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27/08/2007
Carta feita por Mara Gabrilli

Excelentíssimos(as) Senhores(as) Deputados(as),

Não queremos um passo a trás se podemos avançar dois à frente


A entrada em pauta para votação do Projeto de Lei 7.699 de 2006, que cria um Estatuto para a Pessoa com Deficiência, é retrato da incompatibilidade, infelizmente ainda muito presente na nossa cultura, entre o desejo do legislativo e da população. Muitas leis importantíssimas estão no baú do esquecimento enquanto esta, que não é nem nunca foi almejada pelo segmento das pessoas com deficiência, já está para ser votada. Parece que faltou uma velha regra, que ainda guia as melhores condutas e resultados: o questionamento público.

Em agosto do ano passado, a oitava Reunião do Comitê Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) finalizou o texto da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência com o propósito de instituir no sistema internacional de proteção dos direitos humanos um documento base sobre os direitos dessas pessoas a ser seguido por todos os Estados-Parte. Para chegar à redação final do documento, 192 países se reuniram em Nova Iorque, Estados Unidos (e que tive a honra de participar), para definir quais seriam essas diretrizes para a regulamentação da inclusão social e da não discriminação das pessoas com deficiência no mundo. A delegação brasileira incluía a coordenadora da CORDE, Izabel Maior, que estava presente ajudando nessa consolidação subsidiando o processo com as nossas leis, políticas e práticas inclusivas.

O documento final, aprovado por unanimidade em dezembro de 2006 por todos os participantes (incluindo o Brasil), confirma os direitos dos cidadãos com deficiência, proibindo a discriminação em todos os aspectos da vida e visibilizando as obrigações que devem ser observadas para que as pessoas com deficiência possam exercer e gozar integralmente o direito à educação, aos serviços de saúde e à acessibilidade, entre outros. O documento, em seus 50 artigos, também assegura o reconhecimento da igualdade perante a Lei, o acesso à justiça, bem como a liberdade e a segurança da pessoa com deficiência como pontos fundamentais de respeito aos direitos humanos e à inerente dignidade da pessoa humana.

Estima-se que existam 650 milhões de pessoas com deficiência no mundo. No nosso País, são 24 milhões. O Brasil possui uma vasta legislação para esses cidadãos com deficiência, o que mostra a preocupação brasileira com a inclusão dessas pessoas. Mas, infelizmente, o PL 7699/2006 não vai apenas consolidar todas essas leis em uma só, ele vai criar uma própria diretriz brasileira. Ora, se participamos ativamente da produção de um documento mundial, por que dar um passo atrás e criar uma legislação brasileira que será ultrapassada tão logo seja ratificada a Convenção da ONU? E pior: que será dificilmente revogada para que tomemos o de maior importância, que é o da ONU?

No dia 30 de março deste ano, o Brasil - por meio da Secretaria Especial de Direitos Humanos - assinou a Carta e o Protocolo Facultativo da Convenção da ONU. Com este projeto em votação, como explicar aos nossos parceiros - presentes àquela Convenção - que, apesar da intensa participação brasileira em Nova Iorque, resolvemos criar, aqui e sem consulta das bases e daqueles participantes, nosso próprio Estatuto?

Não podemos deixar que alguns legisladores dêem esse péssimo exemplo. Afinal, pela democracia, os senhores devem consolidar a vontade dos seus eleitores. E nós não queremos um Estatuto à revelia da Convenção Mundial. O Brasil está caminhando para frente nas questões que tangem a causa da pessoa com deficiência e, agora, não podemos deixá-lo escorregar para trás.

Por isso, contamos com a sua ajuda.

Mara Gabrilli

Vereadora por São Paulo pelo PSDB
Tetraplégica e defensora da causa da pessoa com deficiência e mobilidade reduzida