São Paulo, sexta-feira, 28 de outubro de 1994
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A profecia se cumpre

JOSÉ SARNEY

Passamos um longo desfiladeiro. Saímos de um regime autoritário para o Estado de Direito sem as agruras que costumam acompanhar esse processo.
Conseguimos o milagre de fazer a transição com as Forças Armadas, que dela foram garantidoras. Os militares voltaram aos seus deveres profissionais.
Mas a transição maior foi aquela que não se vê e é mais profunda: a mudança da sociedade brasileira. Esta era profundamente elitista, as decisões restritas a um núcleo pequeno e privilegiado.
As classes trabalhadoras não tinham voz. Havia mesmo uma escala de gradação nos segmentos sociais, uma espécie de castas.
Tudo mudou. Hoje, os patrões sabem que somos uma democracia, na qual o seu empregado não é mais o servo que trabalha e dele depende. Ele tem sua própria força, de suas organizações, de sua identidade.
Não só a classe trabalhadora, mas o povo todo, nos seus diversos segmentos, se organizou, tomou consciência dos seus direitos e influi nas decisões.
Tudo isso foi possível graças ao poder criativo da liberdade. Ela estimulou e criou uma sociedade participativa.
A democracia moderna, não somente formal, é aquela que se derrama num sistema de capilaridade em todo o corpo social.
A política não é somente obra dos políticos, mas de todos que exercem liderança nos seus respectivos segmentos.
Mudança importante foi a extinção da discriminação ideológica. Nos anos 80 ainda era estigma e maldição a posição ideológica das pessoas. Hoje todos convivem e aceitam a liberdade de cada um, de pensar e de opinar, de questionar de acordo com suas idéias.
Essa mudança da sociedade passou despercebida e foi tão forte e profunda que não surgiram resistências. Isso não ocorreu nos países que atravessaram o que o Brasil atravessou. Eles tiveram problemas e sequelas. A Coréia, Taiwan, China, Cingapura, os tigres, não cruzaram ainda o desfiladeiro institucional.
O Brasil está, assim, pronto para a arrancada do desenvolvimento. Desenvolvimento como um processo interno, mas já, agora, como um processo sistêmico num mundo cada vez mais interdependente.
O Mercosul, com a estabilização da economia brasileira, vai dar um salto gigantesco. É a regionalização de nossa economia, para participar da globalização em termos competitivos em relação a essas duas tendências mundiais.
É este Brasil, moderno, industrializado, uma democracia sólida que vai entrar no século 21, para ocupar o seu lugar no mundo.
Será a consumação da profecia ``país do futuro".

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