São Paulo, domingo, 13 de novembro de 1994
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Clássico de hoje é ungido pela tradição

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Um verão de fogo se prenuncia neste final de primavera. Há muito tempo o futebol brasileiro não vivia um instante tão glorioso como este: tetracampeão do mundo, mesmo exportando duas gerações de craques, atravessa um torneio nacional cheio de gols, revelações e alternâncias de expectativas. Tem o São Paulo, bicampeão mundial interclubes; um timaço de nível internacional como o Palmeiras, e o Corinthians armou-se para disputar o título brasileiro, em todos os conformes, incluindo um ídolo das massas dentro do figurino bem caboclo: negro, simpático, irreverente, competente –Viola.
Não bastasse isso, o trio-de-ferro começou a dar sinais de oxidação, dando espaço para o ressurgimento de Santos, Portuguesa e Guarani, que põe na mesa uma das maiores esperanças dos últimos anos: Amoroso, um artilheiro capaz de trabalhar a bola com a intimidade dos grandes craques.
Muito que bem. E o que vemos hoje, dia de um confronto ungido pela tradição e avalizado pelo presente –Corinthians e Palmeiras–, baixou sobre a cidade um medo-pânico. Só se fala do temor da violência inevitável no encontro das duas torcidas, que se odeiam há mais tempo no futebol paulista.
Aliás, essa síndrome vem acompanhando o Brasileirão há algum tempo e alcançou seu paroxismo no jogo São Paulo e Palmeiras. Naquela partida, Edmundo, autor dos dois gols palestrinos, um deles de placa, ganhou manchetes por ter sido pivô (este termo, perdido nas páginas policiais amarelecidas dos jornais de antigamente, cabe como uma luva) do quebra-pau que estourou nos últimos minutos daquela partida. Foi um jogo cheio de alternativas, bonito, nervoso. Cafu marcou um gol para ser congelado, frame a frame, e ser reprisado nas escolas do Brasil inteiro, até o final do século.
Pois tudo isso foi tragado por uma briga que não durou nem cinco minutos.
Que que é isso, minha gente!, diria o saudoso Geraldo José de Almeida. Vamos devagar. Claro que se deve condenar toda e qualquer violência, exploda ela nas arquibancadas ou dentro das quatro linhas. Tudo bem. Mas, sem paranóia.
Os tumultos nas arquibancadas devem ser evitados através de medidas eficazes por parte das autoridades policiais e judiciárias, somadas ao chamado ao bom senso dos torcedores. Neste item, entram os chefes de torcida, os clubes, que financiam as organizadas etc. Claro que também é preciso reduzir, ao menos, a miséria, a ignorância e todos os demais fatores estruturais que atuam como estopim para essa estúpida violência. Isso, porém, significa mudar o Brasil, algo que é muito mais complexo e lento.
Cenas como a de São Paulo e Palmeiras se repetem de tempos em tempos, em qualquer parte do mundo, desde que a primeira bola começou a rolar. E se circunscrevem a elas mesmas. Agora, por favor, deixem-me ver o jogo que está começando. Em campo, Corinthians e Palmeiras, pô! Quem quer mais?

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