São Paulo, domingo, 4 de dezembro de 1994
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Dioxina é tóxica para governo dos EUA

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A toxicidade da dioxina para a espécie humana voltou a constituir assunto relevante na última reunião anual da Sociedade de Toxicologia em Nova Orleans (Louisiana, EUA).
Naquela oportunidade representantes da EPA, órgão que cuida da proteção ambiental no país, divulgaram os resultados da reavaliação a que submeteram essa questão.
Aquela agência federal praticamente confirmou sua antiga conclusão de ser a dioxina muito tóxica para nossa espécie.
Dioxina é um contaminante do chamado "agente laranja", desfolhante largamente usado pelos Estados Unidos na guerra do Vietnã. A divulgação de seus efeitos nocivos à saúde pública despertou grandes reivindicações entre os combatentes expostos ao desfolhante que depois vieram a adoecer e exigiram indenizações pelos males alegadamente decorrentes da exposição.
A dioxina, na verdade, não é um composto único, mas representa uma superfamília de compostos químicos sintéticos, o mais importante dos quais é o TCDD ou dioxina clorada. Resídios de dioxina encontram-se em quantidades mínimas no ar, no solo e na água.
O TCDD é muito tóxico para animais de laboratório, sendo a cobaia a espécie mais sensível e o hamster a mais resistente. A toxicidade varia muito de uma espécie para outra. Na espécie humana descreveram-se sintomas essencialmente agudos, como o cloracne, perturbações digestivas, defeitos em algumas enzimas fundamentais, dores musculares e articulares, efeitos no sistema nervoso e psiquiátricos.
Mas essas manifestações, exceto alguns casos de cloracne, costumam ser transitórios. Notam-se situações crônicas em roedores e primatas não humanos, como fenda palatina e anomalias renais em prole de camundongos. Segundo F.H. Tschirley, é carcinogênica em ratos e camundongos.
Durante muitos anos a EPA sustentou que a dioxina é tão perigosa que em hipótese alguma seres humanos deveriam ser expostos a ela. Uma única molécula do produto poderia ser nociva.
Em 1976, Alan P. Poland descobriu o receptor celular ao qual se prende a dioxina, e com isso surgiram dúvidas quanto ao quadro tóxico, dada a possibilidade de ser necessário certo número de moléculas dioxínicas para ativar o receptor e, também, certo número de receptores para causar efeito deletério.
Essas dúvidas levaram a EPA a empreender ampla revisão dos riscos da dioxina para o organismo humano.
Na reunião anual, Linda Birnbaum, especialista no assunto, adiantou alguns resultados dessa reavaliação, que sustentam a posição inicial da EPA. Os novos dados foram confirmados por Ulf Ahlborg, toxicologista do Instituto Karolinska, na Suécia. Para ele os dados apresentados agora não apóiam a idéia da existência de um limiar geral para os efeitos da dioxina.
Acreditam os especialistas que os receptores da dioxina (receptores Ah) podem variar de função conforme o tecido em que se acham. Em animais, pelo menos, o composto pode concentrar-se em determinados órgãos como tireóide, adrenais, pele, fígado e gordura em geral.
Birnbaum fala de efeitos cumulativos semelhantes aos da dioxina, causados por substâncias, também tóxicas, que se prendem aos mesmos receptores. Por isso o EPA estaria atribuindo àqueles compostos de ação semelhante à da dioxina o que chama de fatores de equivalência tóxica (TEFs), que podem aumentar de muito o risco da dioxina.
Para exemplificar, basta lembrar que a população dos Estados Unidos tem em média sete partes por trilhão (ppt) de dioxina na circulação sanguínea. Somando-se a essa quantidade as doses relativas aos TEFs, inclusive os compostos dibenzofurânicos e outros que agem sobre os receptores, pode-se obter a cifra de 50 ppt, índice preocupante, conforme disse aquela especialista a Richard Stone em Science (260, 31).

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