São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 1994
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A caixinha da Telesp

LUÍS NASSIF

Logo que assumiu a presidência da Telesp, indicado pelo esquema Leopoldo Collor de Mello, Oswaldo Nascimento convocou uma reunião com fabricantes de equipamentos celulares. Telefonou pessoalmente a cada presidente ou alto executivo, convidando-os para uma conversa.
Iniciada a reunião, Nascimento pendurou um mapa de São Paulo na parede e expôs seu plano. Consistia em dividir o território para a licitação de telefonia celular. São Paulo e Santos ficariam para a Ericsson. Campinas, para a Norden. A NEC ficaria com São José dos Campos. Araraquara e Bauru seriam entregues para a AT&T e a Motorola.
Os fabricantes deveriam fazer o arranjo de preços entre si, garantindo a vitória prévia a cada um deles, conforme o combinado. "Apresentem um preço que seja bom para todo mundo", disse Nascimento.
Depois, o vencedor de cada licitação pagaria a comissão a Leopoldo Collor, de acordo com um quadro esquemático que Nascimento mostrou a seguir, com percentuais que começavam em 4% e subiam até a faixa dos dois dígitos, dependendo do tipo de equipamento licitado –telefonia celular, centrais telefônicas, microondas, multiplexadores, cabos telefônicos.
A informação foi prestada ao colunista pelo presidente de uma das companhias, presente ao encontro. Segundo ele, a proposta foi recusada pelos fabricantes de celulares. Já o estreitamento do mercado tornou os fabricantes de fios e cabos mais vulneráveis às pressões.
O intuito do depoimento, segundo a fonte, foi demonstrar que o setor não é cartelizado –conforme a coluna aventou, na análise sobre a recente licitação da Telebrás que foi cancelada.
Ricos e intocáveis
Oswaldo Nascimento deixou a presidência da Telesp envolto em um mar de denúncias. Jamais foi molestado e ainda conseguiu vencer uma licitação para fornecimento de correio eletrônico de voz para o serviço celular da empresa. Informações do meio dão conta de que adquiriu empresa de telecomunicações nos Estados Unidos.
De semifalido, Leopoldo Collor tornou-se proprietário de uma mansão no Jardim Europa, em São Paulo. Frequentemente aparecem notas em colunas sociais, informando sobre compras ostentatórias feitas por ele, em Mar del Plata e Miami.
A divulgação de denúncias, principalmente contra interesses poderosos, implica desgastes e riscos. Tudo em nome do interesse público. Mas qual a contrapartida legal dada pelo Ministério Público Federal –a quem caberia, pela Constituição, defender o patrimônio público?
Apesar da abundância de denúncias divulgadas na época, não houve um só processo levantado contra Nascimento. Há mais de um ano um procurador solicitou informações sobre Leopoldo Collor de Mello, muito tempo depois que espoucaram as primeiras denúncias, e vários meses após a publicação do livro de Pedro Collor de Mello, denunciando o irmão.
Não se soube de mais nada. O MPF, em Brasília, não presta informações. Alega não dispor de controle sobre os processos. Nem de respeito pela opinião pública.
Punição "em tese"
Enquanto isto, o procurador-geral da República, Aristides Junqueira, satisfaz o espírito pouco crítico de parte da opinião pública, mais uma vez anunciando que "em tese" os corruptores apontados pela CPI do Orçamento serão severamente punidos. Sempre "em tese", ou então transferindo para o Judiciário a culpa pela impunidade.
Dois anos depois de divulgados os escândalos da era Collor, o Judiciário nada recebeu contra Zélia, Leopoldo, Raymundo Nonato. Os processos sequer foram transformados em inquéritos ou renderam denúncias.
Não se condene o MPF por inteiro. Há iniciativas individuais louváveis, como a recente conquista da liminar que impediu os fabricantes de cimento de imporem o frete aos consumidores, rompendo com décadas de uma prática cartelizadora conhecida e até então intocável.
Mas ser ou não ser eficiente passa a ser decisão individual de cada procurador. Até agora a corporação não se mostrou à altura das esperanças que despertou, quando conquistou sua autonomia.
Itamar e o social
A decisão do presidente da República Itamar Franco, de editar medida provisória proibindo definitivamente cortes de verbas para a saúde, mais a análise dos gastos públicos no ano passado, demonstram que, provavelmente pela primeira vez na República, teve-se um presidente da República, e um ministro da Fazenda, efetivamente comprometidos com o social. Não há como deixar de reconhecer.

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