São Paulo, sábado, 1 de janeiro de 1994
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Contribuinte não é palhaço

GILBERTO DIMENSTEIN

Contribuinte não é palhaço
O brasileiro paga muito ou pouco imposto? O presidente da República e seu ministro da Fazenda fizeram com que pulássemos de ano com essa incômoda questão nas manchetes dos jornais. Comparando estatísticas internacionais, o governo afirma: paga pouco. Apenas olhando os números está certo. Não se deixe, porém, enganar.
Vou traduzir em termos bem simples. Você vai num restaurante, é muito bem tratado, a comida está ótima. No final, a conta é salgada, mas justa. Mas um indivíduo se sente lesado ao ter de pagar num botequim por um cafezinho requentado.
O governo diz mais ou menos o seguinte: você tem de pagar no botequim fuleiro o mesmo preço do acolhedor restaurante. Diz mais: você está pagando pouco. Quem, de fato, paga imposto os assalariados de classe média - os empresários descontam no preço dos produtos. E qual o retorno?
Os hospitais e escolas públicas ss, em geral, um vexame. O assalariado de classe média se vê forçado a pagar por escolas particulares e convênios médicos, tudo caríssimo. As estradas estão esburacadas, a polícia não consegue controlar a criminalidade, e por aí vai. Mas se pode argumentar que o imposto da classe média destina-se aos pobres. Concordo com a tese. Não me incomodaria em pagar mais imposto se tivesse a certeza de que acabaria com a miséria e tornaria as cidades mais habitáveis.
Só que, na maioria das vezes, os pobres são tratados como cachorros nos hospitais, muitos morrem na fila, as escolas para os carentes não prestam e, ainda por cima, o dinheiro da assistência social é fonte de roubalheira, desperdício e negociatas eleitorais.
Nos governos federal, estadual e municipal há gigantescas crostas de mamatas beneficiando empresários e funcionalismo. Muitas vezes gasta-se mal e sem critério: as máquinas administrativas estão inchadas de funcionários imcompetentes, garantidos pela estabilidade.
E o governo quer que você se sinta culpado por pagar "pouco" imposto. Devem achar que contribuinte é palhaço ou mulher de malandro antes da revolução feminista.

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