São Paulo, domingo, 30 de outubro de 1994
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Roteiro do sucesso

BRUNA LOMABARDI

Lawrence Kasdan é um dos diretores mais conceituados de Hollywood e roteirista de sucesso. Assina o roteiro de três das maiores bilheterias da história do cinema: ``Caçadores da Arca Perdida", ``O Retorno de Jedi", ``O Império Contra-Ataca". Sua estréia como autor e diretor foi a ``caliente" versão noir anos 80: ``Corpos Ardentes". Desde então, seus personagens sutis lhe renderam quatro nomeações para o Oscar
Por Bruna Lombardi
–Que tipo de filmes você prefere?
–Todo tipo. Por isso trabalhei com vários gêneros. Gosto do Kurosawa, de John Ford, François Truffaut, Ingmar Bergman, Antonioni.
–Seu primeiro trabalho como diretor foi em ``Corpos Ardentes", e você trouxe um novo grande talento. Billy Wilder foi uma influência para você?
–Billy Wilder fez filmes maravilhosos e ``Double Indemnity" me causou um grande impacto. Esse tipo de filme começou após a guerra nos Estados Unidos, tratando das relações entre homem e mulher, da nova vida durante o dia e durante a noite, dos nossos desejos e da nossa moral.
–Como decidiu ser diretor?
–Começou muito cedo, quando eu tinha uns 13 anos. Eu vi ``Lawrence da Arábia", que me marcou muito. Eu já gostava de filmes e foi a melhor época do cinema, mas quando vi esse, pensei: que modo de viver! Pode-se ganhar a vida assim. E quando fui para a faculdade, eu achei que podia ser diretor se escrevesse. Eu tinha um certo talento.
–E você gosta de ver seus filmes?
–Bem, a realidade é: você não pode ver seus filmes antes de 5 anos. Você está tão perto de tudo. Sempre que vê uma cena, lembra do dia, o que sentiu do ator, como o ator se postou, e é difícil ver como um mero espectador. Mas 5 anos depois, você pode voltar, ver e entender. Pode ficar surpreso com o que fez. Pode ver que fez uma coisa errada ou pode até gostar e achar muito bom.
–O que faz um filme ser ótimo?
–Um filme ótimo é diferente para cada pessoa. Eu estudei literatura inglesa na faculdade, e os valores da literatura inglesa que me interessam em relação à arte são detalhes, personagens, como eles podem se aproximar da vida e como eu a considero complicada. Filmes ótimos, para mim, são os que invocam sentimentos sobre nossas vidas.
–O que você quer que seus filmes causem nas pessoas?
–Que elas pensem na sua própria vida. Que vejam algo na tela que as dirijam, que as façam pensar na própria vida, mesmo a vida na tela sendo diferente da vida real. A boa arte é de algum modo relevante à platéia.
–Acha que seus filmes podem mudar o ponto de vista das pessoas?
–Acho que é muito difícil as pessoas mudarem. Porque somos o que somos desde que nascemos. É incomum uma obra de arte mudar as pessoas, mas ela pode ter um impacto sobre as pessoas.
–Como se equilibra a arte com muito dinheiro?
–Às vezes um filme de arte se sai muito bem e acho que por isso que continuam a dar apoio a eles. Às vezes não há diferença entre arte e comércio. Quando há, é preciso arranjar dinheiro para o próximo.
–O sucesso comercial dos seus filmes preocupa você?
–Sim, porque quero conservar minha liberdade.
–Como diretor, sempre sabe o que quer, ou é assaltado por dúvidas no meio do processo criativo?
–Acho que devia ter mais dúvidas. Eu chego muito cedo e sou eu quem escreve. Tenho uma programação, uma cena a ser filmada. Há centenas de interpretações que podem ser dadas. O diretor é aquele que conhece o todo. Ele tem tudo na cabeça. Sabe o que deve ser feito. Mas, nele, há milhões de boas idéias. Todos têm. Os atores, a equipe, espero que eu também. Então é feita como que uma escolha. Não há muito tempo para dúvidas.
–Você não parece ansioso, quando trabalha fica calmo?
–Meu modo de ser é calmo. Não gosto de gritar, de brigar. Não gosto da tensão. As pessoas trabalham melhor quando estão relaxadas. Mas por dentro há muita energia. Ela nem sempre se expressa.
–O que o faz perder o controle?
–É difícil saber isso de nós mesmos. Eu fui acusado de ser fanático pelo controle. De querer controlar o ambiente e o processo. Acho que eu não poderia ser diferente. Mas às vezes, eu fico emocionado. Não posso ver injustiças ou alguém ser mal tratado. Me deixa louco.
–Quais são as qualidades mais importantes num ator?
–O tipo de ator que mais me atrai, a coisa mais importante é a simplicidade. Gosto de quem atinge sua meta de modo simples. Um desempenho tem várias facetas, como um mosaico, mas cada faceta tem que ser clara e simples.
–Você tem uma história engraçada com Kevin Costner. Você o cortou do filme ``The Big Chill". Sentiu culpa?
–Me senti horrível quando eu cortei Kevin. Eu o chamei e disse que me sentia mal, mas tinha cortado aquele pedaço do filme. Mas ele disse que tinha sido uma experiência ótima. Trabalhou com atores a quem ele admirava muito. Ele disse que tinha sido sua melhor experiência como ator e sabia que espécie de ator queria ser. Ele sabia que faríamos algo juntos.
–Acha que ``Wyatt Earp" é a vingança do Kevin?
–Ele está fantástico no filme, um desempenho incrível. Para mim é uma combinação da nossa amizade dos últimos 12, 13 anos.
–Você escreveu ``Grand Canyon" com sua mulher. É fácil um casal trabalhar junto?
–Nesse caso foi, porque o filme foi evoluindo através de anos de conversas. Tinha a ver com nossa vida em Los Angeles, na América. E um filho nosso estava saindo de casa. Os temas eram tão importantes para nós que o filme fluiu naturalmente. Foi muito satisfatório.
–Teve alguma experiência ruim?
–Várias, mas também tive ótimas. O meu roteiro para ``Caçadores da Arca Perdida", Steven Spielberg fez um super filme a partir dele. Me orgulho das coisas que escrevi para outros diretores.
O Programa ``Gente de Expressão" com Laurence Kasdan irá ao ar no dia 3 de novembro, às 22h30, com reprise sábado, às 13h30. Rede Manchete de Televisão.

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