HOME | NOTÍCIAS | COLUNAS | SÓ SÃO PAULO | CIDADÃO JORNALISTA | QUEM SOMOS
 

Garagem Digital
06/07/2004
Infomática promove cidadania juvenil

"Passei a ver a vida com outros olhos. O meu jeito de ser também mudou. Eu era uma menina que não tinha muito valor aos olhos dos outros; era muito zoada. Aqui, aprendi a dar valor a mim mesma, a usar minha inteligência, a mostrar o que sinto e trocar experiências. (...) O programa tenta mobilizar a comunidade, usando as máquinas [computadores]. O que eu gosto é que não se reduz a uma capacitação em informática. Tem também a parte de entender a comunidade e a si mesmo".

É assim que Monique de Oliveira Souza, uma jovem de 17 anos, que vive no Jardim São Gonçalo, no extremo leste da cidade de São Paulo, define o Garagem Digital, programa desenvolvido a partir da parceria entre a Fundação Abrinq - pelos Direitos da Criança e do Adolescente e a HP Brasil, e realizado pelo Centro Profissionalizante de Adolescentes Padre Bello (CPA).

Há apenas três meses, a adolescente participa do Módulo de Formação do Programa, mas parece já ter entendido sua proposta. Conforme define Roseni Reigota, coordenadora do Programa pela Fundação Abrinq, "o objetivo é capacitar jovens, usando a tecnologia como ferramenta do processo de aprendizagem". Na sua opinião, "a tecnologia não pode ser vista apenas como um meio de consumo, mas uma ferramenta para a construção de um mundo mais igualitário. A inclusão digital é um direito de todos, assim como a escolarização, a cultura, o trabalho. Ela vem, portanto, agregar-se a esse leque de direitos, por vezes negados a pessoas de baixa renda, e que trazem a possibilidade de melhora da qualidade de vida, contribuindo para a justiça social".

Aproveitando as oprtunidades
Mobilizar a comunidade para que ela consiga lutar por seus interesses também foi a principal lição apontada por Paulo de Jesus Cunha Filho, de 17 anos, nesses três primeiros meses de curso. "Apesar das dificuldades e das diferenças de uma comunidade que não tem tantos recursos como a nossa, sabendo aproveitar as oportunidades, acho que a gente pode alcançar o que se deseja. Acho que o curso reforçou a idéia - que eu já trazia - de que é fundamental a gente se conscientizar sobre a própria situação, sobre as potencialidades e sobre os direitos para depois ir atrás do que quer. Não dá para argumentar com os políticos de mão abanando, tem que ter argumentos para levar isso adiante", sugere o Paulo.

Os dois adolescentes, junto com mais 118 jovens de 14 a 24 anos, que fazem parte da quarta turma do Garagem Digital, vão passar mais seis meses capacitando-se em tecnologias de informação e comunicação (TICs). No final do curso, vão construir um site e um jornal para debater temas como drogas e violência. Em seguida, seus currículos serão disponibilizados no Rede de Oportunidades, um site lançado no início de maio pela Fundação Abrinq e pela HP, que tem a função de promover o encontro entre empresas, instituições educacionais e outras organizações com esses jovem que saíram do curso.

Juarez Zortea, coordenador do Conselho de Responsabilidade Corporativa da HP Brasil, recorda que as organizações parceiras sentiam a necessidade de dar continuidade ao Programa depois de concluir o curso e por isso criaram o Rede de Oportunidades. "Os jovens que saem do curso sabem trabalhar não só com a tecnologia, mas também desenvolvem outras aptidões, que aumentam sua competitividade no mercado de trabalho", avalia Juarez.

O site aproveita a rede de contatos da Fundação Abrinq e da HP para atrair novos parceiros para o Programa. Embora o objetivo da Rede, segundo Juarez, não seja assegurar que o adolescente saia do projeto com um emprego garantido, o coordenador afirma que, dessa forma, "o Garagem Digital ajuda a promover a inclusão digital do adolescente e sua inserção no mercado de trabalho". Ele acrescenta que o Rede de Oportunidades ainda é um projeto piloto, restrito a um número limitado de jovens, mas que deve ser ampliado, por meio da incorporação de outras iniciativas.

Conexão Aprendiz
Gláucia Cavalcante, 18 anos é ex-aluna do Programa Garagem Digital. Hoje, ela é contratada do Conexão Aprendiz, um site realizado em parceria entre o CPA, a ONG Cidade Escola Aprendiz e a empresa JP Morgan, e lançado no início de junho para divulgar a Lei do Aprendiz, sistematizar informações e incentivar as empresas a contratarem aprendizes. Lá, ela cuida da tecnologia do site, inserindo todo o conteúdo no ar.

