São Paulo, terça-feira, 4 de janeiro de 1994
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Minas perde US$ 500 milhões por safra

JOÃO BATISTA REZENDE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nas décadas de 70 e 80, o aumento da produção agrícola brasileira se deu principalmente via expansão da área cultivada. Na década de 90, o incremento na produção ocorre devido a aumentos de produtividade, caracterizando, assim, melhoria de eficiência do sistema produtivo.
A partir da década de 80, o Brasil tornou-se um dos principais exportadores mundiais de alimentos, principalmente dos produtos do complexo soja.
Contudo, este esforço de elevação da produção de alimentos ao longo dos anos tem-se mostrado inócuo, não conseguindo elevar a produção por habitante/ano (em torno de 500 quilos no Brasil) nem tampouco a disponibilidade de alimentos básicos.
Alimentação e nutrição assumem, no país, feições alarmantes. As principais constatações de pesquisas recentes dão conta de que o brasileiro, cada vez mais, consome pouco e, principalmente, mal.
O país possui hoje em torno de 5 milhões de crianças com algum grau de desnutrição (uma em cada três crianças até cinco anos é subnutrida).
No Nordeste existem 2,6 milhões de crianças desnutridas, com déficits de proteínas, vitaminas e sais minerais. No Brasil existem cerca de 32 milhões de indigentes, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Apesar de toda esta situação, onde se observa uma população faminta constata-se que o desperdício de alimentos no país é elevado. Em estudo realizado recentemente pela Fundação João Pinheiro para o Estado de Minas Gerais verificou-se que os índices de perdas atingem cerca de 21% para os grãos e 31% para os hortigranjeiros, representando perda anual de aproximadamente US$ 500 milhões.
As principais causas diagnosticadas no Estado são escassez e uso inadequado de equipamentos de colheita; estrutura de armazenagem arcaica, precariedade do sistema viário; escassez de informações sobre o processo de comercialização; elevada instabilidade na produção de hortigranjeiros e manuseio e utilização de embalagens inadequadas.
Dadas as características da agricultura desenvolvida em Minas é possível afirmar que os índices de perdas e as principais causas não diferem significativamente daqueles ocorridos nos demais Estados.
Com base nos índices identificados para Minas é possível ter noção do volume total de perdas de alguns produtos de origem vegetal projetadas para o Brasil (veja quadro).
Alguns dados merecem destaque. Se somadas as perdas apenas dos seis principais produtos de alimentação básica observa-se uma queda de 15,4 milhões de toneladas. Além desse volume físico o país perdeu, a preços médios das safras de 1990 e 1991, valor superior a US$ 2,7 bilhões.
Se considerada a produtividade média de arroz e feijão somente, principais produtos da dieta do brasileiro, seria necessário cultivar em torno de 2,3 milhões de hectares de área adicional apenas ptra compensar as perdas (2,9 milhões de toneladas/ano).
Acrescentando-se o milho, o tomate, a batata e a banana, a demanda para os seis produtos é de mais de 5 milhões de hectares. Estes números não incluem as perdas ocorridas antes da colheita nem o que o consumidor desperdiça via lixo.
Se forem consideradas as 80 espécies de hortaliças e o conjunto dos grãos cultivados no país, as perdas certamente ultrapassam US$ 5 bilhões a cada ano.
O que torna ainda mais grave a situação é a utilização de indicadores médios para a estimativa das perdas.
Como se sabe, esses índices são mais elevados nas regiões mais pobres. Isso significa que se desperdiça mais exatamente onde a fome é maior.
Nesse contexto, é necessária uma política de produção de alimentos que possibilite ganhos de produtividade compatíveis com o crescimento e as necessidades reais da população, ao lado de uma definição de ações e recursos que possibilitem a redução do desperdício.
Para tanto é imprescindível priorizar algumas ações como a recuperação de unidades armazenadoras de cereais e das rodovias, além do incentivo à utilização das ferrovias.
Também é necessário alertar toda a sociedade para a importância de se reduzir as perdas de alimentos. Aos horticultores é preciso oferecer informações de mercado seguras e atuais para a programação da produção e desenvolver novas alternativas para o acondicionamento e embalagem dos produtos.
Os consumidores devem ser orientados quanto à aquisição dos produtos de safra. A formulação de política de incentivo ao investimento em estrutura de processamento de produtos agropecuários, nos diversos estágios da cadeia produção-consumo, também ajudaria a evitar perdas.
O fortalecimento da pesquisa e da extensão rural possibilitaria a identificação das perdas por produto, por região e por etapa do processo produtivo, contribuindo para a ação contra o desperdício.

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