São Paulo, sexta-feira, 7 de outubro de 1994
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A hora da verdade

ANTONIO CARLOS GERMANO GOMES

Sempre que se vê a construção de um túnel, um viaduto ou qualquer obra viária urbana deveria se perguntar: qual será o retorno financeiro direto. Não, não estamos falando em benefícios como conforto aos cidadãos, economia de combustível etc. Estamos falando de retorno, moeda corrente, dinheiro pago pelo serviço.
Sim, porque para cada obra de saneamento se exige retorno financeiro direto. Ignora-se os benefícios decorrentes do conforto da população, melhora da qualidade de vida, economia em gastos de atendimento médico e hospitalar. A análise é dura e asperamente financeira.
Sejamos realistas. Temos no Brasil pelo menos 30 milhões de habitantes sem abastecimento de água potável. E pelo menos 80 milhões de brasileiros residindo em casas não atendidas por coleta de esgoto.
Só para atender a esta necessidade, sem considerar o crescimento vegetativo da população, precisaríamos de US$ 3,5 bilhões por ano.
E para viabilizar o tratamento de esgotos das populações urbanas e com isto proteger rios e mananciais, precisaríamos de investimentos mínimos de US$ 25 bilhões, o que se viesse a ser feito em 20 anos, demandaria US$ 1,25 bilhão por ano.
Podemos afirmar com margem de segurança, que em todo o Brasil, somadas todas as companhias municipais e estaduais de saneamento, a cobrança de tarifas resulta em US$ 5 bilhões por ano. Devido a comprometimentos com folha de pagamento, monstruoso endividamento e custeio diverso, com muita sorte sobra 5% do valor.
Portanto, para uma necessidade de investimento de US$ 4,75 bilhões por ano, temos US$ 250 milhões. Fica evidente que não resolveremos o problema de saneamento básico via tarifa. Uma eventual melhora no processo de gestão das companhias ou elevação de tarifas, poderiam aumentar em 15 a 20% o faturamento global, isto após alguns anos de esforço.
Saneamento precisa deixar de ser discurso para ser prática. Precisa sair dos incontáveis planos de engenharia econômica complicada para se tornar prioridade de investimento da União, estados e municípios.
É certo que a privatização poderá atender parte da demanda. Mas certamente os 30 ou 40 milhões de brasileiros excluídos economicamente precisam ser atendidos pela via orçamentária. Afinal de contas, imposto não é um meio de reduzir as diferenças de renda?
Sem infra-estrutura, não há crescimento da qualidade de vida do povo possível e, sem este, o crescimento do PIB é apenas enfeite para satisfazer elites comprometidas consigo próprias.

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