existe no país. "É só observar a questão da manifestação dos sentimentos nos homens. Desde cedo, ele não é incentivado a mostrar fraqueza, sensibilidade, medo, mas sim agressividade e a frustração dele de forma reativa, pró-ativa. E essa forma de expressão precisa ser levada em consideração, para que os homens consigam manifestar seus sentidos de outras formas não-violentas", aponta Ricardo Castro.

Uma das principais ações da ONG é a coordenação nacional da Campanha Laço Branco (www.lacobranco.org), que visa envolver os homens na luta pelo fim da violência contra as mulheres. A campanha teve inicio em 1991 no Canadá, em resposta ao Massacre de Montreal, ocorrido dois anos antes, quando um homem entrou em uma escola politécnica e assassinou 14 mulheres e depois se matou. Mas a ação já se estendeu por mais de 30 países. No Brasil, ela começou a se organizar a partir do Seminário "Respondendo à violência intrafamiliar e de gênero: reflexões e propostas de trabalho para o parceiro masculino", realizado em Brasília, em novembro de 1999. A partir de 2001, as organizações passaram a desenvolver ações mais articuladas.

Hoje, a coordenação da campanha é compartilhada com o Instituto NOOS de pesquisas sistêmicas e desenvolvimento de redes sociais (RJ), Instituto Promundo (RJ), ECOS: Comunicação em Sexualidade (SP), Centro de Educação para a Saúde (SP), Pró-mulher, Família e Cidadania (SP) e Rede Acreana de Mulheres e Homens (AC). A campanha reúne um conjunto de estratégias de comunicação com a proposta de envolver e mobilizar os homens no engajamento pelo fim da violência contra as mulheres. O laço branco é um símbolo que representa o compromisso de não cometer um ato violento contra as mulheres e não fechar os olhos para isso. Afinal, hoje, a violência cometida por homens atinge uma em cada cinco mulheres no Brasil.

"Queremos, por meio dessa estratégia, mudar esse cenário de violência e quebrar a linha de cumplicidade que existe quando ocorre este ato. Por isso o tema da outra campanha foi: Violência contra a mulher não tem graça nenhuma, a fim de mudar a forma como a gente trata o tema que pode, muitas vezes, mascarar o problemas. Afinal, aquilo que você acha que é tão normal, não é. É errado. E isso traz conseqüências não somente para as mulheres, mas para os homens também. Ninguém quer se ver como autor da violência, pois traz conseqüências para a saúde, relacionamento, humanidade e tudo mais", comenta o psicólogo.

Ricardo aponta que a campanha busca ainda estimular não somente aos homens a não praticarem essa violência, mas também que eles não fiquem calados quando percebam um ato violento. E isso tem trazido resultados positivos. O jovem Fábio Alves, por exemplo, afirma que hoje "abraça a campanha de corpo e alma".

Apesar das ações da campanha se tornarem mais intensas na semana do dia 25 de novembro, quando se comemora o Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher, neste ano, algumas ações já foram realizadas pela campanha, principalmente em Recife, onde o Instituto Papai está localizado. Durante o Carnaval, o instituto participou do bloco carnavalesco "Nem com uma Flor", uma iniciativa da Prefeitura do Recife, organizado pela Coordenadoria da Mulher e Secretaria de Saúde, que faz menção àquela antiga canção: "em que se diz que não se bate em mulher nem com uma flor".

Além disso, foi organizado o bloco carnavalesco "Homens e Mulheres na folia pelo fim da violência contra a mulher". Na ocasião, além de bonecos gigantes, foram distribuídas 5.000 fitinhas, símbolos da campanha no Brasil. Agora em março, no Dia Internacional da Mulher (08/03) o Instituto Papai também estará envolvido em atividades em conjunto com o Fórum de Mulheres de Pernambuco.

A novidade da campanha nestes últimos meses é a criação da Rede de Homens pela Eqüidade de Gênero (RHEG), com a participação de todas as organizações coordenadoras, que visa articular as ações não só da campanha, mas dessa temática de uma forma em geral, e dar um caráter mais político para as atividades. O objetivo é que as políticas de gênero no país possam ser vistas também sob a perspectiva das especificidades dos homens. "Não é tirar o espaço da mulher, mas unir, agregar para que todos saiam ganhando. A proposta, por exemplo, é sensibilizar os centros médicos públicos que negam a presença dos pais durante o pré-natal ou o parto", comenta Ricardo Castro.

Educação como base
Um dos trabalhos principais do Instituto Papai é atuar em espaços sociais freqüentados pelos homens, como bares e campos de futebol, promovendo grupos de reflexão, ou ações de educação popular junto aos jovens de diversas comunidades pobres da região, organizando atividades como oficinas, palestras e produção de peças teatro, a fim de discutir questões como sexualidade, drogas, prevenção à violência, Aids, paternidade.

Hoje, o instituto já dá suporte e apoio técnico para grupos que foram se montando após a atuação da entidade no local, como o Grupo Atuação, no bairro da Várzea, da qual Fábio faz parte. O jovem conta que, no inicio, os adolescentes acharam estranha a idéia de reunir somente homens para discutir essas questões, tendo em vista que, normalmente, os grupos formados são mistos ou somente de mulheres. "Fui por curiosidade e achei muito interessante", recorda. Depois de três anos, aqueles jovens acharam que já era hora de andarem com as próprias pernas e colocarem em prática, como multiplicadores, o que aprenderam com o Instituto Papai.

Há ainda o Grupo de Homens Jovens de Camaragibe, em parceria com o Programa Saúde da Família, que envolve cerca de 30 jovens do sexo masculino. Eles atuam como educadores e intermediadores da comunidade, distribuindo camisinhas e conversando sobre estes temas da sexualidade conforme a realidade daquela comunidade. Ricardo Castro ressalta que o instituto tem observado que algumas temáticas têm mais acesso aos jovens, como a questão da violência da mulher, e que estão mais envolvidos no processo de discussão, principalmente por serem grupos exclusivamente formados por meninos. Isso porque, em grupos mistos, a grande participação era feminina.

De acordo com o psicólogo, é preciso ter um olhar de atenção sobre a educação, principalmente para observar como é a construção do processo de violência e como é a socialização desse tema, a fim de que as ações com os jovens consigam quebrar esse ciclo de violência. Na saúde, a atuação do instituto é junto aos profissionais homens, que possam vir a atender uma mulher vítima de violência. "Quando se deparar com isso, ele tem que pensar em toda uma questão de gênero que está por trás, e não mais apenas que é uma pessoa que chegou com um machucado, uma escoriação. O seu comportamento tem que estar atento a isso", aponta Ricardo. A organização busca também, em conjunto com Fórum de Mulheres de Pernambuco e com o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais, levar a disseminação da campanha e de atividades para o interior do estado, principalmente no sertão.

DANIELE PRÓPERO
do site setor3

 
 
 

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