São Paulo, segunda-feira, 31 de outubro de 1994
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Seguridade social, uma idéia para discussão

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

No mundo inteiro a seguridade social vai-se transformando no grande fantasma que assombra todos os governos. A questão é essencialmente a mesma: com o aumento da expectativa de vida e com a sofisticação dos padrões de vida não é mais possível, pelo menos dentro dos sistemas de seguridade social hoje vigentes, se evitar os déficits, que vão atingindo a casa dos bilhões de dólares por ano, mesmo nos países com economia mais estável.
O Brasil não é exceção à regra, com a agravante de que aqui, por uma série de distorções causadas pelo uso errado do dinheiro da seguridade social, a falência do sistema já aconteceu.
O Estado pura e simplesmente não tem mais condições de arcar com estes custos e vem, há algum tempo, fazendo mágicas para evitar o colapso total da atividade, atendendo mal e porcamente os aposentados e, pior ainda, os que buscam o serviço público de saúde.
Como o tema é muito extenso e de uma complexidade fantástica, este artigo vai-se ater a um único tópico que, por sua abrangência, acaba por ser o que afeta o maior número de pessoas: a aposentadoria.
No Brasil, a grosso modo, temos três modalidades de aposentadoria: a por idade, por tempo de serviço e por invalidez.
A primeira e a última são essenciais em qualquer sistema de previdência que se queira afinado com as necessidades sociais do fim deste século. Mas, e a segunda, a aposentadoria por tempo de serviço, será que ela está em acordo com a realidade? Será que tem sentido alguém se aposentar com menos de 50 anos, quando as expectativas de vida vão deixando para trás a barreira dos 70 anos?
Outra questão que precisa ser revista com a máxima urgência são os chamados estoques estaduais e municipais, que sem dúvida nenhuma representam um rombo incomensuravelmente maior do que o do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), e que são quase deixados à margem das discussões.
Os estoques estaduais e municipais são as responsabilidades que Estados e municípios têm em função de planos previdenciários próprios e que estão, de norte a sul do país, numa situação muito mais delicada do que a atualmente administrada pela União, através da previdência e da saúde públicas.
Depois desta breve introdução, podemos definir quatro tópicos fundamentais para a criação de uma seguridade social mais eficiente do que a atual:
1 – separação total das verbas destinadas à previdência das verbas destinadas à saúde;
2 – planos unificados de benefícios;
3 – aposentadoria apenas por idade e invalidez, e limitada ao beneficiário, companheiro e filhos menores; e,
4 – benefícios regionalizados.
Abrindo cada um dos tópicos temos:
Sem que haja a separação total das verbas destinadas à previdência das verbas destinadas à saúde não é possível se falar de um gerenciamento eficiente da seguridade social.
Previdência é um capítulo e saúde um outro completamente diverso, com origens e fins diferentes e que se colocados no mesmo saco, como hoje acontece, jamais poderão ser administrados com o mínimo de racionalidade indispensável para viabilizá-los.
A unificação dos planos de benefícios visa impedir que minorias privilegiadas tenham duas ou mais aposentadorias, algumas inclusive com valores imorais face à realidade nacional. Perante a seguridade social não deve existir qualquer tipo de diferenciação ou privilégio, cabendo a cada cidadão brasileiro o direito a uma única aposentadoria.
O controle do sistema ficaria a cargo da União.
A aposentadoria apenas por idade e invalidez se faz essencial não porque é o sistema adotado na imensa maioria dos países do mundo, mas porque não há sentido em se falar em aposentadoria por tempo de serviço num país onde as pessoas começam a trabalhar com menos de 15 anos de idade, o que lhes permite se aposentar com menos de 50 anos, às custas de uma massa que já não é suficiente ao menos para fazer frente aos benefícios por idade e invalidez.
Quanto aos benefícios serem limitados ao próprio titular, ao companheiro e aos filhos menores, visa apenas pôr fim a distorções onde filhas não se casam para não perderem as aposentadorias e pensões deixadas pelos pais.
Finalmente, a regionalização dos benefícios baseia-se nas enormes diferenças existentes entre as várias regiões do Brasil, que acabam por adulterar o sentido da seguridade pelo fato simples das necessidades não serem iguais.
Quanto ao valor que o aposentado vai receber, inicialmente é fundamental que ele seja desvinculado do valor do salário mínimo, com a criação de um valor regional de referência, calculado sobre as efetivas necessidades de um aposentado.
O sistema seria composto por três níveis de aposentadoria:
Previdência universal, limitada a um valor regional de referência, totalmente custeada e administrada pela União, com dotações através do Orçamento.
Previdência complementar obrigatória, limitada a mais três valores regionais de referência, integralmente paga pelo empregador, com base na folha salarial, e administrada pela União ou por entidade privada.
Previdência complementar facultativa, que seria de responsabilidade total do beneficiário, que poderia contribuir diretamente ou através de acordo com o empregador, sem limite de remuneração, exceto a capacidade contributiva do interessado, e que seria integralmente confiada à iniciativa privada.
Tanto os fundos gerados pela previdência complementar obrigatória quanto os gerados pela facultativa, por serem do beneficiário, poderiam ser transferidos, respeitadas certas regras.

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