A jovem diz que a experiência mais rica que teve no Garagem Digital foi ser representante de turma. "Com essa experiência, aprendi que, para trabalhar em grupo, é preciso ter paciência. Entendi que é preciso respeitar a opinião dos outros".

Aliás, ouvir o que os jovens têm a dizer é uma característica do CPA. O monitor do Garagem Digital, Rubens Tavares Macena Rocha, 20 anos, que já tinha feito cursos no CPA antes de trabalhar nesse Programa, diz que o diferencial do curso é "a forma como os jovens têm poder de voz". Ele considera que isso também diminui a evasão. "Até agora, só saiu um aluno de cada turma. Um porque preferiu fazer outro curso, outro porque conseguiu um emprego", esclarece. Adelson Rodrigures da Silva, assistente de projetos do CPA, completa que a "a instituição tem a filosofia da democratização do conhecimento a partir da construção coletiva. Aqui, acreditamos que o conhecimento é um direito de todos".

No ano passado, a turma do Garagem Digital construiu o site do projeto Presidente Amigo da Criança, da Fundação Abrinq. Ronaldo Manoel da Silva, 18 anos, que hoje trabalha no estoque do Atacadão Guarujá, coordenando o trabalho de mais dois funcionários, diz que "quando o site entrou no ar, ninguém acreditava. No começo, a gente se perguntava como 120 alunos iriam conseguir fazer um site, que fala de um assunto tão importante. Mas conseguimos dividir o trabalho de tal forma que a construção foi possível". Ele diz que essa experiência lhe ensinou a lidar com conflitos, situação com a qual ele se depara freqüentemente hoje em dia no seu ambiente de trabalho.

Metodologia
O Garagem Digital é um programa que vem sendo desenvolvido de forma piloto desde 2001. Passou pela Associação Meninos do Morumbi e hoje é realizado apenas no Centro Profissionalizante Padre Bello (CPA). O Programa já capacitou 360 alunos. Atualmente, as organizações parceiras estão estudando formas de replicar o programa. "Agora que a metodologia está consolidada, a disseminação vai facilitar a democratização do acesso às tecnologias", diz Roseni.

O projeto está organizado em quatro eixos: o Módulo de Formação, Acesso Livre, Integração (do projeto com outros que são desenvolvidos pela ONG parceira) e Mobilização Comunitária.

No módulo de formação, os jovens participam de um curso de 300 horas. Embora elas se apresentem de forma integrada, o currículo está dividido em cinco áreas temáticas: tecnologias da informática e comunicação; administração e marketing; arte e design; ciências sociais e linguagem e escrita. Ao final do curso, os alunos devem construir um produto concreto. Até agora, foram criados os site do projeto Presidente Amigo da Criança, da Associação Meninos do Morumbi e da Escola Estadual Adolfo Gordo.

Os computadores utilizados no curso podem ser usados pela comunidade em geral. Alguns alunos do Módulo de Formação são voluntários no Acesso Livre. Dona Maria Dores Santana, é agente comunitária do Programa Garagem Digital. Há oito anos no Jardim São Gonçalo, ela diz que sempre atuou na mobilização da comunidade, pois já trabalhou para a Pastoral da Criança e é presidente da associação de moradores.

Ela conta que a receptividade da comunidade em relação ao Garagem Digital "foi maravilhosa" e que ela já está se apropriando do espaço. "A inclusão digital é importante porque ajuda o cidadão em todos os sentidos: a tirar a segunda via de documentos, a colocar o currículo na Internet ou até a pegar a receita de um bolo no site da Ana Maria Braga", afirma.

O objetivo da mobilização comunitária no Garagem Digital é pensar o desenvolvimento local a partir das tecnologias. Para isso, foram formados grupos de discussão, as chamadas "Rodas de Inclusão Digital", na qual representantes da associação de moradores, de telecentros se reúnem para afinar o discurso e apresentar práticas que possam influenciar as políticas públicas na comunidade. "A intenção é dar autonomia para a comunidade tocar o Garagem Digital e também para criar novos projetos de inclusão digital na região", afirma Roseni.



LAURA GIANNECCHIN
do site setor3

 
 
 

NOTÍCIAS ANTERIORES
06/07/2004 Grupo toca para moradores de rua
05/07/2004 Arte Cidadã oferece cultura e esporte no PA
05/07/2004
Professores gaúchos transformam notícias em fontes de debates
05/07/2004
Moradores enfeitam cidade com materiais reciclados
02/07/2004
Arte de tecer garante renda em terapia em Londrina
01/07/2004
Projeto Cidadão Mirim procura voluntários
30/06/2004
Projeto ensina a "cuidar" de jovem com HIV
30/06/2004
Voluntários viajam para salvar uma vida
29/06/2004 Projeto une esporte e aprendizado
28/06/2004 Treinamento de leigos é essencial em caso de emergência cardíaca