São Paulo, sexta-feira, 14 de janeiro de 1994
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Um plano de incertezas

JANIO DE FREITAS

As reconsiderações a que a URV está sendo submetida na equipe econômica, e que lançam dúvidas ainda maiores sobre sua adoção, receberam duas confirmações de origem oficial.
Pelo que foi dito na apresentação do Programa de Estabilização, em 8 de dezembro, e repetido até recentemente pelo ministro Fernando Henrique, "a URV será adotada tão logo o ajuste fiscal esteja aprovado" pelo Congresso. A aprovação foi prevista para janeiro ou, no mais tardar, fevereiro, o que levou à afirmação de que "em março a URV estará adotada". O bom andamento de suas negociações com o Congresso permitiu ao ministro prever, há pouco, a antecipação da URV para fevereiro. E, em sua entrevista na Folha de ontem, Fernando Henrique, em resposta sobre o transcurso do ajuste fiscal no Congresso, não retifica a previsão feita em dezembro. Mas, ao falar da URV, o que diz é isto: "é possível que se tenha a nova moeda ainda no primeiro semestre". Nem alguma dose de precisão há mais, por parte de quem previa que já em junho, portanto ainda no primeiro semestre, graças à URV a inflação estaria "em uns 3%". Ou seja, a URV está no limbo, com a inflação no céu.
Menos oblíquo do que o ministro, o diretor de Política Monetária do Banco Central, Francisco Pinto, admitiu, em depoimento na Câmara dos Deputados, que está sendo estudada a dolarização, ou atrelamento da nova moeda ao dólar, para vigorar por um ou dois meses. Pelo menos. O que Fernando Henrique vinha dizendo é que "não vamos fazer dolarização, porque queremos preservar a soberania nacional". Soberania ou não, o fato é que os pontos focais do Programa de Estabilização voltaram a ser tão incertos quanto antes da apresentação do Programa. Ou seja, ainda não há Programa, há estudos com futuro não mais do que duvidoso.
Arraes se pronuncia
Citado em um dos papéis da Odebrecht apreendidos há um mês, por suposto pedido de ajuda para sua campanha, o deputado Miguel Arraes não foi incluído nos convocados pela CPI: os critérios para convocações foram a citação por José Carlos dos Santos ou a presença do nome seguido de um percentual, nos documentos da empreiteira referentes a verbas e obras públicas. Embora inexistindo requerimento para sua convocação (o do deputado Maurício Najar, na última hora, foi verbal e recusado pela Mesa), no início desta semana Arraes tornou-se motivo de inesperada polêmica na CPI, cujos integrantes quercistas e malufistas queriam convocá-lo. Confirmada a dispensa pela CPI, Miguel Arraes decidiu-se por um pronunciamento, o que fez por carta ontem enviada a esta coluna. Ei-la:
"Só agora venho agradecer as referências a meu nome feitas na sua coluna. Em meio às insinuações divulgadas pelos órgãos de comunicação e de declarações de pessoas que desejavam transformar a CPI do Orçamento em instrumento de baixa política, fiquei satisfeito em ter tido uma voz como a sua fazendo-me justiça.
"Fiquei numa estranha situação, pois de nada fui acusado. Em 2 de dezembro, respondendo carta que lhe enviei no dia 1º, o senador Jarbas Passarinho enviou-me fotocópia de um papel datilografado, afirmando que por ele não respondia. Se o papel não tinha validade, era imposssível defender-me do nada. De qualquer modo, a defesa seria simples. Nas minhas contas bancárias só foram depositados meus subsídios, aposentadoria do Instituto do Açúcar e do Alcool e pensão do Estado de Pernambuco. Meus bens têm origem comprovada:
"1- Casa residencial à r. D.Olegarina da Cunha, 288, Casa Forte, Recife, reg. no 2º Cart. de Imóveis do Recife, mat. 18.458 de 7.1.82 2- dois lotes no loteamento Cidade Jardim, Jaboatão dos Guararapes, nºs 6 e 8 da quadra 8, adquiridos em agosto de 1972 e agosto de 1988 3- Sítio Caitetu, no município de Araripe-CE, havido por herança em 1954, Reg. de Imóveis de Araripe nº 921 4- duas linhas telefônicas 5- casa popular construida em 1963 em um dos lotes em Jaboatão 6- Um Ford 91 e um Opala 90.
"Caso alguém suponha que existam outras contas, está desde logo autorizado a percorrer a rede bancária e apontá-las. No que toca aos bens, idem. As manobras políticas que repercutiram na imprensa visavam misturar-me com acusados às voltas com a CPI. Tentaram atingir-me e às forças a que pertenço (tentam agora envolver Lula) à espera de uma negociação impossível. Se não devemos, ela não tem cabimento. Note que estranhamente, um mês depois, quando meu nome aparece nas pesquisas com destaque e começam a cogitar das alianças em nível nacional, o assunto volta à tona.
"Remeto-lhe essas informações porque v. não as pediu para escrever a citada coluna. Não haveria, por conseguinte, necessidade ou obrigação de lhe prestar contas. Demonstro, para outros que assumiram atitude oposta, que nada tenho a esconder. O relator da CPI, deputado Roberto Magalhães, estaria propondo que seja quebrado o sigilo bancário de todos os portadores de mandato daqui para a frente. É uma medida louvável que, no meu caso, pode ser tomada também para trás".

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