São Paulo, segunda-feira, 31 de janeiro de 1994
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Seca aumenta crise entre cortadores de cana

DA AGÊNCIA FOLHA, EM IPOJUCA (PE)

A seca que atingiu o Nordeste nos últimos dois anos agravou a situação dos cortadores de cana da zona da mata pernambucana. Houve redução de 50% na contratação de mão-de-obra em função da quebra de safra, o que levou grande parte dos trabalhadores rurais da região de Ipojuca (57 km ao sul de Recife) a se tornar catadores de caranguejo nos mangues.
Quem conseguiu se manter nos canaviais, recebe CR$ 1.315,00 por dia para cortar e amarrar em feixes 1,2 tonelada de cana. Se a tarefa se resumir ao corte, a produtividade exigida sobe para 2,4 toneladas. A jornada de trabalho é de seis dias semanais.
Alimentando-se mal e com a obrigação de produzir, muitos cortadores contam com a ajuda de filhos para executar os serviços. É o caso de Antonio Agostinho da Silva, 76, que trabalha ao lado de sua filha, Lúcia Maria da Silva, 11.
Antonio trabalha no campo desde os nove anos. De seus 17 filhos, seis morreram antes de completar dois anos. Lúcia ajuda o pai e não recebe nada. Ambos trabalham sem proteção contra acidentes.
Pai e filha se enquadram no perfil traçado pela pesquisa do Centro Josué de Castro, que constatou que em Ipojuca 25% dos acidentes, registrados por intermédio da CAT (Comunicação de Acidentes de Trabalho), tiveram como vítimas crianças e adolescentes. Ainda segundo a pesquisa, 68,96% dos acidentes foram provocados por foice. Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ipojuca, Geraldo Fernandes Lima, 44, a pesquisa revela aspectos que classifica de "tragédia social". A presença das crianças nos canaviais, diz, tem como causa a necessidade de os menores ajudarem os pais a produzir o suficiente.
"Na teoria a senzala acabou, mas a escravidão pela falta de oportunidade continua", afirma Lima. A monocultura da cana na região faz com que na entressafra apenas 40% dos 5.000 cortadores da região consigam emprego no plantio da nova safra.
O Sindicato do Açúcar e do Álcool de Pernambuco (Sindaçúcar) não aceita que os usineiros sejam responsabilizados. Por meio de sua assessoria, o presidente da entidade, Eduardo Farias, informou que o trabalho das crianças e adolescentes não é admitido por ser ilegal. Reconhece, porém, a dificuldade em controlar o acesso.
O sindicato afirma já ter feito apelos aos proprietários das 33 usinas associadas para que impeçam a presença de crianças no campo e coíba o que classifica de "irresponsabilidade social".

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