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Novo em Folha 46ª turma
12/12/2008

Fita com registro da reunião que editou o ato está envolvida em sumiços, rompimentos e morte

CHICO FELITTI
DA EDITORIA DE TREINAMENTO

Uma maldição acompanha a fita em que está gravado o áudio da reunião do CSN (Conselho de Segurança Nacional) da sexta-feira 13 de dezembro de 1968. Ao menos é o que acreditam algumas pessoas que tiveram nas mãos o documento -e que passaram por acontecimentos inexplicáveis.

Há muito de estranho na biografia da fita. A começar por sua existência: até a metade da década de 80, não se sabia se a gravação da reunião estava escondida ou fora destruída. A única certeza é que ela existia, já que todos os CSN eram documentados.

A resposta só veio quando o ex-secretário da Casa Civil Heitor Aquino Ferreira encontrou a fita em caixas de arquivo morto que ficavam na garagem da casa do ex-chefe da Casa Civil Golbery do Couto e Silva, em Luziânia (DF).

Mas ela não estava em seu estado original: era um cassete. Não se sabe quando o áudio, originalmente gravado numa fita de rolo, foi transferido para uma fita cassete, nem quem fez o trabalho e muito menos o que foi feito do original.

Como as caixas estavam ameaçadas por mofo, Ferreira decidiu entregar o material para alguém que zelasse por seu conteúdo e fosse preservar os documentos e fitas. Entre 1982 e 1987, entregou cerca de 50 caixas para o jornalista e colunista da Folha Elio Gaspari, que usou o material para escrever sua série de livros sobre a ditadura, composta por quatro livros que perscrutam o período.

Tumulto

Em 1988, Zuenir Ventura tinha finalizado o livro "1968 - O Ano Que Não Terminou" quando recebeu de Gaspari trechos inéditos da reunião. Completou a obra sem sofrer nada ou ficar mal na fita. Para Ventura, a urucubaca do cassete está só no seu conteúdo.

Próximo a ter contato com a fita, o jornalista Augusto Nunes ganhou uma cópia em 1997 para fazer um documentário. Após terminar o uso, Nunes a emprestou para Paulo Markun, jornalista e diretor-presidente da Fundação Padre Anchieta. Quando Nunes a recebeu de volta, dois anos depois, se deu conta de que a segunda metade da reunião tinha sido substituída por outro CSN, anterior ao de 13 de dezembro de 1968. Ninguém sabia explicar como as vozes fora de época foram parar lá. "É um tumulto mexer com esse negócio", declara.

O quarto acontecimento misterioso ocorreu em 1998, quando a revista "Época" escalou o repórter Fábio Altman para fazer uma matéria sobre os 30 anos do ato. Com sua cópia da fita na mão, Altman foi atrás de Alberto Curi, o locutor responsável por anunciar o ato à nação no programa "A Voz do Brasil". Curi voltou ao Palácio Laranjeiras, fez fotos para a matéria e retomou o assunto _de que não falava desde dezembro de 1968. Morreu de infarto dez dias depois.

Altman também foi a vítima do quinto episódio inexplicável ligado à fita: sumiu o áudio que a revista disponibilizou em seu site. O link com os trechos do encontro, que podiam ser ouvidos na rede, desapareceu e nunca mais foi encontrado.

Rompimento

Durante dez anos, a maldição ficou adormecida. Em 2007, porém, Elio Gaspari decidiu ouvir o áudio, que pensava estar em CDs, para os quais tinha transferido seu acervo de fitas da ditadura. Descobriu que justamente os dois CDs que deveriam conter o áudio do AI-5 estavam vazios.

Com medo de apagar um pedaço da história mexendo na fita original, ligou para Altman e Nunes e foi informado de que o primeiro perdera o áudio e o segundo tinha tido o seu alterado. Recorreu ao cineasta João Moreira Salles, filho de Walther Moreira Salles, fundador do IMS (Instituto Moreira Salles), que faz recuperação de áudios raros. João enviou três técnicos de restauração do IMS para se certificarem de que a gravação ainda existia. Assim que chegaram, os profissionais puseram a fita para tocar e... lá estava o áudio.

Durante a digitalização do áudio, para qual se usou um gravador de baixa rotação, o magnético da fita se rompeu duas vezes, e teve de ser reparado. Depois de passada para o computador, outro susto: os especialistas não conseguiam encontrar o arquivo dentro do laptop. Minutos depois, descobriram que procuravam pelo nome errado. "Foi tenso!", conta o historiador Marcelo Nastari, um dos técnicos e atual 'guardião' da fita.

Gaspari achou por bem deixar a fita original na posse do IMS. Atualmente, o cassete branco fica na sede da entidade, na avenida Paulista, no armário de uma sala climatizada, com temperatura constante de 21º C. Ocupa o móvel quase que sozinha, compartilhando espaço apenas com um disco raro do jazzista Duke Ellington. Um dos funcionários que trabalha no lugar, e não quis ser identificado, disse se sentir desconfortável com a energia que diz que a fita emana.

A íntegra do áudio da reunião de 13 de dezembro de 1968 está na internet, sem maldição, no site especial da Folha sobre os 40 anos do AI-5.

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