Cresce cobrança por transparência de ONGs

Além do aspecto financeiro de fontes de recursos e gastos, controle visa a eficiência e os resultados das atividades do 3º setor

Cobrança por transparência ganhou força nos EUA após o 11 de Setembro, e, no Brasil, depois de escândalo de desvio de verbas públicas

ANDRÉ PALHANO
da Folha de S.Paulo

De seis em seis meses, os habitantes do pequeno município de Boca da Mata, situado em região carente de Alagoas, ouvem uma programação inusitada na rádio local: a transmissão ao vivo de audiência pública na Câmara Municipal cujo assunto é a prestação de contas do Instituto Girassol de Desenvolvimento Social, ONG (Organização Não-Governamental) que trata de questões relacionadas à juventude na região.
Além de detalhar a utilização dos recursos públicos e privados recebidos, a prestação de contas também envolve os resultados e as metas dos trabalhos desenvolvidos pelo instituto. Muitos dos ouvintes já conhecem de antemão os números: todos os meses, a ONG divulga em locais públicos um balancete mensal com a prestação de contas de suas atividades.
O exemplo do Instituto Girassol ilustra demanda crescente sobre as organizações do chamado terceiro setor: a transparência e a prestação de contas à sociedade. Que em um sentido mais amplo, conhecido pelo termo em inglês "accountability", não se restringe ao aspecto financeiro de fontes de recursos e gastos, mas também da eficiência e dos resultados de suas atividades. "O grande desafio que se coloca hoje para ONGs, institutos e fundações que compõem o terceiro setor não é só tornar públicos os seus números mas também os seus resultados, que na maior parte dos casos não são de curto prazo", diz o advogado Eduardo Szazi, autor de "Terceiro Setor - Regulação no Brasil".
Como tendência mundial, essa cobrança por maior transparência ganhou força após os atentados do 11 de Setembro, que, descobriu-se mais tarde, tinham ligação indireta com o financiamento de entidades sem fins lucrativos vinculadas à comunidade muçulmana nos EUA. Os escândalos envolvendo fraudes contábeis de grandes empresas norte-americanas, na mesma época, também elevaram o rigor sobre o nível de transparência de maneira geral. "Esse ambiente de maior preocupação com o terrorismo e a lavagem de dinheiro levou a um escrutínio inédito dos gastos das organizações nos EUA e na Europa", diz Szazi.

CPI das ONGs

No Brasil, além das exigências mais rígidas dos financiadores internacionais, a questão ganhou fôlego com o debate sobre a utilização de recursos públicos e os recentes escândalos envolvendo desvios irregulares de verbas. Para ter uma idéia do peso do Estado no terceiro setor, pesquisa realizada pela FGV (Fundação Getulio Vargas) revelou que mais da metade das ONGs no Brasil é mantida por recursos oriundos do setor público.
Na esteira dos escândalos e da CPI das ONGs no Congresso, o governo endureceu as regras de repasse para as organizações. Ao mesmo tempo, parlamentares aproveitaram a CPI para apontar projetos isolados de mudanças na regulamentação do terceiro setor. Boa parte desses projetos preocupa os representantes de ONGs e fundações. "A maioria dos projetos de que temos notícia até agora sugere regulação que castra a liberdade das organizações", diz Eleilson Leite, coordenador da Abong (Associação Brasileira das ONGs) em São Paulo.
Na opinião dele e de outros representantes do setor, tais propostas refletem uma percepção equivocada em relação à participação das organizações nos casos de desvio de recursos públicos. O advogado Eduardo Szazi, por exemplo, defende que o problema não é da regulamentação específica, mas dos critérios -e do nível de transparência- que o setor público exige na seleção de seus parceiros. "Espero que a CPI mostre justamente que as envolvidas não eram organizações, mas quadrilhas travestidas de organizações. O que ocorre é que essas entidades, como quaisquer outras, não são imunes a isso", afirma Szazi. "Castrar a liberdade e a facilidade de formá-las, no entanto, vai contra uma conquista democrática importante de nossa sociedade."
"Ao mesmo tempo em que há avaliação geral de que a legislação atual não é apropriada, não se pode burocratizar demais um segmento para o qual a flexibilidade e a agilidade de atuação são fundamentais, inerentes à natureza de seu papel social", diz a pesquisadora Leilah Landim, uma das coordenadoras do Projeto Transparência e Prestação de Contas da Sociedade civil na América Latina, que abrange oito países.
Enquanto mudanças de ordem regulatória são debatidas, as organizações vão se adaptando ao ambiente de maior cobrança por transparência e prestação de contas. Há casos de entidades cujo trabalho é justamente orientar organizações, geralmente de pequeno porte, sobre como se tornarem mais transparentes -o que se tornou um ponto de diferenciação na cada vez mais acirrada competição pelo financiamento público e privado.
Qual o nível de transparência ideal? Segundo os especialistas, aquele que seja condizente com o porte e a complexidade da organização. "Exigir transparência não se trata de burocratizar as ações das organizações. Isso inviabilizaria, por exemplo, entidades informais pequenas, localizadas em lugares onde são extremamente necessárias e onde o seu trabalho é muito relevante", aponta Carolina Trevisan, consultora da Fundação W.K. Kellogg.

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