São Paulo, sexta-feira, 21 de outubro de 1994
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Fernando Henrique vai ter coragem?

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Informado de mais uma chacina no Brasil, o presidente eleito, Fernando Henrique Cardoso, transmitiu, de Moscou, sua preocupação com a violência urbana –comprometeu-se a colocar o tema no topo de sua agenda. Será que ele vai ter coragem de lançar uma polêmica discussão?
Ele sabe que uma idéia atrai algumas das melhores cabeças do mundo, preocupadas com a disseminação da violência: descriminalizar as drogas. Tratar o vício como um tema de saúde pública e não basicamente de polícia, o que teria o dom de reduzir o tráfico clandestino e o crime organizado.
Cada vez mais pessoas nos Estados Unidos questionam a eficácia da repressão. Cito apenas um nome, estrela do conservadorismo mundial: Milton Friedman, Prêmio Nobel de Economia.
Lá, disseminam-se as gangues, os assassinatos e assaltos vinculados ao comércio de drogas. Gastam-se bilhões de dólares na repressão, mas as estatísticas de consumo não são animadoras.
Nas pesquisas que tenho realizado desde 1989 sobre violência contra crianças, percebo cada vez mais a presença, por trás dos assassinatos e conflitos de quadrilhas, do crime organizado ligado ao tráfico de drogas –e com ramificações na polícia e esquadrões da morte. Sinceramente, não sei o que é pior para os jovens: as drogas ou sua repressão.
Compreensivelmente, a imensa maioria dos pais reage com horror à idéia de flexibilizar o consumo –nada mais deprimente do que o vício. Existe, aqui, uma pergunta essencial: é preferível o jovem comprar drogas numa farmácia, com controle de qualidade, ou dos traficantes?
Não estou, aqui, falando de uma idéia abstrata. Centenas de estudiosos analisam o exemplo da Holanda. Lá, o consumo foi descriminalizado e o os viciados de drogas pesadas (heroína, por exemplo) recebem medicamento das mãos de médicos. Os números mostram queda na violência.
Sei que implementar a descriminalização é complexo, bate em tabus, exigiria um pacote de medidas de saúde e educacionais para prevenir o consumo. Mas é uma insanidade não levá-lo em conta.

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