São Paulo, quarta-feira, de dezembro de
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Coincidências elementares

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Estudioso do assunto, Luís Edgar de Andrade garante que não há coincidências. Já leu as obras fundamentais sobre o assunto, pesquisou em cinco continentes. Segundo Otto Lara Resende, numa de suas últimas crônicas, o Luís Edgar "andava lendo agora os alemães". Chegara ao topo.
Não tive tempo de consultá-lo quando tomei conhecimento das despesas eleitorais dos candidatos à Presidência da República. Fernando Henrique gastou 31,7 milhões, Quércia 9,6 milhões, Lula 4,2 milhões, Brizola 3,13 milhões, Amin 309 mil e Enéas 137,7 mil.
Meu passado escolar não recomenda uma soma de tão suculentos números. Apelei para essas maquininhas que são capazes de extrair raízes quadradas e encarar logaritmos –façanhas que para mim equivalem à quadratura do círculo ou à compreensão do legado cultural do Cazuza. Somando-se todos os reais gastos pelos candidatos derrotados, temos 16.467 milhões. Praticamente, a metade do que gastou o candidato eleito.
Não me atreverei a calcular os percentuais, mas desconfio que FHC obteve a pole-position por maioria absoluta, tal como ocorreu com os votos propriamente ditos. Foi uma coincidência –apesar do Luís Edgar ficar insultado com a minha mania de ver coincidências onde há simples fatores de causa e efeito.
Lembro uma tira do Carlos Estêvão, cartunista do velho "O Cruzeiro". Ele fazia um Sherlock Holmes que, como no modelo de Doyle, decifrava mistérios através de deduções elementares. Ao contrário do modelo original, o Sherlock do Carlos Estêvão dizia a toda hora o "elementar, meu caro Watson".
Numa de suas tiras, Sherlock vai procurar um Lorde e está metido numa enrrascada, salta numa rua e bate num portão vitoriano. Atônito, o Dr. Watson pergunta ao detetive que tipo de elucubração mental o havia levado, de estalo, a descobrir o endereço do Lorde.
Sherlock tira do bolso daquele casaco de xadrezinhos um cartão de visitas e explica: "É que o endereço coincide es-pan-to-sa-men-te com o do cartão de visitas que ele me deu na semana passada".
Eu devia concluir alguma coisa a respeito das coincidências do Sherlock e dos gastos na campanha eleitoral. Mas vou esperar o Luís Edgar acabar de ler os alemães para tomar posição.

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