São Paulo, sexta-feira, 11 de fevereiro de 1994
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Construção depende da revisão

JOSÉ EDUARDO NASCIMENTO

Mais do que qualquer outro setor da economia, a construção de obras públicas depende de uma revisão constitucional que, ao lado de reformas políticas também importantes, enfrente decisivamente a questão central da reforma do Estado.
É que nosso segmento empesarial, como um dos principais fornecedores do poder público, é refém do Estado virtualmente falido que temos hoje e precisa, com a máxima urgência, de um outro Estado –menor e saneado, que se volte para seus verdadeiros objetivos e seja capaz de aplicar seus recursos com transparência e critérios de eficiência, bem como de honrar os compromissos assumidos.
Enquanto esse desafio maior continuar sendo procrastinado –sob o efeito das pressões corporativistas, ou de uma ideologização ultrapassada, mas agressiva– o setor seguirá pagando um alto preço pelo progressivo estreitamento do mercado de trabalho; pela perversão inflacionária e deterioração dos seus contratos de serviços nos planos econômico-financeiro, técnico e ético; pelo desestímulo ao desenvolvimento tecnológico; e pela insegurança em relação ao futuro, mesmo o mais próximo. E, numa generalização injusta e abusiva, todo o setor permanecerá sendo visto como bode expiatório da crise moral que sacode o país.
Com essa compreensão básica da crise brasileira, a revisão constitucional é o objetivo mais relevante a ser buscado hoje pelas forças políticas e sociais responsáveis. E tudo tem procurado fazer no sentido de contribuir para a viabilização e o sucesso dela.
Também a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) passou a voltar-se para o tema, em sua direção central e através de comissões de obras públicas e construção pesada, da indústria imobiliária, de economia e de relações internacionais.
Em nível das duas primeiras, foram decididas várias iniciativas em favor da revisão, dentre as quais destaco o engajamento do setor às teses estruturais defendidas pela CNI (Confederação Nacional da Indústria).
O conjunto das empresas dessas áreas –não apenas as médias e pequenas, mas também as de maior porte– vai-se dando conta da dimensão estrutural da crise dos investimentos públicos na construção e de que todas perdem com ela, sendo ilusório, além de inviável, face aos novos controles políticos e sociais, buscar saídas por meio da formação de cartéis de obras grandes ou pequenas, ou de maior elitização e concentração dos contratos. Nem se resolvem os problemas básicos com a moralização de licitações necessária, mas insuficiente.
A solução real da crise das obras públicas terá de ser parte de reformas bem mais amplas, que restrinjam e racionalizem a aplicação dos limitados recursos governamentais e propiciem a retomada de expansão de nossa infra-estrutura com o concurso de capitais privados nos processos de concessão e privatização. A partir de novo modelo de financiamento é que a construção civil voltará a ter papel importante no PIB e na geração de empregos e que poderá cumprir esse papel livre de condicionamentos cartoriais que a vinculam a políticos e governantes corruptos.
Enfim, agora, após todo tipo de bloqueios e de manobras para impedi-la ou protelá-la, a revisão está começando. Enfim, também, podemos renovar nossa esperança de que sairemos do desvio para encontrar o caminho de um Estado reformado e moderno, de uma economia aberta e competitiva e de um novo ciclo de desenvolvimento sustentado, que nos propicie crescimento, melhor distribuição de renda e uma democracia consolidada.

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