São Paulo, quarta-feira, 19 de janeiro de 1994
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Subway

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

SÃO PAULO – Um maquinista teria visto o vulto passeando por uma linha do Metrô entre as estações d. Pedro 2.º e Brás, na área central de São Paulo. Eram 14h21 de segunda-feira. O alerta foi dado. Imediatamente paralisou-se o trecho, os trens estacionaram, a energia dos trilhos foi cortada.
Quatro homens da área de segurança da companhia iniciaram, então, a devassa. Vasculharam os túneis à caça do intruso. Percorreram os corredores, procuraram pelas passagens de segurança, mas ninguém foi encontrado.
O "flâneur" dos trilhos havia desaparecido nas profundezas, da mesma forma óbvia e misteriosa que o homem da modernidade evaporava nas multidões do final do século –situação urbana que inaugurou a possibilidade de um novo espaço ficcional, o do romance policial.
Não há motivos para se desconfiar mais dos sentidos do maquinista que diz ter avistado o vulto do que dos chips da rede informatizada que controla os túneis do Metrô. Operadores asseguram que frequentemente as máquinas denunciam a presença de "espectros" nas linhas.
O caso mais comum é a indicação, pelo computador, de uma composição parada. Detectado o perigo, como mandam os regulamentos de segurança, o setor ocupado pelo trem defeituoso é interditado. Quando checa-se o problema, descobre-se, contudo, que a composição não existe. Era um trem virtual, um trem imaterial, criado pela imaginação do computador.
Funcionários do Metrô revelam que incursões de usuários pelos intestinos da rede de trem não são raras. Mas asseguram que "sempre" se encontram os seres atraídos pelo abismo das galerias. Sempre?
Desta vez não encontraram. Devemos insistir na ilusão do maquinista? Ou, como no conto de Cortázar, os números registrados nas borboletas –ou catracas– do Metrô de São Paulo, o mais congestionado do mundo, começarão a denunciar um intrigante déficit entre as multidões que entram e as que deixam as instalações do subsolo?

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