São Paulo, domingo, 30 de outubro de 1994
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Se eu roubar o ``Minas Gerais"

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Amanhã, pelo que consta, o governo federal decidirá se faz ou não a sua obrigação. Em reunião com o governador do Rio, o presidente da República examinará se deve ou não cumprir a lei. E a lei é clara: droga é contrabando (logo, está na esfera da Polícia Federal) e armas importadas ou também são contrabando ou são do hipotético ``uso exclusivo das Forças Armadas".
Se eu roubar o porta-aviões ``Minas Gerais" e levar para Cabo Frio a fim de dar umas voltas pela praia das Conchas, ou mesmo aqui em frente de casa, na Lagoa, a Marinha não precisará pedir licença à delegacia local para recuperar o lendário vaso de guerra e me levar preso. O mesmo aconteceria se eu roubasse um Mirage da FAB ou um tanque do Exército.
Era mais ou menos isso o que o ex-governador Leonel Brizola procurava explicar quando falavam em intervenção no Rio de Janeiro, sob a alegação (correta) de que o Estado sozinho não podia enfrentar o crime organizado cujo núcleo é o tráfico da droga.
As alternativas que apresentavam eram a intervenção ou a continuação da violência. Somente agora, com o final de governo, as autoridades federais descobriram que podiam chegar ao mesmo resultado (combater o crime no nível em que se instalou no Rio) sem precisar mudar o chefe das portarias das repartições estaduais, os contínuos que servem café etc. Porque, no fundo, intervenção resulta mais ou menos nisso: é uma panacéia política, uma ocupação de território partidário.
Sabe-se que o Exército tem planos para colaborar e até mesmo comandar a repressão ao tráfico. Afinal, se as Ilhas Papuas, em improvável guerra contra o Brasil, conseguirem conquistar alguns morros no Rio, caberia ao Exército brasileiro ir até lá, brigar e desalojar o inimigo.
Sabe-se onde está o inimigo. Sabe-se até o tipo de tropa e de armamento de que dispõe. A superioridade das forças –aparentemente– ainda é do Brasil. Discutir quem deve ser o primeiro a pisar no tapete vermelho ou o último a pisar no sangue é perda de tempo e demonstração de cinismo ou covardia.

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