São Paulo, sábado, 8 de janeiro de 1994
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Romper a tradição

A tradição do Congresso com relação ao debate orçamentário jamais foi de seriedade e consequência. Desde a avalanche de emendas paroquiais propostas todos os anos até os esquemas de ilegalidade e imoralidade que vêm sendo revelados pela CPI, o Orçamento nunca foi tratado pelo Parlamento com a responsabilidade que merece. Afinal, não há como pretender combater o monstro inflacionário no país sem um Orçamento equilibrado.
Se o histórico do Legislativo já não é animador quanto ao tema, a situação agravou-se depois que o Executivo atrasou o envio da proposta ao Congresso, reduzindo o prazo para debate e aproximando-o mais do pleito deste ano. É um momento que acirra os instintos eleitoreiros e imediatistas de boa parte do Legislativo.
Constatar essas dificuldades, porém, não pode servir para justificar que o Congresso ignore o seu papel crucial no esforço de estabilização. O realismo, indispensável, não pode se confundir com a passividade. Melhor do que ressaltar como é improvável que os parlamentares ajam de forma responsável é pressioná-los para que o façam. A experiência política mostra que o Legislativo –já acuado pela vaga de escândalos– não é imune à indignação da opinião pública, ainda mais em véspera de eleição. O que está em jogo com o Orçamento, afinal, são as chances de uma estabilização da economia para este ano.
Deve-se notar ainda que o início das negociações não tem sido desanimador. O presidente da Câmara, Inocêncio de Oliveira (PFL-PE), por exemplo, manifestou-se contra as milhares de emendas habituais e há deputados apresentando propostas de mudança no projeto acompanhadas de sugestões alternativas que preservem o déficit zero. São sinais tênues, porém, e a tramitação do Orçamento é longa e imprevisível. Inúmeros interesses políticos vão intervir no processo, nem sempre na direção desejável.
Nunca se disse que obter a estabilização seria fácil e conseguir o equilíbrio das contas públicas é uma das suas condições básicas. Um país que tiver um Executivo e um Parlamento incapazes de cumprir esse requisito de forma responsável, e uma sociedade apática diante disso, está se condenando a permanecer no atraso e no subdesenvolvimento.

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