São Paulo, terça-feira, 13 de dezembro de 1994
Próximo Texto | Índice

Frustração

A absolvição do ex-presidente Fernando Collor de Mello e de seu ex-caixa de campanha, Paulo César Farias, frustra a nação. Raros são os que duvidam de que o ex-mandatário e seu sequaz tenham criado uma ampla rede de corrupção e dela se beneficiado. Os indícios dessa trama são muitos, e eloquentes.
Seria injusto, porém, descarregar a indignação de milhões de brasileiros sobre o Supremo Tribunal Federal, o órgão responsável pelo veredicto. Ao contrário até, o Supremo soube agir com isenção e tecnicidade dignas de um verdadeiro Estado de Direito. Note-se que a decisão do STF diz apenas que as provas apresentadas são insuficientes para condenar os acusados, não que os fatos criminosos não tenham jamais ocorrido.
É claro que seria muito mais fácil, cômodo e até vantajoso para a imagem do Judiciário declarar Collor, PC e todos os co-réus culpados, independentemente dos autos. Essa seria, porém, uma atitude pouco jurídica e de grande truculência, típica da que caracterizou o governo do réu principal.
Em que pese a falta de unanimidade da decisão, parece consensual que a peça acusatória era fraca. Não se trata, é óbvio, de transformar o procurador-geral da República, Aristides Junqueira, de acusador em acusado, mas é sobre as razões da tibieza da denúncia que a sociedade deve agora refletir.
E aí contabiliza-se uma sucessão de equívocos, protagonizados por diversas autoridades dos Três Poderes. Provas foram colhidas ilegalmente e tiveram de ser desprezadas em juízo. A necessária CPI das empreiteiras –de cujas apurações poderiam surgir as evidências necessárias para a condenação– jamais seguiu adiante. As investigações policiais e judiciais foram subitamente desaceleradas depois do impeachment de Collor. O resultado dificilmente seria outro.
Assim, como que num paradoxo, o veredicto do STF, ao mesmo tempo em que ensina que o Brasil vive hoje um pleno Estado de Direito –em que a corte máxima do país recusa o expediente tão fácil quanto perigoso de julgar segundo o clamor popular–, deixa a nação indignada diante da absolvição de um presidente que maculou o cargo além de todos os limites.

Próximo Texto: O Brasil nas Américas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.