São Paulo, sábado, 15 de outubro de 1994
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Proposta inoportuna

A proposta de triplicar os salários dos senadores, feita pelo primeiro-secretário da Senado, Júlio Campos (PFL-MT), é absolutamente inoportuna. Com seu prestígio já reduzido pelo baixo comparecimento e um desempenho ainda marcado pelo fiasco da reforma constitucional, os parlamentares chocam-se –com uma insensibilidade espantosa– com a generalizada demanda por um pouco mais de austeridade.
Do ponto de vista da população, o projeto chega a ser ofensivo. Há poucas semanas, o ministro Ciro Gomes interveio nas negociações entre metalúrgicos e montadoras para tentar impedir uma majoração salarial inferior a 15%. O aumento dos senadores, se levado adiante, seria de quase 300%.
Ainda que a gritante disparidade de renda no Brasil tenha razões históricas, econômicas e políticas que ultrapassam a ação do Parlamento, não deixa de ser agressiva a crueza com que senadores aprovam um salário mínimo de R$ 65,00 para o país e um rendimento de R$ 12 mil para si mesmos.
O atual valor dos recebimentos mensais dos senadores pode ser inferior aos de quadros bem remunerados do setor privado. Deve-se reconhecer, ademais, que o cargo de senador é de grande responsabilidade. Mas isso não justifica de modo algum a proposta de Júlio Campos. Afinal, o que se espera dos detentores de mandatos populares são demonstrações de grandeza e não de mesquinhez.
A possibilidade de autoconceder-se aumentos reforça a impressão de egoísmo em um ambiente já identificado pela carência de espírito público. Enquanto o plano de estabilização é prejudicado pela demora na implementação das reformas que podem dar-lhe suporte duradouro, os senadores maquinam reunir-se para cuidar do próprio bolso à custa do erário.
Parte dos parlamentares demonstra ainda ignorar o sentimento e os anseios da população. A excepcional quantidade de votos nulos e brancos foi uma mostra inequívoca de descontentamento. A atitude dos senadores vem apenas reforçar esse quadro. Lamentavelmente.

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