São Paulo, segunda-feira, 17 de janeiro de 1994
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Menopausa é uma "injustiça" natural

JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Menopausa é uma "injustiça natural"
Para homens, é possível ter filhos após os 40
A atual polêmica gerada pelos casos de fertilização assistida em mulheres que engravidaram com idade superior a 45 ou 50 anos, atendidas por Severino Antinori, na Itália, descobre, mais uma vez, a face do machismo no mundo contemporâneo.
Ninguém considerou estranho Charles Chaplin ter filhos após seus 80 anos. Pelo contrário, aplaudiram sua virilidade. Não passa pela cabeça de alguém deixar de usar óculos após os 40 anos, quando a visão começa a dar sinais de cansaço, apesar de estarmos contrariando a natureza. Mas fazer uma mulher –que deseja– engravidar após a menopausa se transforma em escândalo mundial.
Na maioria dos países, as mulheres vivem atualmente além dos 80 anos de idade, ou seja, passam a metade de sua vida adulta após a menopausa, ao contrário do que ocorreu por milênios. Até o início deste século, as mulheres tinham uma esperança de vida que não ultrapassava os 50 anos.
A técnica aplicada por Antinori nas mulheres com idade superior aos 50 anos é igual à que todos usamos nas que têm menos idade. Para preparar uma paciente para o procedimento do bebê de proveta, a primeira atitude é colocar seus ovários em repouso. A mulher menopausada já está assim. A partir daí, inicia-se o estímulo ovariano que gera óvulos, que são colhidos, fecundados e devolvidos ao útero materno.
Se as mulheres vivem mais, se boa parte delas pode, com o uso de estrógenos, continuar menstruando e mantendo, de forma prolongada, sua juventude, inclusive prevenindo osteoporose e diminuindo o risco de doenças cardivasculares, por que algumas poucas, que desejarem e demonstrarem condições para isso, não podem ter e criar um filho?
Sempre respeitei a natureza, mas creio, cada vez mais, que a menopausa é uma injustiça que esta mesma natureza faz com as mulheres. Se temos condições de corrigi-la, devolvendo às mulheres a plenitude de vida após os 50 anos de idade, como se devolve a um míope o uso total de sua visão, devemos fazê-lo. É claro, que com critério e analisando cada caso sob o rigor de uma visão ética abrangente, que afasta preconceitos.
Todo avanço científico e tecnológico traz consigo a necessidade de uma discussão ética. A ciência e as novas tecnologias não são, por si sós, um bem ou um mal. Depende da forma de usá-las.
A discussão ética que inevitavelmente se fará sobre essa questão precisa ser abrangente, levando em conta, entre outros, os fatores acima mencionados e não esquecendo que vivemos em um mundo, da Suécia ao Sudão, que ainda discrimina a mulher.

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