São Paulo, terça-feira, 27 de dezembro de 1994
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Futuro ministro diz que 2º grau é 'arcaico'

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

O futuro ministro da Educação, Paulo Renato Souza, acha que pode fazer "uma revolução" no sistema educacional brasileiro em quatro anos.
Entre suas prioridades: avaliação nacional das escolas e estudantes de 1º grau, um "novo sentido" para o ensino técnico de 2º grau, maior autonomia das universidades em relação ao Estado e abertura de uma "janela profissionalizante" para a pós-graduação.
Ex-secretário da Educação de São Paulo, ex-reitor da Unicamp, Souza, 49, deu à Folha, na véspera do Natal, sua primeira entrevista depois de nomeado ministro.
A seguir, os principais trechos:

Folha – Os jornais deram como certo desde a eleição que o sr. iria para o Ministério do Planejamento. Estavam todos errados? O que aconteceu?
Paulo Renato de Souza – Eu fui para o Brasil como coordenador do programa de governo da campanha e, depois, do processo de transição. Talvez por isso se tenha achado que eu iria para o Planejamento. Mas isso foi uma dedução da imprensa. Nunca recebi convite para ocupar aquele cargo.
Folha – Existe entre os brasileiros uma sensação generalizada de que o grande problema do país é a educação e há uma tendência de se esperar muito do governo nessa área. Mas o seu ministério é quase que apenas um coordenador das universidades federais e não age sobre o 1º e 2º graus. O que pode fazer um ministro da Educação?
Souza – A expectativa da população é correta e embora o Ministério da Educação não execute as políticas de educação de 1º e 2º graus, ele pode fazer muito para melhorá-las. Temos condição de em quatro anos fazer uma revolução no ensino brasileiro.
Folha – Como?
Souza – No 1º grau, podemos definir padrões nacionais de qualidade, currículos mínimos para todo o país e fazer avaliações nacionais dos estudantes, das escolas e dos sistemas estaduais.
Também é possível treinar professores, usando televisão e tecnologias modernas. Mas o principal é estabelecer um diálogo com a sociedade sobre a importância da qualidade da educação, dar a ela instrumentos para que ela possa cobrar dos sistemas.
Folha – E no 2º grau?
Souza – O 2º grau no Brasil é arcaico, concebido para o início do século 20, não para o 21. Ninguém liga muito para isso porque quem chega hoje ao 2º grau são os filhos da classe média, que tem outras fontes de informação: televisão, computadores, viagens.
Folha – O ex-ministro Jarbas Passarinho deu muita ênfase na sua gestão à profissionalização do 2º grau. O que aconteceu com aquilo?
Souza – Aquilo fracassou. O 2º grau tem que dar várias saídas para o aluno: para a universidade ou para o mercado. O ensino técnico tem que ter um novo sentido e nós podemos aprender muito com as experiências da América Latina e da Europa.
Folha – Quais os seus planos para a universidade?
Souza – Hoje em dia, há um diálogo de surdos entre universidade e sociedade. A sociedade reclama que a universidade é perdulária, ineficiente. A universidade diz que não pode se deixar sucatear. Falta estabelecer um diálogo que não implique em rendição de nenhuma das partes.
Mas a universidade tem que entender que sua trajetória atual é inviável, que ela não pode continuar fazendo o que quer sem prestar contas, gastando 95% de suas verbas em pessoal.
O que vamos fazer é fixar objetivos para as universidades e elas vão ter autonomia crescente do Estado. Vão poder buscar fontes alternativas de receita em vez de depender apenas do governo.
Folha – Muitas das acusações feitas contra a universidade também são dirigidas contra o Ministério da Educação. Como o sr. vai lidar com isso?
Souza – A administração do Ministério vai ser modernizada. Ele tem que ser mais coordenador do que executivo, fazer menos e pensar mais.
Folha – O Conselho Federal da Educação foi extinto pelo atual governo. Como vai ser o seu sucessor?
Souza – Já foi enviada ao Congresso uma medida provisória sobre o assunto. A extinção do Conselho foi uma medida correta. A nova estrutura para substituí-lo tem que ser muito diferente daquela. Temos que abandonar a idéia do credenciamento e passar para a da avaliação.

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