Folha de S.Paulo Moda
* número 19 * ano 5 * terça-feira, 31 de outubro de 2006
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moda / moda verão 2007

O futuro bate à porta

por Alcino Leite Neto
fotos Associated Press, France Presse, Reuters e EFE


Desfile de Chalayan; a roupa à esquerda mudou de forma, transformando-se no look à direita, graças a recursos tecnológicos

Imagens futuristas pontuaram os desfiles do hemisfério Norte durante a temporada primavera-verão 2007, nos meses de setembro e outubro. Elas surgiram em Nova York, com a coleção de Francisco Costa para a Calvin Klein, e seguiram para Milão, freqüentemente em fórmulas retro-futuristas, ou seja, com referências aos modelos de futuro imaginados nas décadas de 60, como o de Courrèges. Atingiram seu ápice em Paris, nas coleções da Balenciaga e de Hussein Chalayan.

A Balenciaga apresentou uma coleção de grande impacto inspirada em andróides, buscando criar sínteses entre as formas femininas e as imagens robóticas que pululam no cinema e nos quadrinhos. Chegou a colocar nas modelos leggings de metal dourado, como se elas fossem descendentes de Robocop.

O cipriota Chalayan fez o desfile mais espetacular da "saison", ao utilizar recursos tecnológicos para produzir roupas que se metamorfoseavam na passarela, ao simples toque de um controle remoto. No último look, o chapéu da modelo "engoliu" toda a sua túnica, deixando-a inteiramente nua, como se pode ver na capa deste caderno de tendências da temporada. A visão foi ao mesmo tempo inventiva, lírica, sensual e bombástica. Em geral, as criações dos estilistas servem para cobrir as mulheres, não para despi-las.

O passado foi um tema dominante da moda nos últimos tempos. Os fashionistas chamam de "romantismo" essas referências saudosistas que povoaram a moda e estiveram muito ancoradas em evocações da indumentária aristocrática, como o Antigo Regime ou o período napoleônico.

Agora, os designers decidiram arriscar novas descobertas. Naturalmente, o futuro depende mais das mulheres concretas do que da vontade dos criadores. Fora das passarelas, nas ruas, na vida cotidiana, há um claro desejo de praticidade na moda, de esportividade e de juventude. Os estilistas responderam a essas demandas com imagens jovens da mulher, com muitas referências ao estilo esportivo, com looks "easy chic" (uma elegância casual) e também com experimentações e apostas.

A temporada foi, justamente, marcada pelos impasses entre nostalgia e desejo de futuro, pelos contrastes entre a elegância tradicional e o cada vez mais influente sportswear, além de ter sido perpassada, por se tratar do verão, pela preocupação em encontrar uma nova sensualidade, em que a exibição generosa do corpo seja mais um sinal de liberdade e de força do que de subserviência aos clichês publicitários e eróticos relacionados à mulher.

No esforço de arriscar o futuro, alguns estilistas demonstraram um claro desejo de explorar arquiteturas ousadas, ao ponto, inclusive, de desafiar as formas naturais do corpo, como Nicholas Ghesquière (da Balenciaga), que disse pretender remodelar a anatomia feminina.

É uma provocação, mais que um fato. Todo grande criador de moda sabe que, no final das contas, as roupas servem a um propósito muito simples, e assim será para todo o sempre: são apenas um acréscimo de encanto ao que já foi dotado de graça pela própria natureza. Eis a lição de Chalayan: revelar, por detrás de toda a tecnologia da roupa, a força natural da mulher.

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