São Paulo, sábado, 10 de dezembro de 1994
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O indexador e o indexando

EDWARD J. AMADEO

Uma economia estável e desindexada tem inflação anual inferior a 10%. Qualquer coisa acima disso requer esquemas de indexação.
Sem indexação, a contratação torna-se difícil, o preço contratado embute um seguro contra a variabilidade da inflação e o prazo dos contratos tende a encurtar. Isto é verdade nos mercados que exigem contratos como o mercado financeiro e o mercado de trabalho.
Com uma inflação projetada entre 1,5% e 3,5% ao mês nos próximos 12 meses, a diferença entre as inflações anuais é de 31 pontos percentuais (51% - 20%). Será mesmo razoável eliminar os indexadores –desativar a política salarial e a TR– nessas circunstâncias?
Não. A taxa de inflação é muito alta e instável e a tentativa de promover a desindexação legal agora seria inóqua face aos incentivos para a indexação espontânea.
A política salarial corrente seria absolutamente inofensiva se a inflação de julho e agosto tivesse sido baixa. Não querem se convencer os desindexadores que o problema não está no indexador, mas no indexando. Dito isto, reconheçamos que estas são águas passadas.
O Plano Real está em curso e é preciso lidar com o tema da desindexação. Aliás o problema não é tanto a desindexação, mas a redução da inflação que torne a indexação desnecessária ou a desinercialização que faça as pessoas olharem para frente e não para trás.
Há duas alternativas. A primeira é disciplinar os formadores de preços e salários através de mecanismos de mercado. Aumentar as importações, transformando o excesso de demanda em excesso de oferta, ensejando assim o crescimento da produtividade, a redução de margens de lucro e talvez a subindexação dos salários.
Mas como nem tudo é importável, é preciso reduzir a demanda dos não-importáveis porque a inflação nestes setores torna-se inflação dos custos para o setor industrial –via a cadeia IPC-r/salários–, que está com preços limitados pelo câmbio.
Essa alternativa significa apostar na curva do Phillips ("para reduzir a inflação é preciso reduzir a demanda") e na lei de um só preço ("com câmbio fixo, a inflação tende para a inflação em dólares").
Para funcionar, precisa ser rápido porque enquanto a relação IPC-r/câmbio ou IPC-r/IPA continuar crescendo no ritmo atual, os efeitos sobre a atividade e o emprego industrial a partir do segundo trimestre de 1995 podem ser de grandes a desastrosos. Se funcionar, teremos desindexação a partir de 1996.
Se não for rápido o suficiente, e o mix de inflação e desemprego na indústria for considerado inadequado, a outra alternativa é imaginar formas de alterar a formação de expectativas. Induzindo os agentes a se pautarem pela inflação futura e não a inflação passada, coordenando e negociando a formação de salários e preços.
Essa alternativa exige alta dose de engenharia institucional, liderança política e comprometimento das lideranças sindicais e empresariais.
Quem sabe se, sob a ameaça de amargarmos mais uma derrota nessa briga com a inflação, os limites naturais da ação coletiva e a teimosia dos mercadistas venham a ser mitigados.

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