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Governo policial - 07.mai.2000 (Sem terra)

Questão social não é caso de polícia. É caso de política. O governo FHC está sendo incapaz de promover o diálogo e o país caminha para impasses perigosos. Os setores organizados da sociedade brasileira estão sendo obrigados a radicalizar suas manifestações para fazer o governo entender que a situação do povo está insuportável.

Acredito que o governo tem uma política premeditada de levar os sem-terra à radicalização, em mais uma tentativa de isolar o movimento. Isso é prova de incompetência política e não vai dar certo.

A soberba e a vaidade são dois instintos que tornam os governantes pequenos. Eles se fecham em si mesmos e não negociam com os setores sociais as suas legítimas reivindicações. Acreditam somente nas coisas que estão nas próprias cabeças. É o que está acontecendo com esse governo.

Não há nenhuma diferença entre o tratamento que FHC está dando aos sem-terra e o que os militares da ditadura deram aos metalúrgicos nas greves de 80. Quando eles prenderam os líderes do movimento, queriam acabar com a greve. Ocorreu o contrário: a greve cresceu.

Agora, a tentativa do governo é a de amedrontar e acuar os sem-terra. O tiro vai sair mais uma vez pela culatra.

Tombou mais um brasileiro sem terra ferido de morte pela polícia por defender direitos sociais. As cenas de violenta repressão às manifestações do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) mostradas durante a semana na televisão lembram os piores períodos da ditadura. E o governo finge que as ações deles são casos isolados de descontentamento. Não são.

Em todos os segmentos da sociedade, de setores empresariais aos sem-terra, passando pelos sem-teto, sem-saúde, sem-emprego, professores, caminhoneiros, funcionários públicos, aposentados e pensionistas, o sentimento é de total revolta contra o governo.

Eu, particularmente, não defendo a ocupação de prédios públicos. Mas, neste momento, o governo está impondo a radicalização à sociedade brasileira, que clama por diálogo. É preciso acabar com o entreguismo da equipe econômica, dar um fim à arrogância de FHC, impor limites à insensibilidade e intransigência dos governantes.

Há momentos em que a sociedade precisa ser radical. Radical para acabar com a corrupção. Para acabar com exemplos de governantes como Pitta, em São Paulo. Para evitar a subordinação do Brasil ao FMI. Para fazer justiça social. Para fazer a reforma agrária. Para dar comida aos que têm fome.

O grande problema do nosso país hoje, além do agravamento dos problemas sociais, é o fato de o governo não dispor de interlocução com os movimentos organizados da sociedade.

Em um país pobre como o Brasil, um presidente que posa de cientista político não pode se fechar em uma redoma de vidro, recusando-se a escutar o clamor de sua gente. Isso só pode resultar em corrupção, violência contra índios e negros, morte de sem-terra, arrocho salarial, desemprego e um salário mínimo de R$ 151.

O governo precisa compreender que o Brasil tem movimentos sociais com representação legítima nos partidos e em suas entidades. É dever democrático do governo procurar esses representantes na sociedade e discutir de uma vez por todas uma saída para a crise social. Uma crise que é profunda. E cuja má condução poderá levar a situações como as recentemente ocorridas no Equador e na Bolívia.

O momento exige que sejamos solidários na palavra e na ação. Exige que cada um assuma e reforce o seu compromisso de lutar para acabar de vez com a miséria do nosso povo. Exige que continuemos lutando para que todo brasileiro possa fazer pelo menos três refeições por dia. Que toda criança esteja na escola. Que todo adulto em condições de trabalhar tenha emprego.

Todo cidadão consciente deve ter o compromisso de ajudar o nosso povo a transformar radicalmente essa dura e triste realidade do nosso país. O governo está sem rumo. A grande maioria da sociedade brasileira precisa se levantar em defesa da democracia e do Brasil.


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