São Paulo, domingo, 9 de janeiro de 1994
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Controle do Judiciário dominará parte da revisão constitucional

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Tenho notícia de que o maior número de propostas para a revisão constitucional se refere ao Poder Judiciário. Ela parece ajustada ao sentimento geral a respeito da ineficácia da prestação jurisdicional do Estado. Trato do tema como sendo de ineficácia do Estado porque as insuficiências criticadas não se cingem aos atores judiciais, mas se estendem, em maior profundidade, às falhas do mecanismo estatal, geradoras de uma quase impossibilidade de realizar o direito através do Poder Judiciário. Daí decorreram as propostas do controle externo.
Ainda há vozes judiciais que se recusam a ver sinceridade de propósito nos que são favoráveis ao controle externo. Tomo o exemplo do juiz José Rodrigues de Carvalho Neto, do 1.º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, um processualista de primeira qualidade, profundamente preocupado com a realização da justiça. Retratando, porém, sentimentos comuns entre seus colegas, em discurso recente chamou de fascistas os que defendem, entre outras medidas, a criação de órgão externo controlador da magistratura. Atinge, nesse passo, até a Ordem dos Advogados do Brasil, favorável ao controle externo, mas adversária incansável de todas as doutrinas totalitárias.
Rodrigues de Carvalho, acompanhando o magistrado Luiz Flávio Gomes no livro "A Questão do Controle Externo" (Revista dos tribunais, 127 páginas), trouxe contribuição merecedora de exame atento ao afirmar a necessidade de controle interno através da criação do CNM (Conselho Nacional da Magistratura). Ambos negam que o Conselho possa ser integrado por estranhos ao Judiciário, mas sustentam que seus componentes devem ser eleitos por seus pares, para mandato com prazo determinado, de modo a se legitimarem para a missão, com democratização e transparência. Criticam o método de simples escolha, pois "deixaria a porta aberta para nepotismo, corporativismo e clientelismo".
Gomes e Carvalho Neto defendem que nenhum ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) integre o órgão de controle. Também é minha posição, diversa da adotada no anteprojeto da Comissão nomeada pelo Conselho Federal da OAB, que inclui um ministro do STF.
Vou além: deve haver um Conselho Nacional e Conselhos Estaduais ou regionais, nos vários ramos da Justiça oficial (estadual, federal, trabalhista, militar, eleitoral) integrados por juízes e por pessoas estranhas à magistratura. Contarão com juízes dos tribunais de alçada e mesmo de primeira instância, mesclando a experiência dos mais antigos com a vivência atual da magistratura que tem contato direto com o povo.
Feita a ressalva da participação de conselheiros estranhos à magistratura –como está no anteprojeto da OAB– penso que os dois magistrados estão certos ao quererem representantes das regiões e instâncias do Judiciário no CNM e que seus membros se dediquem exclusivamente às tarefas de controle. No livro mencionado, Luiz Flávio Gomes diz que esse encaminhamento dará o meio adequado para se chegar à "unanimamente reclamada modernização da Justiça brasileira".
Tenho, como evidente, muitos pontos de divergência com as teses sustentadas na obra, mas ela resume, com critério e serenidade, as informações que o Judiciário pode oferecer ao Congresso revisional. Seu debate é fundamental, pois a "unanimamente reclamada" modernização judicial extrapola os interesses corporativos: sem ela a manutenção da paz social será impossível nestes tempos de crise.

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