São Paulo, terça-feira, 13 de dezembro de 1994
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Cem anos do cinema começam a dar frutos

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

Os festejos do centenário do cinema, ano que vem, prometem uma avalanche maior de livros do que de filmes especialmente confeccionados para a ocasião. Até por serem os pais da criança, os franceses largaram na frente, com ensaios majoritariamente históricos e nostálgicos. Um deles, "Magnum Cinema", é tão ambicioso que será lançado ao mesmo tempo em vários países do mundo, entre nós pela editora Nova Fronteira. Italianos e alemães mostraram na última Feira de Frankfurt que não estão dispostos a ficar atrás dos franceses.
E nós? Bem, nós tentaremos não fazer muito feio. Alguns títulos já estão chegando às livrarias, de olho no consumo natalino. A editora Companhia das Letras providenciou uma autêntica celebração de Fellini –mais sintonizada com um ano de morte do cineasta do que com os cem anos de nascimento do cinema– e uma seleta das quase 3.000 notas sobre filmes que a crítica Pauline Kael redigiu para a revista "New Yorker" de 1967 até a década passada.
A primeira ("Fellini Visionário") talvez não interesse a todos os potenciais compradores de "Mil e Uma Noites no Cinema", a antologia de Ms. Kael, e vice-versa, mas é um esplêndido tributo ao que o cineasta italiano fez de mais ambicioso e pessoal.
Tendo como eixo os roteiros dos filmes "A Doce Vida", "Oito e Meio" e "Amarcord", integralmente transcritos, Carlos Augusto Calil, organizador do volume, selecionou algumas entrevistas marcantes de Fellini, 50 desenhos do cineasta e cinco textos que, a seu ver, representam o que de melhor se escreveu no Brasil sobre aqueles filmes. A escolha não admite maiores reparos. Também desconheço reflexões nativas mais agudas sobre "Oito e Meio" que as de Roberto Schwarz e Gilda de Mello e Souza. "Memórias Impessoais", o único trabalho inédito do livro além da introdução de Calil, traz a assinatura de Luiz Renato Martins e examina, com acuidade, erudição e elegância, as relações de "Amarcord" com o fascismo italiano.
"Fellini Visionário" foi, em princípio, o que restou de um projeto da Companhia das Letras de editar roteiros de filmes importantes, provisoriamente suspenso. Nenhum editor sabe se os brasileiros se interessam por esse tipo de literatura cinematográfica. Não pareciam muito interessados 24 anos atrás, quando a Civilização Brasileira arriscou-se no gênero, também com obras de Fellini (leia texto ao lado).
Mas não custa tentar. Assim pensa Arthur Nestrovski, que à frente da editora Imago coordena uma coleção de grandes textos, na qual o cinema terá sua vez com a tradução de "O Homem Que Amava as Mulheres", de François Truffaut, que antes de virar roteiro de cinema era um romance, escrito pelo próprio cineasta. Com um recente lançamento cinematográfico nas livrarias –"Os Filmes Que Eu Vi Com Freud", de Waldemar Zusman–, a Imago promete um terceiro para engrossar os festejos do centenário: "O Cinema no Século", com os textos a serem apresentados durante o homônimo seminário que o Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo promoverá daqui a alguns meses.
Outros, ainda em estudo, virão. Pelo espírito predominante em nossas editoras, é de se esperar que livros vistosos, ligeiros e nostálgicos afinal prevaleçam sobre os demais. Embora editado pelo "Cahiers du Cinema", "Magnum Cinema" joga nesse time. É um álbum com fotos de gente de cinema, diante e longe das câmeras, todas tiradas por sumidades da agência Magnum, como Henri Cartier Bresson (que a fundou em 1947), Robert Capa, Phillipe Halsman, Raymond Depardon, Frank Friggs, Nikolas Tikhomiroff (freguês de quase todas as filmagens de Orson Welles), Bruce Davison e outros.
A idéia do livro surgiu quando o ex-redator-chefe-adjunto do "Cahiers du Cinema", Alain Bergala, teve acesso ao formidável acervo da Magnum. "Isso dá, no mínimo, uma exposição", pensou. O livro foi consequência. Para montar uma e editar o outro, Bergala e uma pequena equipe examinaram 6.000 negativos durante seis meses. Resultado: um álbum realmente magno, com estrelas de várias grandezas, nas mais variadas situações. Até o nosso Glauber Rocha encontrou uma brecha. A Magnum o pegou filmando "Terra em Transe".

Livro: Fellini Visionário (319 páginas)
Organizador: Carlos Augusto Calil
Quanto: R$ 35,50

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