Livraria da Folha

 
02/08/2010 - 12h23

Brincadeira do compasso salva mulher de despencar com elevador; veja lenda urbana

da Livraria da Folha

Reprodução
Autor selecionou as dez lendas que mais perturbam o imaginário popular
Autor selecionou as dez lendas que mais perturbam o imaginário popular

O real e a o sobrenatural se misturam no recém-lançado "Lendas Urbanas", do roteirista Jorge Tadeu, que chega às livrarias pela editora Planeta. Aliás, real não é bem a palavra adequada. Responsável pelo quadro Lendas Urbanas do programa "Domingo Legal", Tadeu explicar o teor desses mitos e ainda constrói pequenas narrativas.

Personagens folclóricos como a loira do banheiro e o homem do saco marcam presença no livro ao lado da conhecida gangue do palhaço que sequestrava crianças com uma Kombi e da mulher do taxi, uma fantasma que passeia pela cidade sempre no dia de aniversário de sua morte.

São dez histórias nas pouco mais de cem páginas de Lendas Urbanas. No conto sobre a brincadeira do compasso, por exemplo, estudantes fazem o ritual com o material escolar e acabam alterando o curso natural do futuro. Ao salvar a mãe de um acidente envolvendo um elevador, um aluno acaba desencadeando uma série de mortes, mostrando que não devemos brincar com coisas que estão além de nossa compreensão.

Divulgação
Todos os contos criados por Jorge Tadeu são acompanhados dos desenhos do ilustrador Vitor Morinishi
Todos os contos criados por Jorge Tadeu são acompanhados dos desenhos do ilustrador Vitor Morinishi

Leia trecho do capítulo destinado à lenda da brincadeira do compasso.

*

5. A brincadeira do compasso

Entre as lendas sobre a brincadeira do compasso, várias delas falam sobre a possibilidade de prever o futuro usando esse objeto colocado no meio de letras e números em volta, em cima de uma mesa.

Uma coisa é comum em todas as versões dessa lenda: quem tenta manipular o futuro usando forças sobrenaturais, sempre se dá mal.

-

- Tô indo, tô indo, tô indo!

Karina está à espera de sua amiga Valéria, da escola. Elas marcaram de estudar juntas para a semana de provas. Nem tirou o uniforme ainda, só prendeu seus longos cabelos castanhos em um rabo-de-cavalo e tirou os tênis e as meias. A garota joga sobre o sofá a apostila que está lendo e corre, animada, para abrir a porta para a amiga. Não exatamente animada com o estudo, mas com companhia é sempre mais legal.

Karina abre a porta:

- Hello! - brinca.

- E aí?

Valéria é tão pequenininha que nem parece ter a idade que tem. Parece estar no 7o ano, e isso a deixa meio irritada, às vezes, quando os amigos a pegam para Cristo. Por isso, procura sempre se maquiar um pouco e não usar nenhuma peça de roupa que uma garotinha de doze anos possa pensar em usar também. Nada de carinhas fofinhas e coraçõezinhos cor-de-rosa ou algo do tipo. Entra e imediatamente se joga no sofá, largando suas coisas no chão.

- Ei, ei! Que folga é essa? Temos um trabalho a fazer, Valéria!

- Ah, Karina, dá um tempinho...

Mas Karina não quer perder tempo algum; quanto antes acabarem, melhor, mais tempo sobra para coisas mais interessantes. Puxa Valéria pelo braço:

- Vamos logo, que meu pai liberou a biblioteca dele para nós.

Sem mais remédio, Valéria se levanta:

- Tá bom, tá bom.

Tentando incentivar a amiga, Karina diz:

- São 3h agora. Se aproveitarmos bem o tempo, antes do jantar podemos ficar um pouco no MSN.

-

Karina olha para o relógio:

- Nossa, 5h, já! Por isso estou com fome. Vou pegar alguma coisinha para nós na cozinha, ok?

- Boa! Já estou até meio tonta! Enquanto isso, vou ver se encontro outro livro aí nas estantes do seu pai. Será que nesse monte de livros tem algum sobre civilizações orientais?

- Ah, deve ter. Meu pai tem de tudo. Dê uma procurada naquela estante.

