Livraria da Folha

 
23/11/2009 - 22h48

Homem acha cabeça no lixo; leia trecho de "Dexter - A Mão Esquerda de Deus"

da Livraria da Folha

O livro "Dexter - A Mão Esquerda de Deus", escrito pelo autor Jeff Lindsay, originou a primeira temporada da série de TV, estrelada por Michael C. Hall, famoso desde o seriado "A Sete Palmos", em que viveu o diretor funerário gay David James Fisher.

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"Dexter" vira pai e encontra mentor em nova temporada
Cartaz de "Dexter"; ele vira pai e acha mentor em nova temporada

Um dos destaques do livro e da primeira temporada de Dexter é a tensão entre Dexter Morgan, o psicopata que trabalha na polícia de Miami como analista de sangue, e sua chefe, a tenente durona Maria LaGuerta (no livro, em vez de Maria, ela se chama Migdia), interpretada pela atriz Lauren Velez.

O espectador fica na ansiedade sobre o momento em que LaGuerta começará a desconfiar que Dexter é, na verdade, um serial killer ou em que instante ele vai se livrar de sua chefe, que persegue a irmã de Dexter, a jovem policial iniciante Debra (Jennifer Carpenter).

Leia um trecho do livro em que Dexter tenta descobrir da sua chefe pistas sobre o matador misterioso que ataca em Miami, a fim de obter informações para localizá-lo e exterminá-lo.

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Dexter arrasta corpo, enquanto tenente durona acompanha trabalho
Dexter arrasta corpo, enquanto tenente durona acompanha trabalho

Alguns anos antes, circulou um boato de que a detetive Migdia LaGuerta entrou para o Departamento de Homicídios porque deu para alguém. Só de olhar para ela é possível acreditar. Ela tem tudo no lugar certo para ser fisicamente atraente deum jeito irado, aristocrático. Uma verdadeira artista na maquilagem e veste-se muito bem, no estilo Bloomingdale's. Mas o boato não pode ser verdade. Para começar, embora pareça muito feminina, jamais vi uma mulher mais macha por dentro. Era dura, ambiciosa de forma mais interesseira e sua única fraqueza parece ser uma queda por homens tipo modelo, mais jovens que ela. Portanto, eu tinha certeza de que ela não entrou no departamento através do sexo. Entrou porque é cubana, sabe ser política e puxar saco. Tudo isso junto, em Miami, é melhor do que sexo.

LaGuerta é uma puxa-saco de padrão internacional. Puxou de todo mundo até o alto escalão de investigadores de Homicídios. Infelizmente, trata-se de um ofício em que sua capacidade de seduzir nunca foi exigida e ela era uma péssima detetive.

Isso acontece, a incompetência costuma ser mais recompensada do que se imagina. De todo jeito, sou obrigado a trabalhar com ela. Então, tenho usado meu considerável charme para fazer com que ela fique parecida comigo. É mais fácil do que soa. Qualquer pessoa pode ser atraente, se não se incomoda em fingir e dizer todas as coisas idiotas, óbvias e nauseantes que a consciência impede que a maioria diga. Felizmente, eu não tenho consciência. Por isso, digo tudo.

Aproximei-me do grupinho perto do café: LaGuerta estava interrogando alguém em espanhol, em ritmo alucinante. Falo espanhol, até entendo um pouco de cubano. Mas só consegui sacar uma de cada dez palavras dela. O dialeto cubano é o inferno do mundo de língua espanhola. Parece que os cubanos querem competir com um cronômetro invisível e emitir o máximo de palavras em três segundos sem usar consoantes.

O truque para acompanhar é saber o que a pessoa vai dizer antes que diga. Isso costuma ajudar o espírito de grupo do qual não-cubanos às vezes reclama.

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Editora Planeta lança no Brasil os dois livros que deram origem à cultuada série "Dexter"
Editora Planeta lança no Brasil os dois livros que deram origem à cultuada série "Dexter"

O homem que a detetive estava fritando era pardo, baixo e largo, com feições de índio e estava evidentemente intimidado com o dialeto, o tom de voz e a insígnia da detetive. Tentava não olhar para ela, o que parecia que a fazia falar ainda mais rápido.

- No, nadie estava afuera - disse ele, baixo e lentamente, desviando o olhar. - Todos estaban en el café.

- Donde estabas? - ela perguntou.

O homem olhou para os sacos com pedaços de corpo e desviou o olhar - En la cocina. Después yo saqué la basura. (Na cozinha, depois trouxe o lixo para fora.)

LaGuerta continuou, forçando-o verbalmente, fazendo perguntas erradas num tom de voz que intimidava e humilhava o homem até ele ir esquecendo o horro de achar pedaços de corpo na caçamba e ficar de mau humor, sem querer colaborar.

Aquele interrogatório era um autêntico toque de mestre: pegue a principal testemunha e faça com que fique contra você. Se você conseguir resolver o caso nas primeiras horas após o crime, que são vitais, economiza tempo e papel.

Ela terminou com algumas ameaças e dispensou o homem. - Índio - xingou, depois que ele saiu andando pesadamente.

- Tem de tudo nesta cidade, detetive. Até campesinos. - Ela virou-se e percorreu meu corpo com os olhos lentamente enquanto fiquei parado, pensando por que me olhava daquele jeito. Será que tinha esquecido como eu era? Terminou a inspeção com um largo sorriso. A idiota realmente me apreciava.

- Hola, Dexter. Por que veio para cá?

- Soube que você estava aqui e não consegui ficar longe. Por favor, detetive, quando vai se casar comigo?

Ela riu. Os outros funcionários se entreolharam e desviaram o olhar. - Não compro nem sapato sem antes experimentar - disse LaGuerta. - Mesmo que seja da melhor qualidade. - Eu tinha certeza de que era verdade, mas não entendi por que ficou me olhando com a língua entre os dentes depois de falar. - Agora vá indo, você me tira a atenção. Tenho trabalho sério a fazer.

- Eu sei. Já pegou o assassino?

Ela bufou. - Você parece jornalista. Daqui a uma hora aqueles chatos estarão me cercado.

- O que vai dizer para eles?

Ela olhou para os sacos com pedaços de corpo e franziu o cenho. Não porque aquilo a incomodasse. Estava vendo a carreira dela, tentanto verbalizar o que declarar à imprensa.

- É só questão de tempo até o assassino cometer um erro e nós o pegamos...

- O que significa que até agora ele não cometeu nenhum erro, você não tem qualquer pista e precisa esperar ele matar de novo e até fazer alguma coisa? - perguntei.

Ela me olhou duro. - Esqueci uma coisa: por que é mesmo que eu gosto de você?

Apenas dei de ombros. Eu não tinha pista, mas parecia que nem ela.

- O que temos é nada y nada. Aquele guatemalteco - fez uma careta na direção do índio que tinha saído - encontrou o corpo quando trouxe o lixo do restaurante. Não sabia o que eram esses sacos e abriu para ver se tinha alguma coisa que prestasse. Era a cabeça da vítima.

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"Dexter - A Mão Esquerda de Deus"
Autor: Jeff Lindsay
Editora: Planeta
Páginas: 272
Quanto: R$ 44,90
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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