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Moda e liberdade

Duas coleções deram um brilho especial ao Fashion Rio e à São Paulo Fashion Week, que ocorreram neste mês. No evento carioca, Lenny mostrou como a moda praia, apesar de trabalhar com peças espacialmente muito limitadas _um biquíni, um maiô_ pode atingir um ponto alto de criação. No evento paulista, Alexandre Herchcovitch apresentou uma coleção feminina extraordinária, repensando para as mulheres as formas e os detalhes do smoking masculino.

O excesso de inteligência pode às vezes ser inconveniente às roupas e às semanas de moda, mas foi o que se viu em Lenny e Herchcovitch: inteligência na concepção, na construção e na visão de mundo _sem que isso prejudicasse, porém, o charme das coleções.

Lenny iniciou o seu desfile com maiôs estampados com formas de ladrilhos tortos e quebrados, como se a figura feminina estivesse ela mesma fragmentada e emendada. Em seguida, mostrou uma série de peças em que exibia o esforço de reconstruir esta figura a partir de vestígios de cores e volumes. O ponto culminante da coleção ocorreu com os maiôs feitos com miniladrilhos concretos, pregados sobre as peças, como se a mulher não fosse uma imagem dada, mas uma imagem em construção.

O desfile de Herchcovitch teve basicamente dois atos. No primeiro, ele fez sucessivas desmontagens do smoking, recortando e recriando as suas partes, desafiando os signos de poder masculino que a vestimenta transmite e transferindo este poder para as formas femininas. No segundo, a partir da imagem do cravo que enfeita os trajes de gala dos homens, criou "looks" que implodiam o design austero do smoking e deixavam emergir um sensualismo novo, forte e afirmativo.

Nas duas coleções, está em questão a imagem feminina nestes tempos complicados. Todos sabemos como as roupas servem tanto para embelezar as mulheres quanto para submetê-las aos clichês históricos associados à feminilidade. Para Lenny e Herchcovitch, a moda é sobretudo uma maneira de unir beleza e libertação.

Alcino Leite Neto