São Paulo, segunda-feira, 28 de novembro de 1994
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A última das corporações

HELIO SCHWARTSMAN

Hélio Schwartsman
SÃO PAULO – A eleição que importa é indireta; o voto, obrigatório. O princípio do "um homem, um voto" é solenemente ignorado. Vê-se até ressurgir a figura da chapa única. O órgão central reúne poderes quase absolutos. As contribuições pecuniárias são compulsórias. Não, nós não estamos falando do Partido Comunista da Mongólia (se é que ele ainda existe), mas da Ordem dos Advogados do Brasil, a OAB.
É desnecessário repassar aqui a importância que a OAB desempenhou e desempenha no aprimoramento das instituições democráticas e na defesa dos direitos humanos, atos pelos quais merece louvor e que a tornam digna de roubar um pouco da atenção do leitor.
Não há como negar, a estrutura da OAB guarda semelhança com as corporações de ofício medievais. Quem não pertence à Ordem não pode exercer a profissão e é a Ordem que escolhe aqueles que a ela podem pertencer. Não faltam nem mesmo normas relativas aos trajes (cabe ao Conselho Seccional "determinar, com exclusividade, critérios para o traje dos advogados").
É evidente que associações profissionais têm a legítima tendência de procurar fazer valer os interesses de seus membros. Os problemas, porém, começam quando essas associações profissionais se tornam maiores do que meras associações profissionais e passam a interferir diretamente em decisões do Estado e da vida de todos os cidadãos. É bem este o caso da OAB. Talvez até por seus méritos, a Ordem conquistou um poder que outras categorias jamais conheceram: indica juízes e conseguiu transformar seu estatuto em lei federal.
Infelizmente, não foi capaz de superar seu corporativismo. Ao tornar obrigatório o acompanhamento de qualquer disputa judicial por um advogado, ameaça um dos maiores avanços do Judiciário dos últimos anos, os tribunais de pequenas causas. É como se os médicos conseguissem impor lei exigindo receita para a compra de aspirinas.
Eu, na qualidade de cidadão brasileiro, reitero meu direito inalienável de NÃO recorrer a um advogado. Como já dizia Platão a respeito dos advogados da época, qualquer um tem o direito de não confiar em gente cuja preocupação primordial não seja o estabelecimento da verdade e que adota ora uma ora outra opinião mediante paga.

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