São Paulo, terça-feira, 13 de dezembro de 1994
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Equívocos tributários

JOSÉ SERRA

A discussão sobre a reforma tributária, seus méritos e seus efeitos, tem provocado um rosário de equívocos. O primeiro é a confusão entre reforma e aumento de carga tributária (receita de tributos como fração do PIB).
Ambos os eventos ficaram tão associados no debate que há sempre uma reação de espanto quando se alerta que nenhuma das propostas de reforma da Constituição nos capítulos que tratam dos tributos e contribuições sociais, apresentadas à revisão constitucional, produziria por si aumento de receita.
É razoável o espanto? Não. A reforma deve ser feita para obter certo modelo tributário, que envolve a equidade social, os efeitos da tributação sobre a eficiência da economia e sua competitividade externa, bem como a repartição de atribuições e de receitas entre União, Estados e municípios. Já a carga tributária depende fundamentalmente do nível das alíquotas, da diversidade dos impostos e da eficiência da arrecadação.
Outra confusão refere-se ao problema do tamanho da carga tributária no Brasil. Há analistas que a consideram absurdamente alta, outros que a qualificam de razoável e outros ainda que a julgam excessivamente baixa. Quem tem razão?
É interessante notar que em 1993 a referida carga chegou a 28% do PIB, a mais alta de que se tem notícia (exceto em 1990 quando, em razão do Plano Collor 1, houve a cobrança de impostos extraordinários). Esse número desqualifica a idéia de que a carga tributária seja muito baixa no Brasil, mas tampouco confirma a idéia de uma carga excessiva.
No entanto, aqueles que consideram o sistema tributário brasileiro sufocante também têm sua dose de razão, pois a carga tributária nominal, isto é, aquela que existiria caso todos os tributos fossem pagos, sem sonegação, isenções ou incentivos, é altíssima, devendo girar em torno a 50% do PIB.
Uma diferença tão grande entre a carga nominal e a efetiva acaba sendo preenchida por uma acumulação de irracionalidades, entre as quais a mais grave é a sobrecarga excessiva para os que não sonegam. Premia-se o faltoso e pune-se o cumpridor de suas obrigações fiscais. Aliás, a partir daí, detecta-se um objetivo importante para a reforma tributária: reduzir a carga tributária nominal, aproximando-a da efetiva, mediante uma racionalização do sistema.
Uma terceira fonte de confusões tem a ver com a forma legal de promover-se a reforma. Há uma crença generalizada de que o único caminho é a mudança constitucional, mas isto só é verdadeiro parcialmente. É fato que, em face do detalhismo do texto constitucional, é indispensável revisar vários dispositivos da Carta Magna relativos à tributação. Mas de modo algum deve ser menosprezado o instrumento das leis complementares e ordinárias.
Basta lembrar que o texto constitucional prevê determinados impostos, mas não obriga a sua cobrança. São as leis que decidem o que, como e quanto cobrar. E, em certos casos, essas decisões podem ser adotadas até mesmo por resoluções do Senado Federal aprovadas por maioria simples.

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