São Paulo, quarta-feira, 19 de janeiro de 1994
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O obstáculo do candidato

O susto que fez o ministro Fernando Henrique providenciar o lançamento urgente de sua candidatura, com resultados muito duvidosos, teve motivações que só o imprevisível desdobrar das circunstâncias poderá resolver. Uma iniciativa pessoal, como a de Fernando Henrique, é insuficiente para dominar a força destas circunstâncias e dirigi-las acima de objetivos políticos alheios, mais amplos e contrários a ele.
Citado como o ressurgido obstáculo que agitou Fernando Henrique, o senador Mário Covas está no centro dos acontecimentos à sua revelia. O obstáculo que se apresentou a Fernando Henrique não tem nome. É a constatação, por lideranças políticas de diferentes partidos, dos atrativos que faltam a ele e sobram em Covas para uma convergência multipartidária que enfrente Lula com possibilidades reais de êxito.
Duas hipóteses de coligação surgiram logo às primeiras cogitações eleitorais: PSDB–PT e PSDB–PMDB. A primeira naufragou cedo, com a ajuda de Fernando Henrique, que percebia a impossibilidade de ocupar o lugar de Lula em uma coligação. A outra não se fez, nem se desfez, retida no limbo pela inconciliação interna do PMDB. E só poderá se fazer em um caso: se Fernando Henrique não for o candidato do PSDB, dada a sua rejeição pelo PMDB quercista e, ainda, as resistências que suscita em boa parte da ala antiquercista. Ao passo que Covas pode ser aceito pelas duas correntes do peemedebismo. E com outra conveniência de peso: a candidatura de Quércia ao governo paulista, que já figura nas avaliações da cúpula do PMDB–SP, receberia o melhor dos presentes com a retirada, para a disputa pela Presidência, do primeiro colocado nas pesquisas de São Paulo. Caso a coligação se fizesse só para o plano federal, o deslocamento de Covas não deixaria desarmado o PSDB, que conta com a alternativa José Serra.
O PSDB não é mais o partido iniciante de 89, que só tinha estrelas e nenhuma das estrelas quis trabalhar de fato pelo candidato Covas. O PSDB de hoje tem bases políticas e eleitorais no país todo. Agora mesmo, antes que se encerrasse o prazo de transferências partidárias no dia 9, foi a solução da moda –embora com a perda dos critérios éticos para a admissão. Este crescimento leva algumas avaliações a concluir até que a coligação PSDB-PMDB poderia ganhar já no primeiro turno, pela sedução fortalecedora que esta hipótese exerceria sobre parcelas expressivas de outros partidos. É claro que tal avaliação conta com desempenho de Lula, no primeiro turno, equivalente ao de 89. E, fundada ou otimista demais a idéia de sedução para uma vitória já no primeiro turno, o fato é que as conversas têm envolvido, também, políticos expressivos que não são do PSDB, nem do PMDB.
Admitida a ocorrência de segundo turno, nem por isso as prospecções alteram o essencial. No próprio PMDB é usual o reconhecimento de que Fernando Henrique, em disputa final com Lula, não teria apoios do PDT, PPS e de boa parte do contingente apartidário que, já em 89 e ainda mais em 94, apoiará Lula para não votar em candidato empresarial, ou de estilo, digamos, global. Já a Mário Covas é atribuida a capacidade de concentrar aqueles apoios todos, em uma frente plural que só o próprio PT e os pouco expressivos PSB e PC do B deixariam de integrar.
Informações sobre o veloz avanço de tais conversas, entre lideranças de diferentes partidos, é que assustaram Fernando Henrique. O lançamento precipitado de sua candidatura, atitude compreensível em um principiante, só parece ter-lhe agravado a situação, inclusive ou sobretudo no PSDB. Seu aliado continua sendo Mário Covas, que ainda não quer saber de candidatura à Presidência.

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