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XIISMO
Perseguição a xiitas, tráfico de drogas e um fluxo de mais de 1 milhão de refugiados levaram à deterioração das relações de Teerã com o vizinho Afeganistão
Oposição a Taleban aproxima Irã dos EUA
DA REDAÇÃO
Entre uma reportagem e
outra sobre os atentados
na Costa Leste norte-americana, a rede de TV
CNN mostrava anteontem uma
propaganda de 2001 como o "Ano
do Diálogo Entre Civilizações" da
ONU. O que poucas pessoas sabem é que a idéia partiu do presidente do Irã, Mohamad Khatami.
Principal representante da ala
reformista no Irã, Khatami condenou pessoalmente os atentados
na Costa Leste dos EUA. Na semana passada, o governo autorizou um ato de apoio às vítimas.
Relações conflituosas com o Taleban, tráfico de drogas -sobretudo ópio- e um fluxo quase incontrolável de refugiados afegãos
(mais de 1 milhão): eis as principais razões para as críticas ao grupo extremista que controla quase
todo o Afeganistão.
O Irã, majoritariamente xiita,
também critica a perseguição do
regime afegão contra muçulmanos dessa corrente -minoritária
nos países islâmicos. Farhad
Khosrokhavar, que dirige a Escola
de Estudos Superiores em Ciências Sociais, diz que "o Irã teme
uma influência indireta do Taleban sobre sua minoria sunita, que
seria encorajada a contestações".
Os reformistas iranianos defendem uma aproximação com os
Estados Unidos, mas isso não
quer dizer que o Irã possa se associar, de olhos fechados, a uma
coalizão internacional contra o
Taleban e Osama bin Laden.
Os conservadores mantêm um
controle rígido do poder, apoiados no líder do país, o aiatolá Ali
Khamenei. Eles controlam o Judiciário, o Conselho dos Guardiães
(órgão mais influente do Irã) e o
aparato de segurança.
Apesar do embate ideológico,
nos próximos dias o chanceler
Jack Straw será o primeiro ministro britânico a visitar o Irã desde a
Revolução Islâmica de 1979.
A revolução iraniana se beneficiou da glorificação dos "mártires
da opressão" e do ciclo do luto,
característico do xiismo. Foi no
mês de muharram, quando os xiitas se recordam de seus imãs martirizados, que mais de 5 milhões
de pessoas saíram às ruas de Teerã, em 1978, e se reuniram em torno do monumento do Sayyad,
símbolo da dinastia Pahlevi, exigindo o "fim da tirania" e a fundação de uma república islâmica.
Muitas mulheres adotaram o
véu como símbolo do protesto
contra o xá Reza Pahlevi, apoiado
pelos EUA. O grupo de "guardiãs
da revolução" celebrou o Dia das
Mulheres em 18 de maio de 1979.
À época, proclamou-se uma nova
Constituição, que incorporava o
conceito de governo islâmico do
aiatolá Khomeini.
A revolução foi o exemplo mais
marcante da reafirmação islâmica
nos tempos modernos, assustando EUA, União Soviética, Europa
e países vizinhos, temerosos da
exportação do modelo iraniano.
Os xiitas iraquianos, espelhados
no exemplo de Khomeini -o aiatolá servia de referência para comunidades xiitas em partes do
golfo Pérsico (sobretudo Bahrein), do Afeganistão e do Líbano-, criaram dificuldades ao sistema socialista e baathista.
No Irã, combateram-se as influências estrangeiras, perseguiu-se a comunidade cristã anglicana,
e 52 americanos foram feitos reféns durante 444 dias.
Nos últimos anos, Teerã conseguiu melhorar as relações com os
EUA e com as monarquias do golfo Pérsico -de maioria sunita.
Khatami, autor de "Islã, Diálogo
e Sociedade Civil", afirma que a
religião "é compatível com a noção de liberdade, racionalismo,
desenvolvimento e direitos humanos" e admite que "uma das
pragas que podem ser encontradas em sociedades religiosas, e infelizmente o mundo islâmico enfrentou isso, é o mal entendido de
que, com a existência da religião,
o homem não precisa da razão".
Para o líder iraniano, "é irônico
que o conceito de tolerância adotado dos muçulmanos como resultado dos contatos com europeus seja, agora, oferecido pelos
europeus aos muçulmanos como
um conselho político e ético".
(PAULO DANIEL FARAH)
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