São Paulo, sábado, 8 de janeiro de 1994
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FHC tenta evitar desastre do plano na introdução da URV

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

A tentativa do Ministério da Fazenda de segurar a recente escalada de preços tem o objetivo de salvar o Plano de Estabilização. Isso porque a aceleração dos preços inviabilizaria a introdução gradual da Unidade Real de Valor, URV. A equipe econômica teme que, por pressão política, o ministro Fernando Henrique Cardoso seja obrigado a precipitar a URV, sem ter criado as condições prévias para seu sucesso.
Nos últimos dias, indústria, comércio e serviços passaram a aumentar preços na convicção de que o Congresso vai votar o ajuste fiscal pedido por Fernando Henrique, de modo que ele seria obrigado a passar para a segunda parte do plano, que é a introdução da URV como indexador diário atrelado ao dólar.
O aumento de preços tem o objetivo de prevenir qualquer tipo de regra de conversão de cruzeiros reais para URV. Em toda mudança de moeda, ganha quem partir com preço mais alto. É verdade que não existe controle de preços no país, de modo que qualquer empresário poderá colocar em URV o preço que bem entender quando o indexador for criado. Mas acontece que as pessoas têm experiência e preferem se prevenir contra qualquer regra obrigatória.
Hiperinflação
E assim os preços subiram além do esperado. Essa aceleração da inflação, de sua vez, torna-se um segundo fator de pressão para que o governo apresse a segunda fase do programa. Surge uma expectativa de que a URV é para breve e aí todos os agentes econômicos tentam se antecipar, passando seus preços para indexação diária. E a inflação em cruzeiros explode.
Segundo apurou a Folha, para membros da equipe econômica e para economistas de fora do governo, seria um desastre introduzir a URV nesse momento. "Se eles (os empresários) pensam que vem a URV com esse nível de preços, estão muito enganados" disse um assessor próximo ao ministro Fernando Henrique.
A introdução da URV diária, com inflação ascendente em cruzeiros, cria dois problemas graves: acelera mais ainda a inflação em cruzeiros, aproximando-se perigosamente de uma híper, e deixa desprotegido quem ficar com seus rendimentos em cruzeiros, como será o caso dos assalariados.
Nessas circunstâncias, o governo seria obrigado a passar logo para a terceira fase do programa, que é a extinção do cruzeiro hiperinflacionado e a conversão obrigatória de todos os valores para URV. Só que seria uma URV precipitada e contaminada pela hiperinflação em cruzeiros. Seria outro plano perdido.
A idéia do Plano FHC é a de extinguir o cruzeiros a longo prazo, sem hiperinflação, pela introdução gradual de uma moeda nova atrelada ao dólar. Para isso, a inflação pode ser alta, mas precisa estar mais ou menos estabilizada. Não pode acelerar descontroladamente.
Alternativa
Se essa aceleração ocorrer, o ministro FHC estará diante da alternativa de tentar controlá-la com métodos clássicos (segurando tarifas, impondo alguns controles) ou apressar a URV e a conversão. Os economistas da equipe vão desaconselhar a precipitação do plano.
No âmbito político, FHC pode sofrer pressão inversa: o Congresso dá o ajuste fiscal, o presidente Itamar concorda com tudo, de modo que o ministro fica prisioneiro do plano e tem de fazê-lo.
Os últimos movimentos do Ministério da Fazenda indicam uma tentativa de segurar os preços com atrasos nas tarifas e ameaças generalizadas ao empresariado. Se funcionar, FHC ganha mais tempo. Segundo boa parte de seus assessores, o melhor que pode acontecer é o ministro encaminhar o plano em boas condições e sair candidato a presidente, deixando um aliado no seu lugar no ministério.

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