Karina vai até a cozinha, enquanto Valéria tenta encontrar mais material de pesquisa. Curiosa, acaba se afastando do local que Karina havia lhe indicado e começa a ler as lombadas dos livros antigos de uma prateleira mais alta, mais à esquerda.

Karina leva uns cinco minutos para voltar:

- Estourei uma pipoquinha para nós - e se senta em cima da perna direita dobrada.

Leva alguns segundos para perceber que Valéria está onde não devia. Rapidamente, adverte a amiga:

- Não mexa nessa estante, Val! Só meu pai pode mexer nesses livros!

- Por que essa frescura, Ká?

- Ele diz que são raros e que, além disso, têm assuntos que eu não devo ler porque jamais entenderia.

- U-hu! - faz Valéria, animada. - Agora sim é que quero saber o que há neles!

- Val, pare com isso...

Valéria encontra um livro grosso, marrom-avermelhado, com a lombada meio esfacelada, mas nada escrito nela. Só o desenho de um compasso antigo. Puxa-o.

Ao tirar o livro da estante, um compasso, que estava guardado em cima do livro, cai no chão. As duas garotas levam um pequeno susto:

- Ai, que susto! - Diz Karina, e logo dá uma risadinha.

Valéria se abaixa, pega o compasso e volta para a mesa onde está Karina, observando a capa do livro.

- Veja isso, Ká: "Você pode mudar seu futuro". Por que um livro de autoajuda faz parte dos proibidos? Minha mãe tem um monte desses lá em casa.

Karina não consegue encarar o assunto com tanta despreocupação. Seu pai sempre a alertara para se manter bem longe daquela estante.

- Que autoajuda, lesada! É de ocultismo. Largue isso, Val! É sério!

Mas Valéria está cada vez mais curiosa. Ela parece não se lembrar daquele sábio ditado popular que diz: "a curiosidade matou o gato"...

- E este compasso? Por que está aqui? Tem um igual na capa do livro.

- Meu pai vai nos matar se souber que mexemos nesse livro. Largue, por favor!

De repente, a porta da biblioteca se abre e surge Paulo, o pai de Karina. As meninas dão um pulo de susto. A respiração de Karina se acelera e Valéria rapidamente esconde o livro nas costas. É, consciência pesada dá nisso...

Felizmente, Paulo não entra, apenas põe a cabeça para dentro da porta:

- Oi meninas, tudo bem?

Karina, tensa, mas tentando disfarçar ao máximo, olha para Valéria, muda, que responde.

- O-Oi, seu Paulo.

Karina faz um esforço:

- Tudo bem, pai. Estamos aqui só estudando.

Valéria olha para ela e faz uma careta imperceptível, como quem diz: "Cale a boca, assim você acaba nos entregando!".

Paulo, com pressa, não repara e apenas avisa:

- Vou sair. Não mexam naqueles livros - E aponta para a estante alta à esquerda. - Juízo, vocês duas.

- Pode deixar, seu Paulo - novamente Valéria é quem responde.

Mal Paulo fecha a porta, as meninas suspiram, aliviadas.

- Eu avisei - diz Karina, tensa. - Você quase me põe numa fria.

Valéria já está tranquila de novo, já que ninguém mais pode presenciar seu "delito".

- Vamos dar uma espiadinha?

Claro que Karina respeita seu pai, mas a curiosidade está começando a tomar conta dela. Está dividida:

- Não sei, não... Mexer com essas coisas pode não ser um bom negócio. Uma vez, peguei esse livro e meu pai disse umas coisas que me deram medo.

-

Karina pegou o livro e o compasso na estante. Não que quisesse desobedecer a seu pai, mas é que achou que não teria nada de mais. De repente, o pai entrou. Assim que percebeu que livro ela estava segurando, tomou-o das mãos dela, nervoso:

- Nunca mais mexa neste livro. Não pense que vai poder mudar seu futuro usando forças sobrenaturais. Existe algo chamado lei do retorno. Se você mexe com coisas que não deve, um dia é cobrada por isso. E a cobrança costuma sempre ser terrível.

*

"Lendas Urbanas"
Autor: Jorge Tadeu
Editora: Planeta
Páginas: 132
Quanto: R$ 24,90 (veja preço especial)
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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