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16/07/2007

Estudo liga gravidez indesejada a crimes violentos em cidades de SP

Queda de 10% no número de crianças que vivem com mães solteiras reduziria em 5,1% os homicídios


A gravidez indesejada é uma causa muito mais importante dos crimes violentos no Estado de São Paulo do que a desigualdade ou outros indicadores econômicos. Esta é a conclusão de um trabalho do economista Gabriel Hartung, em etapa final de elaboração. O estudo foi realizado com base na análise estatística de dados demográficos e econômicos de 643 dos 645 municípios de São Paulo.

O levantamento partiu do famoso estudo do economista americano Steven Levitt - autor do best-seller Freakonomics - que demonstrou a ligação entre legalização do aborto nos Estados Unidos e a queda da criminalidade duas décadas depois. Como no Brasil o aborto é ilegal e não há estatísticas confiáveis sobre o assunto, a opção de Hartung foi a de examinar os indicadores de mães adolescentes e solteiras. A relação entre gravidez indesejada e o fato de a mãe ser solteira ou adolescente já foi exaustivamente comprovada.

Mas os resultados do trabalho mostram que uma queda no número de crianças vivendo com mães solteiras diminuiria a taxa de homicídios três vezes mais do que reduções idênticas na desigualdade - e quatro vezes mais do que uma aceleração equivalente do crescimento econômico. Assim, uma queda de 10% no número de filhos criados por mães solteiras provocaria uma redução de 5,1% na taxa de homicídios. Já uma diminuição de 10% na desigualdade reduziria a taxa de homicídios em apenas 1,7%. E uma aceleração de 10% no ritmo de crescimento econômico teria um efeito de 1,2% sobre os homicídios.

Segundo o pesquisador, o trabalho aponta o controle de natalidade como instrumento fundamental para o combate à criminalidade no Brasil. Pessoalmente, ele também defende a descriminalização do aborto. ?O meu estudo é uma evidência de que a gravidez indesejada aumenta o crime?, diz Hartung, que faz doutorado na Escola de Pós-Graduação em Economia (EPGE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio.

Ele explica que o canal entre a gravidez indesejada e o crime violento é a criação dos filhos em um ambiente familiar deteriorado, que tipicamente consiste num lar chefiado por uma mulher sem marido ou companheiro, que muitas vez deu à luz na adolescência. Dessa forma, essas crianças têm probabilidade maior de se tornarem criminosas quando chegarem à adolescência ou à juventude.

E o problema tende a piorar. A proporção de mães com menos de 17 anos saltou 45%no Brasil, entre 1991 e 2000, e os domicílios chefiados por mulher aumentaram 38%nesse período. O pesquisador observa que ?reduzir o número de mães solteiras, por meio de uma política pública, é provavelmente muito mais fácil do que conseguir diminuição equivalente da desigualdade?. De 1997 a 2005, o Brasil obteve melhora da distribuição de renda substancial, que chegou a ser saudada como ?espetacular? por alguns economistas, como Ricardo Paes de Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Essa queda da desigualdade foi de 5,4%.

Segundo o estudo de Hartung, uma melhora da distribuição desta magnitude em São Paulo tem um efeito na taxa de homicídios de 0,9%. A experiência histórica brasileira e internacional indica, por outro lado, que reduções de desigualdade daquela intensidade normalmente só ocorrem ao longo de vários anos. Em outras palavras, uma política de combate à criminalidade que focasse exclusivamente na redução da desigualdade levaria décadas para obter redução perceptível nos crimes violentos, como homicídios e estupros.

O economista considera que Diadema, um dos municípios mais violentos de São Paulo, teria em 2000 uma taxa de homicídios 14,3% menor do que a registrada, se na década anterior o porcentual de crianças vivendo com mães solteiras fosse de 16,3%, como em Barretos, no interior paulista. O índice efetivamente registrado em Diadema em 1991 foi de 22,9%. A redução da taxa significaria 70 assassinatos a menos por ano em Diadema.

O objetivo básico desse estudo era buscar as causas da diferença entre as taxas de homicídios registradas nos municípios paulistas. Para tanto, Hartung fez uma análise estatística de vários indicadores de cada cidade entre os anos de 1999 e 2001, como renda, crescimento econômico, tamanho do município, escolaridade média e desigualdade.

Fernando Dantas
O Estado de S.Paulo.