Livraria da Folha

 
04/11/2009 - 12h41

Último volume de "Mitológicas" de Lévi-Strauss será lançado em 2010; leia trecho

da Livraria da Folha

A série "Mitológicas", do francês Claude Lévi-Strauss, é um marco da antropologia. Dividida em "O Cru e o Cozido", "Do Mel às Cinzas", "A Origem dos Modos à Mesa" e "O Homem Nu", analisa 813 mitos de diferentes povos indígenas do continente americano e reúne estudos sobre culinária. A obra é leitura obrigatória para qualquer interessado em conhecer a mitologia, as lendas e a rica cultura dos ameríndios.

Lévi-Strauss analisa a cultura por meio de hábitos alimentares; leia trecho

Com lançamento pela editora Cosac Naify previsto para 2010, o quarto volume da série analisa os mitos dos Salish, localizados na América do Norte, entre os rios Klamath e Frases, nos Estados Unidos. Leia a seguir um trecho da quinta parte de "O Homem Nu":

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"[...] Dentre todas as técnicas culinárias, o forno de terra se apresenta como a que manifesta de modo mais pleno uma homologia formal e íntima entre a infra-estrutura e a ideologia. Dados a complexidade em geral grande se sua fabricação, seu freqüente caráter de empreitada coletiva, o conhecimento tradicional e os cuidados exigidos para seu bom funcionamento, a lentidão do processo de cozimento que pode durar vários dias, e marcado até o último momento pela incerteza quanto ao resultado, agravada pelo fato de quantidades enormes de alimento - correspondendo às provisões de uma ou várias famílias e sua única esperança de poder sobreviver até o final do inverno - lhe serem entregues, sobre e até dentro da terra, o forno atesta a presença e a potência do fogo. A cada vez que é acendido, ele comemora majestosamente o conflito inicial, imagem antecipada de todos os que viriam a seguir, e cujo resultado foi a conquista do fogo. É uma técnica que permanece, pois, intimamente ligada a uma mitologia heróica, ainda perceptível para aqueles que, numa praia da Nova Inglaterra, tiveram a experiência da atmosfera alegre e marcada por um fervor ritual de um clambake. Por seu caráter heróico, essa mitologia muitas vezes se opõe, até atingir a incompatibilidade - no caso dos Jê, dos Sahaptin e dos Salish pelo menos, ao emprego de recipientes de cerâmica para cozer por fervura, símbolos do que poderíamos chamar de culinária fecunda, mas caseira. Essa oposição evoca outras, como aquela percebida por Dumézil entre a morte heróica, seguida de cremação do cadáver, e a morte fecunda por afogamento ou seguida de enterro.

E assim, ao mesmo tempo em que entrevemos um sistema de categorias que se presta a múltiplas transformações e que, em sua essência, poderia ser universal (pois que certamente fazem dele parte também provas de iniciação ou de passagem com descarnamento simbólico por meio de escarificação, flagelação, picadas de insetos venenosos ou cozimento, compreendemos que o humilde relato de uma briga de família que nos serviu de ponto de partida o contém por inteiro em germe, e que o gesto para nós tornado insignificante de inflamar um combustível aproximando dele um fósforo perpetua, no seio de nossa civilização mecânica, uma experiência que, para toda a humanidade outrora e para seus últimos testemunhos ainda hoje, foi ou permanece investida de uma gravidade máxima. Pois nesse gesto são simbolicamente arbitradas as oposições mais carregadas de sentido que é dado ao homem inicialmente conceber, entre céu e terra na ordem física, entre homem e mulher na ordem natural, entre afins na ordem social. [...]"

Comentários dos leitores
Chris Maria (217) 04/11/2009 11h51
Chris Maria (217) 04/11/2009 11h51
Sem dúvida alguma sua morte representa uma grande perda. Entretanto, a relevante contribuição de sua obra para o desenvolvimento do pensamento humano o faz eterno. sem opinião
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JOSE MOTTA (27) 04/11/2009 11h17
JOSE MOTTA (27) 04/11/2009 11h17
O Brasi tem bom filososfos e pensadores, porém também tem muitos polpulistas enganadores. 4 opiniões
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J. R. (1126) 03/11/2009 22h39
J. R. (1126) 03/11/2009 22h39
pois ninguém pode adivinhar o futuro. Lévi-Strauss sempre enfatizou que "a mente selvagem é igual à civilizada", trazendo os povos ameríndios ao seu status merecido, ao século XX e XXI como povos e não animais selvagens. Diz FFHH que "Lévi-Strauss foi um dos maiores antropólogos de todos os tempos. Suas contribuições, especialmente depois que publicou 'As Formas Elementares do Parentesco', revolucionaram a antropologia contemporânea, provavelmente ele se interessou mais pelo livro devido às maneiras de como destruir a "celula mater" da sociedade, a fim de otimizar os lucros do sistema que apoia. A partir de então, a corrente chamada 'estruturalista' passou a exercer enorme influência em todas as universidades". FFHH que só conhece o âmbito das universidades, um erudito, nem mesmo teórico, pois jamais quis se envolver com o chamado "terceiro setor", diz "fui visitá-lo, mais de uma vez, no Collège de France na década de 1970 para render-lhe o tributo devido, a quem teve uma vida intelectual tão fecunda."; pena que não tenha aprendido nada, pois quem foi aluna de Strauss de fato foi Ruth Cardoso, se assim fosse não teria sido ele um presidente tão medíocre para o Brasil, um entreguista: "A globalização é o novo Renascimento da humanidade". Fazendo apologia a Lévi-Strauss o Brasil não começou com FFHH e vai terminar sem ele.
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Morre Lévi-Strauss e leva FFHH junto?
sem opinião
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