Escola
na periferia de Salvador conta com o empenho dos professores
para suprir a carência de recursos
Instalado num beco da comunidade da Baixa do Petróleo,
na periferia de Salvador, o galpão era o salão
de festas da Igreja Nossa Senhora da Piedade. O espaço,
cercado por terra batida e muros altos, tinha piso cerâmico,
telhas de barro sem forro, iluminação precária
e problemas de manutenção. Para além
dos muros, barracos, palafitas, botecos e violência
- a região responde por 20% dos homicídios na
cidade.
Mesmo assim, há 22 anos, a pedido da comunidade, a
Igreja cedeu o espaço para a instalação
de uma escola pública de ensino fundamental. O galpão
recebeu biombos de madeira, com até 1,60 metro de altura.
Eles delimitavam as salas de aula. E não impediam que
se embaralhassem as vozes de 9 professores e de 300 alunos.
O cenário, desolador do ponto de vista educacional,
não impediu a Escola Municipal Primeiro de Maio de
ser a única da capital baiana a ter destaque no estudo
'Aprova Brasil, o Direito de Aprender', do Ministério
da Educação com o Fundo das Nações
Unidas para a Infância (Unicef). A pesquisa foi baseada
no resultado que alunos da 4ª série do ensino
fundamental conseguiram na Prova Brasil. Eles cravaram 181,14
pontos em português e 200,90 em matemática -
as médias nacionais foram, respectivamente, 172,90
e 180.
'Nosso segredo é o engajamento, o compromisso e a
capacidade dos professores', afirma a diretora Simone Barbosa
de Jesus, de 32 anos. 'Não há outra explicação:
não temos recursos para atividades extras, para investir
em material didático diferenciado, para abrir a escola
no fim de semana.'
Simone conta que apenas dois professores não moram
na comunidade, o que permite maior proximidade com os moradores.
'Quando um aluno não vem à aula, o professor
vai até a casa dele para saber o que está acontecendo',
diz ela, que mora a 200 metros da escola.
Para Simone, o objetivo é que as crianças passem
a maior parte do tempo possível dentro da escola. 'Vivemos
em uma comunidade de risco, na qual alguns pais praticam atividades
ilegais para sobreviver. Quanto menos as crianças ficarem
expostas, melhor.'
Por causa dessa preocupação, a unidade tem
vagas para crianças a partir de 4 anos. A pré-escola
fica a cargo de uma das mais experientes professoras, Deise
Tosta, há 15 anos no local. 'E apenas dois professores
não têm curso superior, compensado com muita
dedicação', ressalta a diretora.
Os pais também contribuem com a instituição.
A mãe de um aluno ensaia estudantes para o coral. Um
outro pai, ex-aluno da unidade, ensina artes.
Evasão e melhorias
Simone conta que casos de evasão escolar são
raros, mas que, no ano passado, 30 alunos saíram. 'O
governo entregou um conjunto habitacional em outro bairro
a alguns moradores das palafitas', explica.
Em 2006, o índice de aprovação foi de
84,3%. Por causa do resultado na Prova Brasil e do empenho
dos professores, a prefeitura fez melhorias no local: instalou
divisórias fixas e ventiladores, cimentou a área
externa e deu TV, DVD, armários, geladeira e fogão.
'O investimento (R$ 40 mil) foi pequeno perto do que esses
professores conseguiram', reconhece o secretário municipal
de Educação, Ney Campello.
Tiago Décimo
O Estado de S.Paulo
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